Entre linhas e passes

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🎬|Milena

Eu nunca me canso de ver a rotina de um treino profissional. Há algo no som das chuteiras batendo no chão e no grito dos técnicos que me fascina. Hoje, no entanto, meu foco estava em João Gomes. Após a entrevista de ontem, eu tinha certeza de que havia mais por trás daquele meio-sorriso e das respostas cuidadosas.

Ele estava no campo com os outros jogadores, rindo de algo que um companheiro disse. Diferente da postura defensiva que adotou comigo, agora parecia à vontade, como se o campo fosse seu verdadeiro lar. Eu estava observando à distância, fazendo algumas anotações no meu caderno, quando ele percebeu minha presença.

— Não vai perguntar nada hoje? — ele gritou, do outro lado do campo, com um sorriso no rosto.

Aquilo me pegou de surpresa. Ele não parecia o mesmo João da entrevista, tenso e cauteloso.

— Não quero atrapalhar o treino! — gritei de volta, rindo.

Ele deu de ombros e voltou a correr, mas por alguns segundos me senti desconcertada. Algo me dizia que, ao contrário do que imaginei, ele estava mais atento a mim do que eu pensava.

Durante o intervalo, João se aproximou do banco onde eu estava sentada.

— Você parece interessada demais no treino. Alguma crítica sobre o meu desempenho? — perguntou, com uma ironia leve na voz.

— Até que você é bom — respondi, no mesmo tom. — Mas pode melhorar nos passes longos.

Ele riu, e naquele momento percebi que ele estava baixando a guarda. Era um lado que eu não tinha visto antes, mais leve, mais humano.

— Então você é especialista em futebol agora? — provocou.

— Eu faço meu dever de casa, Gomes.

Essa troca foi rápida, mas suficiente para eu perceber que havia uma linha tênue entre o profissionalismo e o interesse pessoal. Um lado meu queria continuar sendo apenas a jornalista. O outro queria entender quem era João Gomes de verdade.

⚽️|João

Eu tinha visto ela chegando cedo no treino, caderno e caneta na mão, com aquele olhar de quem queria devorar cada detalhe. Milena Almeida não era como os outros jornalistas que passam pelos treinos. Ela não ficava em busca de fofoca. Parecia realmente interessada em entender o que acontecia ali.

Enquanto corria no campo, percebi que ela me observava. Não com aquele olhar invasivo, mas como quem tentava decifrar algo. Isso me incomodava um pouco, mas também me fazia querer saber o que ela estava pensando.

No intervalo, resolvi provocá-la.

— Você parece interessada demais no treino. Alguma crítica sobre o meu desempenho?

Ela levantou os olhos do caderno, sem hesitar:

— Até que você é bom. Mas pode melhorar nos passes longos.

Não consegui evitar uma risada. Ela tinha coragem, isso eu tinha que admitir.

— Então você é especialista em futebol agora?

— Eu faço meu dever de casa, Gomes.

Havia algo na maneira como ela me respondia. Era direta, mas não invasiva. Senti que podia conversar com ela sem medo de virar manchete. Isso era raro.

Quando o treino acabou, vi Milena recolher suas coisas e sair do campo. Fiquei observando por alguns segundos antes de voltar para o vestiário. Pela primeira vez, me perguntei o que ela realmente queria descobrir sobre mim.

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