capítulo 1

13 3 3
                                    

Fran

Está tudo bem. Eu não tenho porquê me sentir culpada. Sou adulta agora e tenho direito de pensar em mim e no meu futuro. Eu batalhei duro para chegar até aqui, eu mereço isso! — penso enquanto entro no ônibus que vai me levar até a estação de trem. Não tenho tanta bagagem, mas mesmo assim é difícil entrar com as duas malas azuis e escuto algumas pessoas reclamando e até me chamando de burra. Como se eu estivesse fazendo isso por escolha própria. Se eu tivesse dinheiro o suficiente para ir de táxi ou Uber, eu iria.

O percurso até a estação é longa então, quando eu desembarco, já não tem tanta gente pra reclamar da minha demora para descer. Passo direto pela bilheteria, afinal comprei minha passagem a semanas, e apresento ao guarda que, após uma breve olhada na passagem, me deixa passar e me indica o caminho até minha estação de embarque. E eu aguardo ansiosamente até que meu trem chegue encarando o painel na parede oposta com a programação. Verifico a hora de chegada e faltam pouco mais de 20 minutos. Tiro minha mochila das costas e pesco um pacote de m&m para ocupar minha boca e diminuir minha ansiedade.

Não demora muito e vejo o trem se aproximando a distância, então me apresso em guardar o que tenho nas mãos e colocar a mochila nas costas outra vez. Assim que ele para, começo minha luta para guardar minhas malas no bagageiro enquanto as outras pessoas desembarcam. Apresento minha passagem ao bilheteiro que me ajuda com as malas e me deixa embarcar. Encontro a cabine, mas quando abro a porta, vejo que há alguém dormindo junto à janela. Ele tem cabelos castanhos, aparenta ser alto e com longas pernas, seus ombros são largos, osbraços estão cruzados, mas o resto fica para a imaginação visto que ele está vestindo roupas largas e negras como breu. Pela sua postura, qualquer um diria que ele está relaxado, mas seu rosto diz o contrário. Testa franzida, mandíbula cerrada... Seria um pesadelo?

Alguém passa por mim e diz que eu preciso me sentar e eu não me viro para checar quem é, apenas me sento no assento em frente ao rapaz adormecido. Sei que não é uma boa ideia. Sempre fico enjoada se me sento de costas para a frente do veículo em que viajo, mas a ideia de me sentar do lado de um cara adormecido num trem... Pode passar a ideia errada. Ele pode pensar que eu o estou assediando!

Infelizmente não consigo sustentar essa decisão por muito tempo. Mal o trem começou a andar e eu já estou enjoada. Faço de tudo para superar o desconforto. Respiro dentro de um saco, mastigo chicletes de menta, mas nada adianta. Então me rendo e me jogo no lugar ao lado do estranho adormecido. É uma viagem de mais de 2 dias, não vou aguentar tanto tempo enjoada.

— Para onde está indo? — a pessoa sonolenta so meu lado me pergunta sem abrir os olhos ou se mover. Penso em responder, mas talvez não seja uma boa ideia contar isso a um estranho. Ele poderia ser um psicopata! Ele até se veste de forma suspeita.  Não que eu já tenha visto um psicopata... Será que eu já vi um? Talvez tenha visto, né? Não é como se eles viessem com uma faixa dizendo que são psicopatas — Você está se perdendo em seus pensamentos? Questionando-se sobre responder ou não? — ele sonda e acerta em cheio. Sou tão transparente assim? — Conversar faz o tempo passar mais rápido e ajuda a diminuir o nervosismo. E você parece bem nervosa. Está fujindo? 

— Não estou fugindo! — me apresso em responder e respiro fundo para me recompor — Estou indo de mudança para a faculdade.

— Eu estou voltando para a minha. As férias estão acabando então é hora de voltar — ele diz e finalmente abre os olhos. São lindos olhos escuros, assim como tudo nele. — Por que está viajando de trem? A maioria das pessoas preferem viajar de avião ou até mesmo de carro.

— Não sou como a maioria das pessoas. Não tenho carro, não sei dirigir e tenho medo de voar — respondo calmamente e dou de ombros — Sem falar que ir de ônibus sairia mais caro para mim, demoraria mais e não seria tão confortável. — Me viro totalmente para ele — E você, por que viajar de trem? Você não parece ter as mesmas limitações que eu e não parece o tipo que tem medo de voar.

Minha ObsessãoOnde histórias criam vida. Descubra agora