Destinada- Bruxa Branca

I - É tudo tão.... estranho

– "Where have you been? Do you know when you're coming back? 'cause since you've been gone I've gota along but I've been sad" – cantarolava na caminhonete velha do meu pai.

Diferente do que muitos pensam, nem sempre as músicas que escutamos refletem o que sentimos. Tome como exemplo "Reflections" de The Neighbourhood — uma música que eu amo, mas que não tem nada a ver com a minha vida. Talvez a vida pudesse ser assim também, desconexa, um emaranhado de momentos aleatórios que não nos atravessam de verdade. Por exemplo... se o seu pai ou sua mãe morresse, isso poderia ser apenas um ruído, uma música tocando no rádio ou no Spotify no modo aleatório. Mas não é assim. Nunca é. Aperto minhas mãos no volante.

A morte não combina com eles. Não combina com a mamãe, nem com o papai. Eles eram vivos demais, intensos demais. E, ainda assim, aqui estou eu, tentando aceitar que eles se foram. Não posso dizer que não combinam com um caixão porque nem isso lhes restou. O carro explodiu. Eles foram carbonizados vivos. Meu estômago se revira só de pensar nisso, mas a morte ainda parece tão fora de lugar para eles.

Mamãe, com seu jeito doce, conseguia suavizar até mesmo o temperamento ácido do papai. Iris era como sol, iluminando tudo ao redor, enquanto eu e papai éramos sombras — fechados, gelados, intensos. Ela era a doçura que nos mantinha equilibrados. Agora, tudo está quebrado, sem conserto.

Papai, apesar de ser fechado, era como um sol para mim e para a mamãe. Mesmo com seu jeito carrancudo, ele era como uma árvore em dias quentes, oferecendo uma sombra onde se pode descansar. E, às vezes, quando parecia que o calor era demais, ele era aquele ventinho suave que vinha do nada, trazendo um alívio inesperado.

Nossa família era assim, unida, até o acidente. Papai e mamãe estavam voltando de um jantar, aquele em que eu decidi não ir. Nem sei mais o porquê da minha escolha, mas hoje tudo que sinto é arrependimento. Eu deveria ter ido. Deveria estar com eles. Não sei se poderia ter evitado o que aconteceu, mas pelo menos estaria ao lado deles.

Papai sempre dizia: "Família permanece junta." Mas eu não estava com eles naquele momento. E isso dói mais do que qualquer palavra consegue descrever.

Agora estou a caminho da cabana — a única coisa que restou para mim, o que meus pais deixaram. Uma cabana no meio de uma floresta esquecida por tudo e por todos. Aquele lugar sempre teve algo de estranho. As árvores são gigantescas, tão altas que é impossível enxergar o topo, como se quisessem tocar o céu. Entre elas, uma escuridão densa e opressora, mesmo agora, às quatro da tarde. Não me lembro do clima da floresta ser dessa forma, não lembro dessa energia pesada......

O sol ainda está no céu, mas ali dentro, entre aquelas árvores, parece que ele nunca brilhou. É como se o tempo parasse, e a floresta sussurrasse segredos que ninguém deveria ouvir.

Parece que a floresta sabe que estou aqui. É como se ela sentisse a minha presença, como se me observasse em silêncio. Meu coração está acelerado agora, batendo com força contra o peito, e eu nem sei o motivo. Não há barulho, nada se move entre as árvores, mas a sensação é inescapável — algo está me acompanhando, mesmo que eu não consiga ver.

Instintivamente coloco o pé no acelerador para chegar à cabana o mais rápido possível, mas a caminhonete começou a engasgar. Primeiro foi um som baixo, quase imperceptível, como um estalo. Depois, veio o barulho mais grave, um estrondo seco, como se algo tivesse se soltado de repente. O motor tossiu, uma última tentativa de continuar, antes de morrer por completo. Olho para o lado e para o outro e coloco a testa no volante e bufo, eu sabia que não deveria confiar em algo tão velho, mas era do papai, e isso fazia com que eu me recusasse a deixá-la para trás.

A luz do painel piscou algumas vezes antes de apagar completamente. Tudo ficou em silêncio. O tipo de silêncio que só uma floresta como essa pode oferecer — denso, sufocante, quase palpável. Tentei girar a chave mais uma vez, mas o som que veio foi de pura derrota: o motor girava em falso, como se algo estivesse preso no eixo de comando ou no alternador.