Capítulo 16 - A maldição

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olá lindes,

na mídia a música An Astreilhad do grupo Beltaine.

deleitem-se.

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Capítulo 16 – A maldição

A abadia em ruínas jazia pacificamente ao luar, como acontecera no correr dos séculos. O lobo negro e solitário manquejou até o limite de uma elevação próxima e ficou olhando para cima, entre as árvores. Sangue ressequido misturava-se à sua pelagem espessa, cor de ébano, em um ombro e na pata traseira. O vento cortante assobiou a sua volta, quando se agachou cansado, a fim de iniciar uma vigília, cujo motivo nem ele mesmo entendia. Erguendo a cabeça, o lobo uivou sua angústia para a lua esmaecida.

A salvo dentro dos muros do mosteiro, Filipe acomodara-se em um degrau do terraço desmoronado, ao lado da fogueira, espiando Damastor, que bebia uma enorme caneca de vinho, segurando-a com as mãos trêmulas. O velho monge elevou os olhos apreensivamente para a escuridão, ao ouvir o lobo uivar. Filipe o estudou por entre as chamas que dançavam, de repente com absoluta certeza de que o homem não tinha nenhum medo de lobos.

– É ele, não é? – perguntou suavemente. – Elazar. – O monge não respondeu. – O lobo – repetiu. – De certo modo... é ele. – Sabendo disso, o som do uivo não mais o amedrontava.

Damastor Menjou encheu uma segunda caneca, sem se preocupar em olhar para ele. — Vamos, embriague-se. Você esquecerá. .

Filipe balançou a cabeça, recostando-se no degrau de pedra atrás dele. — Uma hora atrás, o senhor estava bêbado. – Ele recordou.

Damastor olhou para ele. Filipe sustentou o olhar, insistentemente. Havia contado ao monge sua parte pessoal naquela estranha dança do destino, mais ou menos na íntegra. Até o fato de Elazar o chamar indiretamente de companheiro. Portanto, ao trazer-lhe o falcão, conquistara o direito de saber sobre o segredo maior. Esperou, sem desviar os olhos.

Damastor curvou-se pesadamente onde estava, derrotado. Pegando sua caneca de bebida, ele caminhou para junto do fogo e sentou-se, com um suspiro resignado. Filipe descansou os pés em cima do muro e ficou esperando.

Menjou olhou para a janela iluminada, no alto da abadia. — O nome dele é Isaac Salieri – disse finalmente. — Seu pai, o Duque Salieri, era o líder do clã que governava a cidade de Colina. Isaac era o prometido do filho do Alfa Bellini. Com a união dos dois a aliança entre as duas famílias seria definitiva. – O monge silenciou de novo por um instante, contemplando o passado. Um sorriso melancólico repuxou-lhe os cantos da boca. – Nunca esquecerei o dia em que o vi... era como se estivesse olhando para... para...

Filipe fechou os olhos, recordando. – Para o... rosto do amor. – Ele sorriu também.

Damastor o fitou e seu próprio sorriso ficou mais largo, compreensivo. – Você também, ladrãozinho? Bem, suponho que todos ficamos apaixonados por Isaac, de formas diferentes. Sua... – a garganta do monge pareceu contrair-se – Excelência Reverendíssima não conseguia pensar em outra coisa.

Filipe arregalou os olhos. – O... Bispo... se apaixonou por ele? — perguntou, incrédulo.

Damastor assentiu, as mãos apertando a asa da caneca com dolorosa pressão. Seus olhos turvos ficaram subitamente amargos. – Tanto quanto um homem maligno poderia sentir a emoção do amor. Ficou louco de paixão. Possesso...

Filipe refletiu no que sabia do Bispo... Um homem de Deus que jamais conhecera o sentido da verdadeira santidade, que chafurdava na luxúria e no pecado, enquanto esmagava sob seu sapato o povo a que, perante o Senhor Deus Único, jurara servir. Ele os sufocava de impostos até quase morrerem de fome e depois os enforcava por roubarem comida. Era um homem sem qualquer vestígio de alma. No entanto reconhecera a beleza do espírito de Isaac e ficara obcecado... sabendo que Isaac era tudo que ele nunca seria.

A Madição da Colina (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora