Primeiro Natal

2 0 0
                                    

Tinha dezesseis e estava enamorada por um colega da minha classe, ele retribuía os sentimentos e tudo se encaminhava para um relacionamento sério. Não tinha mais a minha mãe pra me dar conselhos, infelizmente a perdi antes dos meus dez anos para um câncer. Tudo que ouvia eram conselhos da mãe do meu melhor amigo, mas ela era mãe de menino e mesmo sendo uma senhora, seus conselhos não eram muitos confiáveis. Não tinha intenção de ir além de beijos com Ruan, acreditava e muito nos ensinamentos do velho padre João e não queria ser queimada por praticar fornicação seja lá o que isso for.
Ruan é um doce, me trata com muito respeito e me convidou para passar a véspera de Natal com ele e sua avó, insisti muito com papai seria uma ocasião especial e merecia a minha presença, ele relutou um pouco disse que já havia um compromisso marcado com a família de Antônio e seria rude cancelar, afinal eram amigos de longa data. No final decidimos que eu iria na véspera conhecer a a família de Ruan e papai ficaria com os Venturi mas o almoço do dia vinte e cinco iria me reunir a eles, pensei que iria ficar muito feliz mas fiquei estranha, pela primeira vez iria estar longe do meu pai e de Antônio, meu melhor amigo.
Na manhã da véspera de Natal me arrumei cedo preparei uma pequena bolsa, não iria dormir na casa dos Fontana, haveria um pequeno brunch e um almoço tardio, por volta das 18 horas seria servido um pequeno chá e as 21 seria a ceia natalina, Patrick assistente de papai iria me buscar assim que terminasse a sua ceia, insisti que não era preciso, mas ele assim como papai não gostam da ideia de me verem voltar tarde para casa. Ambos assumiram esse cuidado exagerado comigo e gosto dele como parte da família.
Ruan cumpriu o prometido, sua avó era encanadora, e sua mãe maravilhosa, a manhã passou rapidamente. Entre quitutes requintados e bolos finos tivemos uma conversa entre risos e brincadeiras, após o brunch, conheci o jardim da senhora Noémia e escutei suas histórias de um infância, senti falta de ter uma mãe, até mesmo uma avó, ela toda sorridente com cabelos branquinhos, confidenciei que não sabia cozinhar e que sentia muita falta dos bolinhos que mamãe fazia e que infelizmente não pode me ensinar. A senhora arregalou os olhos e disse que eram os bolinhos preferidos da filha e seria um ótimo acréscimo para o chá da tarde, disse que fazia muito tempo que não fazia mas nada como uma um segundo par de mãos ajudando não desse jeito.
Após o almoço pedi a Ruan para levar Calista sua mãe para um passeio, ele estranhou um pouco mais sua avó me apoiou e meia hora depois eles saiam com a promessa de retornar antes do chá, a ceia está quase pronta uma equipe fora contratada especialmente para isso. Noémia perguntou o andamento de tudo e como faltava poucos detalhes pediu para que eles descansarem por uma hora pois iríamos utilizar a cozinha. A senhorinha era um furacão, e em pouco tempo a massa estava pronta só faltava fritar, ela escolheu a panela e começou a fritar o tempo inteiro me explicando passo a passo do que fazer e como fazer. Em dado momento o telefone tocou e com restavam poucos me ofereci para terminar, ela sorriu e saiu da cozinha para conversar com privacidade no corredor, não queria ouvir a conversa então liguei o pequeno rádio que havia no balcão, aumentei o fogo da panela com óleo e coloquei diversos bolinhos para fritar juntos, acreditando que com mais calor e mais bolinhos terminaria a tarefa na metade do tempo.
Não sei ao certo o que aconteceu, foram uma sequência de acontecimentos que gerou um certo pandemônio, no rádio tocava Shakira, amava a música e usei a colher como microfone, dancei e cantei a música no ritmo certo até aumentando alguns decibéis do som me esquecendo do fogo e dos bolinhos, assim que o pequeno espetáculo terminou me virei para retirar os bolinhos já não havia solução, a panela estava preta e um chama se projetava dela e no vidro do fogão aparentemente havia um guardanapo de tecido que ajudou a aumentar o pequeno foco de incêndio, mais ao lado também estava um recipiente com toalhas de papel que seria usadas para receber os próximos bolinhos, tudo era material para alimentar as chamas que tomavam conta do fogão, me desesperei corri até a pia e enchi um copo com água e atirei na panela, o fogo subiu ainda mais atingindo uma altura assustadora, soltei o copo e peguei um guardanapo abanar na tentativa de abafar um pouco as chamas, ledo engano, o pano seco estava e também pegou fogo, atirei o mesmo longe que caiu em cima de mesa onde estavam as decorações para a ceia de jantar que iria acontecer no jardim, havia velas em castiçais guardanapos de linhos, bolinhas de natal, e bonecos de neve que também começaram a queimar. Não houve mais jeito tive que chamar a senhora Noémia que se distanciou ainda mais por causa da música e no momento não se encontrava em nenhum lugar, corri pela casa gritando desesperada com medo do fogo invadir a casa toda e nada, parei na sala e usei o telefone para discar para os bombeiros. Dona Noémia descia as escadas com um sorriso que se apagou ao ver meu estado e sentir o cheiro de fumaça, correu para a cozinha e tentou salvar um pouco do que seria a ceia de natal.
Os bombeiros tinham um posto de atendimento bem próximo chegaram rapidamente e logo conseguiram salvar a casa da Família Fontana, a senhora Noémia foi hospitalizada pois inalou muita fumaça, Calista e Ruan me deixaram em frente a casa de Antônio às 19 horas mesmo com as minhas insistências em querer ficar e ajudar eles. Suas respostas foi curta e grossa. Muito ajuda quem não me atrapalha e saiu com carro. Meu amigo me consolou a noite toda. Não comi da ceia. Optei por ficar na sala de TV assistindo algum filme ele trouxe um pouco de pipoca e refrigerante, chorei muito e ele me ouviu. Vezes ou outra segurou a risada mas estava lá. Foi o meu primeiro Natal trágico. Ruam mudou de escola nunca mais falou comigo. E as flores que enviei com minhas desculpas voltaram.
Os próximos natais não foram muitos diferentes. Sempre acontecia alguma tragédia ou alguma força que me empurrava pra longe da minha noite feliz.

20 natais de Clara Onde histórias criam vida. Descubra agora