Como tudo começou

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As ruas fervilhavam com o caos habitual do Inferno, mas para Alastor, o passeio era bem agradável.

Niffty saltitava ao seu lado, com as mãos pequenas segurando o pedaço de torta que a tia Rosie insistiu em embalar para viagem. A velha viúva canibal sempre tinha um sorriso sinistro, mas Niffty adorava suas histórias... e sua torta de carne duvidosa.

Niffty adorava Rosie e tinha certeza de que nenhuma outra “tia" no Inferno era tão divertida ou tão talentosa com facas...ou envenenamento.

De repente, uma demonia de vestido apertado e saltos altos se aproximou de Alastor, piscando exageradamente e jogando charme para o Radialista. Ele, que já não era fã de proximidade física, manteve o sorriso enquanto tentava recuar educadamente.

— Alastor, querido... Não sabia que você frequentava essas bandas — Ela disse, inclinando-se perigosamente perto, com um sorriso que sugeria segundas, terceiras e talvez quartas intenções

— Estou apenas... passando. Com licença — Alastor manteve seu sorriso usual, mas seus olhos brilhavam com irritação mal disfarçada. Ele deu um passo para trás

— Sabe, poderíamos fazer algo divertido... só nós dois — a demônia deu mais um passo a frente

— Sinto muito, mas meu conceito de diversão certamente não envolve você. Boa tarde! — Ele girou sobre os calcanhares sem esperar uma resposta, voltando sua atenção para Niffty

Enquanto isso, a pequena demônia, distraída pelo movimento ao redor, esbarrou em um demônio corpulento que carregava um saco de mercadorias. Ele se virou para ela com uma carranca feroz.

— Cuidado aí, garota! Sua mãe não te educou?

Niffty piscou, parando de mastigar sua torta. Ela inclinou a cabeça para o lado, claramente confusa.

— O que é uma mãe? — perguntou, sua voz aguda chegando aos ouvidos de Alastor

Alastor parou no meio de um passo.

Ele lentamente virou a cabeça, seus olhos arregalando-se levemente. Um arrepio percorreu sua espinha.

“Ah, não...” pensou ele.

—  Você tem uma mãe? —  ela perguntou ao demônio mau humorado a sua frente

—  Há! Claro que sim! —  ele diz recolhendo as mercadorias que caíram —  Todos temos uma mãe!

— Todos? —  Niftty olhou para um lado, em seguida para o outro — Todo mundo?

Niftty andou ao redor de si mesma, seu único olho procurando...e procurando...mas não viu ningúem.

— Mamãe? — ela andou até uma outra demônia que estava por perto —  Você é a minha mãe?

— O quê? Claro que não sou sua mãe, pirralha! — resmungou, afastando-se rapidamente

Niffty franziu o cenho, começando a andar em círculos, seus pequenos pés apressados, enquanto olhava para todos os demônios que passavam.

— Mamãe? — chamou novamente, sua voz cada vez mais preocupada.

Ninguém respondeu.

Ela parou, abraçando seu pedaço de torta com força, e seus lábios começaram a tremer.

— Eu... eu não tenho uma mamãe? — sua voz saiu baixa, quase um sussurro, enquanto seu olho se encheu de lágrimas

Alastor suspirou profundamente, cruzando os braços.

—  Ora, Niffty, não seja boba. Uma mãe é… desnecessária. Você não precisa de uma.

Niffty balançou a cabeça, lágrimas rolando por seu rosto.

— Mas... mas todo mundo tem! Eu... eu também quero uma mamãe! — ela soluçou, enxugando o olho com a manga

Alastor sentiu uma dor de cabeça latejante começar a pulsar. Ele fechou os olhos por um momento, massageando as têmporas enquanto a pequena demônia choramingava.

— Muito bem, chega disso — Ele se abaixou, pegando Niffty no colo.

Ela imediatamente se agarrou a ele, soluçando baixinho enquanto enterrava o rosto em seu ombro.

— Mas eu quero uma mamãe... — ela murmurou entre soluços — O que uma mamãe faz? Ela é legal? Ela conta histórias? Ela cozinha coisas boas como a tia Rosie? Por que eu não tenho uma? Eu posso ter uma? Onde eu arranjo uma? Podemos comprar?

Quando chegaram ao hotel, Niffty havia parado de chorar, mas ainda parecia abatida. Assim que entraram no saguão, ela pulou do colo de Alastor e, antes que ele pudesse dizer algo, sumiu em uma das muitas portas do hotel.

Husker, que estava limpando o balcão, ergueu uma sobrancelha ao ver a pequena demônia desaparecer.

— O que deu na pequena agora? Tá com uma cara mais azeda que a sua.

— Apenas outra fase, Husker — Alastor suspirou profundamente, massageando novamente as têmporas — Só uma fase...

— Boa sorte com isso — Husker soltou uma risada curta.

Procura-se uma mãe | RádioDustOnde histórias criam vida. Descubra agora