Aquela que muito amou

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Ela caminhava ofegante por causa do calor que fazia naquele dia. O sol ardia em seu rosto mesmo levando o cântaro sob a cabeça, ele não o protegia muito. O horário que ela vinha todos os dias era o pior, mas sabia que era melhor enfrentar o calor escaldante do que ir na companhia das mulheres que iam buscar água no poço na hora mais fresca do dia, aliás, não era como se ela pudesse escolher, as mulheres praticamente a expulsaram quando ficaram sabendo o que ela fazia, não queriam ser vistas com ela ou ao menos serem acossiadas a ela.

Antes ela ainda podia contar com a companhia de sua irmã, mas Adara também não tinha uma boa reputação, ela havia se afastado da família e da região onde cresceu, foi para região oposta  a cidade que viviam em Samaria e vivia escondida, com um nome diferente, tentando recomeçar a vida onde as pessoas não a conhecessem. Mesmo assim, Adara também buscava água ao meio dia, pois não queria encontrar com outras mulheres e permitir que alguma descobrisse seu passado.

Lumina refletia sobre como devia ser horrível viver fugindo dessa forma, às vezes pensava se um dia precisaria viver assim também, afinal, toda sua família vivia uma mentira. Sua mãe era samaritana e cria no Deus de Israel, porém, seu pai vinha de uma família de costumes pagãos, era um trapaceiro nato e havia contaminado toda a família. Lumina era a mais nova e todos a consideravam uma bela moça, meiga e que facilmente atraia a atenção de muitos, então seu pai viu nela sua mina de ouro.

Ele transformou a sala de sua casa em um pequeno templo pagão e a treinou para se passar por sacerdotisa e realizar adivinhações, por um bom preço, é claro. Ela não gostava nem um pouco daquilo, era enganar seu povo e pior, descumprir um dos mandamentos do Deus de sua mãe sobre idolatria, porém, ela não podia ir contra seu pai. Lumina era órfã, seu irmão do meio havia achado-a abandonada no cercado onde ficava os animais da família, o mais provável era que seus pais não tivessem condições de criar a filha, talvez até tenham morrido de fome. Sua família de criação sempre cuidou bem dela, amava seus irmãos, mas seu pai sempre deixou claro que criá-la sempre foi um negócio, tinha que dar lucros ou ele a abandonaria.

Apesar da má fama de todos, ela se recusava a acreditar que um dia também precisaria viver se escondendo da vergonha, sonhava em um dia casar com um moço forte, justo e que a amasse, para que ela também pudesse viver uma vida digna e feliz, não precisasse se envergonhar mais. Ela já estava na idade para se casar, aliás, já estava até atrasada, as meninas se casavam já nos seus doze ou quatorze anos, ela já havia completado dezessete, mas seu pai não tinha pressa em lhe casar como a maioria, ele adiaria o máximo que pudesse pois sabia que perderia seu tesouro se ela fosse embora. “Você tem aparência de menina jovem ainda, não precisa se preocupar, posso lhe dar em casamento com a idade que quiser que ninguém irá suspeitar que é mais velha”, ele costumava dizer.

Ao voltar para casa, colocou a água na mesa e estranhou que tudo já tinha sido feito, geralmente quem fazia a maior parte do serviço de casa era ela. Seu pai saiu de dentro do quarto e apareceu com uma expressão que ela conhecia bem, era a mesma de quando ele estava tramando alguma coisa.

— Menina, hoje sua mãe já adiantou suas tarefas, não vai precisar se preocupar com elas hoje. Temos um cliente importante, ele marcou um horário com você hoje, ele disse que pagaria o necessário para ficar na sua presença o tempo que precisasse. Então se lave, vista o seu melhor vestido, se arrume com os melhores perfumes e adornos, quero você igual a uma rainha para recebe-lo, me ouviu bem? Não me decepcione.

Ela assentiu em silêncio e foi se aprontar. Nunca podia contestar mesmo, então havia aprendido a só obedecer e nunca dizer uma palavra, afinal, devia isso a eles, por mais que não concordasse com a vida que levavam, devia toda obediência e gratidão àquela família.

Ela terminava de pentear o cabelo quando ouviu o tal cliente importante entrar. Desceu prontamente e ficou surpresa, o homem realmente era um cliente diferente, parecia influente, se vestia com tecidos finos, tinha um lenço azul na cabeça e cabelo castanho cumprido, também usava de várias joias douradas. Ela não era a única que observava daquela maneira, o homem também estava encantado com tamanha beleza, sua pele era macia apesar do trabalho pesado e do sol, seu pai cuidava para que ela sempre conservasse sua boa aparência, sabia como isso era importante para os negócios. Cabelos ondulados e avermelhados e olhos marcantes, num tom amendoados.

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⏰ Última atualização: Sep 03 ⏰

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