— GENILSON, QUEM É LARA?!
Minha mulher me perguntou berrando enquanto arremessava meu caderno de anotações do escritório em minha direção. Abaixei-me instintivamente, mas o caderno acertou o Van Dame, nosso vira-lata caramelo, que estava dormindo atrás de mim. O cachorro, acordado no susto, revidou mordendo meu calcanhar.
No reflexo, dei um chute no Van Dame, que saiu voando sobre o sofá, atingindo a mesa de canto e derrubando o abajur.
— E NÃO CHUTA O VAN DAME NÃO, SEU CRETINO! — Minha mulher gritou, agora roxa de fúria.
— Você tá maluca, sua descompensada, do que você tá falando? — Berrei de volta, puto, enquanto esfregava o calcanhar mordido.
O Stallone, nosso outro cachorro, um pinscher bom de briga, veio de algum canto da casa e, sem entender o que estava acontecendo, resolveu que era hora de "ajudar". Ele se juntou ao caos, latindo descontroladamente e rodando em círculos como se fosse um helicóptero desgovernado. Van Dame e Stallone pareciam dois exorcizados, enquanto minha mulher irritava-se cada vez mais com a barulheira.
— ME FALA AGORA QUEM É ESSA VAGABUNDA DE LARA! — Ela berrou, enquanto esperneava e pisoteava o chão, como se fosse uma criança pirracenta. Até que pisou nos cacos da lâmpada quebrada do abajur — AI MEU PÉ, AI MEU PÉ! É CULPA SUA, SEU ANIMAL! ME CORTOU, TÔ SANGRANDO! — gritava ainda mais alto.
— Que Lara? Você ficou maluca! Não tem Lara nenhuma, tá delirando e não pisa no tapete com pé cheio de sangue, vai cuidar disso! — Eu me defendia enquanto tentava entender como tudo havia saído do controle tão rápido.
— NÃO MENTE PRA MIM, SEU CANALHA! — Ela gritava com a veia na testa pulsando como se fosse explodir.
— A única Lara que eu conheço é sua amiga, mulher.
— ENTÃO VOCÊ TÁ DE CASO COM MINHA AMIGA, SEU MONSTRO! EU VOU MATAR VOCÊS DOIS! — Ela já estava pegando o celular para ligar pra ela.
Desesperado, eu tentava segurar o braço dela, enquanto o Van Dame e o Stallone continuavam descontrolados. Nesse momento, o vizinho da esquerda, bisbilhotando a gritaria, chamou a polícia, alegando violência doméstica. O vizinho da direita, incomodado com os latidos, ligou também, denunciando maus-tratos aos cachorros.
Enquanto eu tentava impedir minha mulher de ligar para a amiga, para a mãe, para o Fantástico e até para a Defesa Civil (sim, não me pergunte porquê, mas ela disse em tom de ameaça que contaria tudo para a Defesa Civil), ouvimos sirenes. Três viaturas apareceram na frente da casa como se fosse uma invasão da SWAT. Os policiais entraram sem pedir licença. O Stallone e o Van Dame investiram contra os agentes, mas não foram páreos para os homens fortemente armados até os dentes.
Me puseram sentado no sofá com as mãos no joelho. Um dos policiais, enquanto conferia meus documentos, me perguntou:
— Muito bem, senhor Genilson, o que exatamente aconteceu aqui?
Eu respirei fundo, a essa altura, já tinha entendido tudo. Então expliquei:
— Senhor policial, é o seguinte: eu vi um coach na internet dizendo que escrever afirmações positivas sobre si mesmo ajuda na autoestima. Achei uma boa ideia. Peguei meu caderno e escrevi "Genilson O Cara", com a letra mais bonita que consegui. Só que minha caligrafia é uma desgraça. O 'O' ficou parecendo um coração e o 'C' ficou cheio de voltas. No fim, minha mulher leu "Genilson coraçãozinho Lara"... e aí, bem, deu nisso.
O policial ficou incrédulo. Olhou primeiro para o Van Dame, que lambia sangue do chão como se fosse molho barbecue. Stallone, o pinscher, agora tentava fornicar com a perna de uma das policiais. Por fim, o policial olhou para minha mulher, que agora estava chorando copiosamente com o celular na mão.
Os agentes, depois de tanta frustração, foram embora sem levar ninguém preso. Mas não sem antes o mais jovem deles me dar um conselho:
— Senhor, da próxima vez, escreva no computador.
Com a saída dos policiais e a casa voltando ao "normal", o Van Dame e o Stallone começaram a lamber minha mulher, como se quisessem consolá-la.
Eu me virei e jurei nunca mais seguir conselhos idiotas da internet.
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Contos de Comédia
HumorHumor em formato de textos curtos, brincando com o cotidiano e satírizando as situações mais esdrúxulas!