Selene e Hélio

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Os passos apressados sobre a grama eram velozes e implacáveis. Seja um tronco de árvore ou uma grande pedra, os pés achavam impulso para pula-los, sem diminuir sua velocidade

Estes pés descalços sujos de terra possuíam a mesma cor que a mesma. A pele do alfa era marrom como a terra seca, um tom bonito para qualquer ômega que o pousasse os olhos

De olhos castanhos, às vezes esverdeados como folhas secas, com a pele cheia de pintinhas - símbolos de realeza presenteados pelos deuses, algo que exigia que fosse o líder da alcatéia que pertencesse, mesmo se não fosse herdeiro direto;

Era uma ordem dos deuses

O peito com marcas da tinta natural feita pela xamã de sua alcatéia para seu ritual de passagem à dez anos - patas de urso, símbolo de proteção

Seu cabelo tremulava com o vento de sua corrida, bagunçado como as folhas da copa de uma árvore, cortados desregularmente por terem sido aparados com uma concha quebrada. A pena de águia entre seus fios de cabelo, presa em uma das tranças que sempre surgiam em algumas mechas - feitas por um certo alguém especial

Desceu a colina correndo, olhando uma última vez por cima do ombro - sabendo que passara do limite do território de sua alcatéia, então estaria sozinho

Assim que chegou ao fim da colina, as árvores acabaram assim como a trilha, dando espaço para uma campina cheia de flores que se desabrocharam após o inverno, dando início à primavera — a estação do recomeço, da esperança

Parou com a mão no tronco da última árvore antes do início da vasta clareira florida, observando seu interior com a respiração ofegante de sua corrida — que fora um tanto mais apressada que o costume, pois a saudade em seu peito batucava como os betas de sua alcatéia em dia de rito;

Mesmo com sua pressa, acabou se atrasando pois perdera a noção de tempo enquanto brincava com os filhotes da alcatéia — eles queriam brincar de luta, e, como um bom alfa, ele ficou brincando com os filhotes, os deixando ganhar na briga

Mesmo assim, correu o máximo que pôde para chegar ali, naquela campina recheada de flores diversas

A clareira era o limite do território de duas alcatéias vizinhas e rivais, portanto, ninguém ia ali, mesmo que fosse um lugar belíssimo

A grama não era tão alta, batia na metade das canelas do alfa em alguns pontos — em seus tornozelos em outros. Tinha muitas flores aproveitando o sol da campina. Flores brancas e rosa predominavam, mesmo que houvessem de outras cores também, de todos os tipos e quantidades de pétalas

As árvores ao redor eram daquelas que se enchiam de flores e perdiam as folhas, então a paisagem colorida era magnífica, além de muito cheirosa. Com flores amarelas cobrindo copas, bem como roxo, branco, rosa e vermelho

O vento que vinha da floresta levava a grama a se inclinar junto as flores, passando calmaria a quem observasse — bem como as borboletas e abelhas que vagavam sobre as flores

Era uma visão magnífica. O alfa não costumava vê-la nas outras estações, mas tinha certeza que era bela com o branco da neve, com os tons do outono ou com o verde do verão

Entretanto, mesmo com tal paisagem belíssima, no centro da campina, havia algo ainda mais belo que a linda clareira

No centro da clareira, sobre uma grande pedra com algumas plantas crescendo em seus entalhos espirais criadas por — possivelmente — alguma alcatéia antiga, havia um ômega

Os cabelos negros eram levados pela brisa suave, sedosos e brilhantes, tão delicados e bonitos que o alfa não segurava seus instintos de cheirar as mechas sempre que possível

Amor de primaveraOnde histórias criam vida. Descubra agora