A tal daquela praça

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A noite está densa. A brisa leve que sopra por entre os becos sujos da favela traz um cheiro de podridão que eu conheço bem. Do topo deste prédio, tudo parece pequeno, insignificante — exceto a praça logo abaixo. Só há uma entrada e uma saída, o lugar perfeito para uma emboscada. Ideal para o que eu preciso fazer.

Estou há semanas esperando por esse momento, e agora tudo está prestes a se desenrolar. Meus olhos percorrem a praça. Nenhum sinal do homem que eu realmente quero. Não é surpresa, ele é esperto, diferente desses vermes que infestam a cidade. Mas, mesmo assim, cada um aqui tem sangue nas mãos. Um cessar-fogo entre gangues rivais para dividir os lucros do tráfico. Eles acham que estão no controle, que governam esse pedaço podre de terra.

Idiotas.

Eu ajusto o fuzil sniper no meu ombro e observo o moleque lá embaixo. Ele está nervoso, claro. Eu consigo ver o suor brilhando na testa dele mesmo daqui de cima. Ele sabe que vai morrer. Ele vai começar o tiroteio e, assim que fizer isso, será o primeiro a cair. Eu disse a ele que sua família estava sendo torturada em uma fazenda a quilômetros daqui. Uma mentira suja, mas necessária. Na verdade, sua esposa e filha estão em um hotel de luxo, achando que ganharam uma promoção de supermercado. Eu não sou um monstro. Não como esses caras. Mas o desespero faz as pessoas agirem, e eu precisava que ele fosse desesperado.

"Desgraçados", murmuro baixinho, quase sentindo o gosto da palavra. "Hoje o meu fuzil vai atravessar o crânio daquele monstro."

Meus dedos apertam o gatilho suavemente, sem disparar. Mantenho os olhos na praça. As duas facções estão se reunindo no centro, líderes e capangas se encarando com falsa cordialidade. Eles sempre se acham intocáveis até o primeiro tiro ser disparado.

O moleque confere o relógio. Sinto o medo dele daqui. Ele levanta a arma, hesita por um segundo — talvez pensando em sua família, talvez aceitando o próprio fim — e puxa o gatilho. Dois corpos caem. Um instante depois, ele é atingido por vários disparos. Seu corpo desaba, inerte, enquanto o caos explode ao seu redor.

Gritos. Tiros para todos os lados. O pânico corre solto.

Eu ajusto minha mira, mantendo a calma. Aperto o gatilho pela primeira vez. O impacto da bala atravessa dois homens, que caem quase no mesmo instante. Três caem em seguida, e a praça se transforma em uma zona de guerra. Eu observo, frio, sem piscar. Eles são ratos em um labirinto que eu construí. O que eu queria, porém, ainda não apareceu. Meu alvo.

Mas o tal "chefe" — ou o peão que eles colocaram no comando — está correndo para o carro. Um erro amador. Ajusto minha mira uma última vez e foco no ponto fraco dele: a orelha. Respiro fundo, e o tempo parece desacelerar. O dedo pressionando o gatilho, a bala viajando silenciosamente pela noite até encontrar o lado da cabeça do homem. Ele cai, sem nem ter tempo de perceber.

Caos. Gritos. Eles estão se matando. E eu já fiz o que precisava fazer por hoje.

Desligo minha mente do massacre lá embaixo e me afasto da beira do prédio. Quando olho de novo para a praça, há mais corpos do que eu consigo contar. As balas que disparei — gravadas com a caveira de olhos vendados e 3 facas — estão lá, espalhadas entre os corpos. Eles saberão quem fez isso. Eles precisam saber. Esse é só o começo.

Eu não sou um deles, mas sou algo que eles nunca enfrentaram antes. Um caçador que não tem mais nada a perder. E a cada morte, a cada marca que deixo, eu me aproximo do verdadeiro alvo. Aquele que destruiu minha vida, que levou minha família.

Desço pelas escadas do prédio, deixando a noite me engolir de volta. Enquanto os corpos esfriam na praça, eu já estou planejando o próximo movimento. O próximo nome na minha lista. A guerra não acabou. E eu não vou parar até que todos paguem pelo que fizeram.

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⏰ Last updated: Oct 12 ⏰

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Um bom homemWhere stories live. Discover now