1. Marés de Recomeço.

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Cassandra respirou fundo ao abrir a janela da pequena casa que alugara. A brisa do mar, fria e um pouco áspera, envolveu seu rosto, carregando consigo o cheiro salgado da praia. O som das ondas quebrando na areia trazia uma sensação de paz e nostalgia, como se já conhecesse aquele lugar de outros tempos, embora fosse a primeira vez que visitava aquela cidadezinha litorânea.

A decisão de se mudar para ali fora impulsiva. Após o término de um relacionamento longo e doloroso, ela sentiu que precisava de um recomeço. Precisava de espaço e de silêncio para reencontrar o próprio ritmo. Sua paixão pela fotografia ainda era forte, mas nos últimos tempos, a câmera tinha se tornado quase um fardo. Cada imagem parecia esvaziada, sem a profundidade que sempre fora sua marca.

Ela estava na casa havia três dias, e já começava a sentir a magia do lugar. Ali, o tempo parecia andar em um compasso diferente, em sintonia com a maré. Colocou a câmera ao redor do pescoço, sentindo o peso familiar que era quase uma extensão de seu corpo. Saiu e caminhou lentamente pela praia, observando o céu nublado, que parecia refletir seu estado de espírito. De vez em quando, parava para tirar algumas fotos, tentando capturar a dança das ondas contra as rochas.

Em uma dessas paradas, ela avistou, à distância, uma figura sentada em uma pedra mais alta, perto da orla. A mulher estava sozinha, de costas para a praia, olhando fixamente para o mar. Seu cabelo dourado como a luz do sol, solto, balançava ao vento, e ela parecia imersa em algum tipo de ritual silencioso. Um caderno estava apoiado em seu colo, e de tempos em tempos, ela o folheava com uma atenção absorta. sentiu algo familiar e misterioso naquela imagem. Havia uma beleza silenciosa naquela figura solitária, algo que evocava os próprios sentimentos que ela tentava processar desde que chegara ali. Instintivamente, ajustou a câmera, tentando capturar a cena de longe. Mas, ao apertar o botão, o som do clique quebrou o silêncio, e a mulher virou a cabeça, fixando o olhar diretamente na câmera.

Surpresa, Cassandra hesitou, mas logo sorriu, tentando não parecer invasiva. Levantou a mão, fazendo um gesto tímido de desculpa. A mulher permaneceu imóvel por alguns segundos, apenas observando, como se tentasse decifrá-la. Então, seus lábios se curvaram em um sorriso leve, quase imperceptível, antes de acenar de volta, de maneira contida.

Aquele breve contato visual e aquele sorriso - quase como um segredo compartilhado - acenderam algo no peito de Cassandra. Ela decidiu se aproximar, movida por uma curiosidade irresistível e pela estranha sensação de que aquela mulher tinha algo a ver com sua jornada. Enquanto caminhava em direção a ela, notou mais detalhes. A mulher usava um casaco grosso de lã, que parecia antigo, quase vintage, e estava sentada com uma postura firme, mas com uma expressão que sugeria uma profunda introspecção. Quando Cassandra parou ao seu lado, ela virou-se ligeiramente, como quem se prepara para receber uma visita inesperada.

- Está escrevendo? - Cassandra perguntou, apontando para o caderno.

A mulher hesitou, seus olhos analisando com uma leve desconfiança antes de responder. Finalmente, ela assentiu, segurando o caderno de forma protetora.

- Algo assim... - respondeu ela, com um tom de voz suave, porém forte. - Mas, honestamente, as palavras têm sido ingratas ultimamente.

Cassandra sorriu, simpatizando com o sentimento. Sabia bem o que era essa frustração com a criação. Ela mesma estava ali para reencontrar a inspiração perdida.

- Sei como é. Estou tentando reencontrar o sentido das imagens - disse, indicando a câmera que segurava.

Um breve silêncio se formou entre as duas, mas não era desconfortável. A mulher a observou por um instante, como se tentasse compreender a profundidade daquele olhar. Havia algo nos olhos de Cassandra que a fez relaxar.

- É engraçado como somos atraídas por lugares assim, não é? - a mulher continuou, voltando a olhar o mar. - Parece que o mundo aqui corre mais devagar, que as coisas podem acontecer sem pressa.

Cassandra sentiu que aquela frase tocava fundo em algo que ela ainda não tinha conseguido formular. Sorriu, com a sensação de que, finalmente, estava começando a entender por que tinha escolhido aquele lugar.

- Talvez seja isso - respondeu. - Às vezes, acho que precisava de um lugar onde o tempo não me pressionasse a encontrar respostas.

As duas se entreolharam, um entendimento silencioso se formando entre elas. Cassandra sentiu uma ligação com aquela mulher, como se fossem duas almas com a mesma busca, embora cada uma seguisse um caminho diferente.

- Eu me chamo Cassandra Armond - disse, estendendo a mão, o gesto quebrando o silêncio confortável.

- Taylor Swift- respondeu a mulher, apertando sua mão. O toque de Taylor era quente, um contraste com o vento frio da praia, e ao mesmo tempo breve, como se ela tivesse medo de se deixar ir demais.

A cada momento que passavam em silêncio, algo parecia se construir entre elas, algo indefinido, mas inegável. Cassandra sentia que havia muito mais em Taylor do que aquela postura reclusa deixava transparecer. Quase podia ver as histórias, as lembranças e as feridas escondidas nas expressões cuidadosamente guardadas.

Antes que pudesse pensar em algo para dizer, um cachorro surgiu do nada e começou a correr ao redor de Taylor, latindo alegremente. Cassandra riu, enquanto a maior tentava afastá-lo, embora claramente estivesse divertida.

- Aparentemente, você já é popular por aqui - disse Cassandra, rindo.

- Esse aqui é um vizinho persistente - Taylor respondeu, acariciando a cabeça do cachorro antes de se levantar. - Bom, Cassandra, foi um prazer. Espero que... nos vejamos por aí.

A frase ficou no ar, carregada de uma promessa implícita. Cassandra assentiu, um pouco desapontada com a despedida repentina, mas ainda envolvida pela intensidade daquele breve encontro. Observou Taylor se afastar pela praia, a silhueta dela se misturando com a névoa e o céu acinzentado.

Quando finalmente ficou sozinha, ergueu a câmera e tirou uma última foto: a imagem de Taylor caminhando, uma figura solitária contra o vasto cenário do mar. A foto parecia conter algo especial, algo que talvez só ela pudesse entender naquele momento.

De volta à sua casa, Cassandra transferiu as imagens para o computador e passou um tempo olhando aquela última foto de Taylor, tentando decifrar o que sentia. Havia algo de poético e melancólico naquela mulher misteriosa, algo que falava diretamente com sua própria solidão.

Foi então que percebeu que, ao menos por agora, sua busca por significado a levaria até Taylor.

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⏰ Última atualização: 4 days ago ⏰

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