Mantenha seus amigos por perto...

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Procure e acharás - o que não é procurado, não será encontrado.
- SÓFOCLES

Você já teve alguma amiga que tenha dado as costas para você? Totalmente transformada, de alguém que você conhecia, em... outra pessoa? Não estou falando sobre seu namorado do jardim de infância, que cresceu e virou um esquisito feioso e cheio de espinhas, ou da sua amiga do acampamento, com quem você não tinha assunto quando ela lhe fez uma visita no Natal, ou mesmo uma garota da sua galera, que, de uma hora para a outra, sai do grupo e vira gótica ou então uma dessas naturebas radicais. Não. Estou falando sobre sua alma gêmea. A garota sobre quem você sabe tudo. A garota que sabe tudo sobre você. Um belo dia, ela aparece e é uma pessoa bem, bem diferente.
Bem, isso acontece. Isso aconteceu em Rosewood.
- Cuidado, Aria. Seu rosto vai ficar paralisado desse jeito. - Spencer Hastings abriu um picolé Popsicle de laranja e colocou na boca. Ela estava falando sobre o olhar enviesado de pirata bêbado que sua melhor amiga, Aria Montgomery, estava fazendo enquanto tentava acertar o foco de sua Sony Handycam.
-Você parece minha mãe falando, Spencer. - Emily Fields riu, ajeitando a camiseta que mostrava um pintinho de olhos esbugalhados e dizia FRANGUINHA NADADORA INSTANTÂNEA! É SÓ ADICIONAR ÁGUA! As amigas haviam proibido Emily de usar camisetas com dizeres idiotas sobre natação.
- Idiota nadadora instantânea! É só adicionar perdedor! - brincou Alison DiLaurentis, quando Emily chegou.
- Sua mãe também diz isso? - perguntou Hanna Marin, jogando fora o palito esverdeado do Popsicle. Hanna sempre comia mais rápido que as outras. - Seu rosto vai ficar paralisado desse jeito! - imitou.
Alison olhou Hanna de cima a baixo e gargalhou:
- Sua mãe deveria ter avisado a você que sua bunda poderia ficar paralisada desse jeito!
Hanna ficou lívida e ajeitou a camiseta de listras brancas e cor-de-rosa - que ela havia pegado emprestada de Ali e que vivia revelando uma faixa branca de sua barriga. Alison deu um toque de leve na canela de Hanna, com sua rasteirinha.
- É brincadeira.
Era uma sexta-feira à noite do mês de maio, perto do final do sétimo ano, e um grupo de amigas íntimas -Alison, Hanna, Spencer, Aria e Emily - estava reunido na pomposa sala de estar da casa de Spencer, com uma caixa de Popsicle, uma garrafa grande de Dr. Pepper diet sabor cereja com baunilha, com seus telefones celulares largados na mesinha de centro. Um mês antes, Ali tinha ido para a escola com um celular LG flip novinho, e as outras correram no mesmo dia para comprar um igual. Todas elas tinham porta-celulares de couro rosa também, para combinar com o de Ali - bem, todas menos Aria, cujo porta-celular cor-de-rosa era feito de lã. Ela mesma o tricotara.
Aria moveu a alavanca da câmera para a frente e para trás para ajustar o zoom.
- E, de qualquer forma, meu rosto não vai ficar paralisado desse jeito. Estou me concentrando em focar direito essa tomada. Isso vai ficar para a posteridade. Para quando ficarmos famosas.
- Bem, nós todas sabemos que eu vou ficar famosa. - Alison jogou os ombros para trás e virou a cabeça de lado, deixando à mostra seu pescoço de cisne.
- Por que você vai ficar famosa? - provocou Spencer, parecendo mais malvada do que provavelmente queria soar.
-Vou ter meu próprio programa de televisão.Vou ser uma Paris Hilton mais inteligente e mais bonita.
Spencer bufou. Mas Emily fez um biquinho com os lábios pálidos, refletindo a respeito e Hanna acenou com a cabeça, concordando. Aquela era Ali. Ela não ficaria ali em Rosewood, Pensilvânia, por muito tempo. Claro, Rosewood era glamourosa sob qualquer aspecto - todos os moradores pareciam modelos de passarela prontos para uma sessão de fotos para a revista Town & Country - mas todos sabiam que Ali estava destinada a coisas maiores.
Ela as tinha tirado do anonimato, um ano e meio atrás, tornando-as suas melhores amigas. Com Ali ao seu lado, elas haviam se tornado as garotas de Rosewood Day, a escola par- ticular que frequentavam. Elas se tornaram tão poderosas que decidiam quem era descolado e quem não era, davam as melhores festas, pegavam os melhores lugares na sala de estudos, concorriam ao grêmio estudantil e venciam por um número de votos avassalador. Bem, essa última parte só se aplicava a Spencer. Apesar de enfrentarem alguns altos e baixos - e de, acidentalmente, terem cegado Jenna Cavanaugh, coisa na qual elas tentavam ao máximo não pensar -, as vidas delas haviam se transformado de toleráveis em perfeitas.
- E se nós filmássemos um talk show? - sugeriu Aria. Ela se considerava a cineasta oficial do grupo. Uma das coisas que queria ser quando crescesse era o próximo Jean-Luc Godard, um desses diretores franceses abstratos. -Ali, você é a celebridade. E, Spencer, você é a entrevistadora.
- Eu serei a maquiadora - ofereceu-se Hanna, remexendo em sua mochila para encontrar a bolsinha de maquiagem de vinil estampada com bolinhas.
- Eu serei a cabeleireira. - Emily ajeitou o cabelo louro-avermelhado atrás das orelhas e foi para perto de Ali. -Você tem um cabelo maravilhoso, chérie - elogiou, fingindo um sotaque francês.
Ali tirou o Popsicle da boca.
- Chérie não quer dizer namorada?
As outras começaram a rir, mas Emily empalideceu.
- Não, isso é petite amie. - Ultimamente, Em andava meio sensível em relação às
piadas de Ali. Ela não costumava ser assim.
- Ok. -Aria certificou-se de que a câmera estava ajustada. - Estão prontas, meninas? Spencer se jogou no sofá e colocou na cabeça uma tiara de diamantes falsos que sobrara
da última festa de Ano-Novo. Ela carregara aquilo a noite toda.
-Você não pode usar isso - rosnou Ali.
- Por que não? - Spencer tinha ajeitado a tiara na cabeça, e ela parecia uma coroa.
- Porque não. Se fosse o caso, eu seria a princesa.
- Por que você sempre é a princesa? - disse Spencer entre os dentes. As outras
meninas se agitaram. Spencer e Ali não andavam se dando muito bem, e ninguém sabia por quê. O telefone de Ali fez um barulhinho. Ela o alcançou, abriu-o e o virou de forma que
ninguém conseguisse ler a mensagem.
- Que adorável. - Seus dedos voavam no teclado conforme ela digitava o texto.
- Para quem você está escrevendo? - A voz de Emily soou baixa e frágil, como uma
casquinha de ovo.
- Não posso contar. Desculpe. - Ali não ergueu os olhos.
-Você não pode contar? - Spencer estava furiosa. - O que você quer dizer com não
poder contar?
Ali deu uma olhada para ela.
- Sinto muito, princesa. Você não tem que ser informada sobre tudo. - Ali fechou o telefone e o colocou no assento do sofá de couro.- Não comece a filmar ainda,Aria, preciso fazer xixi. - Ela saiu rapidinho da sala, e seguiu para o banheiro, jogando o palito do Popsicle no lixo no caminho.
Assim que elas ouviram a porta do banheiro bater, Spencer foi a primeira a falar. -Vocês simplesmente não desejam matá-la, de vez em quando?
As outras hesitaram. Elas nunca falavam mal de Ali. Era uma blasfêmia tão grande
quanto queimar a bandeira oficial de Rosewood Day dentro do terreno da escola. Ou admitir que Johnny Depp não era assim tão gato, mas, na verdade, meio velho e esquisito.
Claro, em particular, a história era outra. Naquela primavera, Ali não havia estado muito presente. Ela tinha ficado mais próxima das meninas do ensino médio, que faziam parte do time de hóquei e nunca convidava Aria, Emily, Spencer ou Hanna para almoçar com elas ou para irem ao shopping King James.
E Ali começou a ter segredos. Mensagens de texto, telefonemas e risadinhas secretos sobre coisas que não lhes contava. Elas haviam entregado suas almas a Ali - contando para ela coisas que não tinham contado para as outras, coisas que elas não queriam que ninguém soubesse - e esperavam reciprocidade. Ali não havia feito com que todas prometessem que iriam contar umas às outras tudo, absolutamente tudo, até o final dos tempos?
As garotas odiavam pensar em como seria o oitavo ano se as coisas continuassem daquele jeito. Mas isso não significava que odiavam Ali.
Aria enrolou uma mecha de cabelo comprido e escuro em um dos dedos e deu uma risada nervosa.
- Matá-la por ela ser tão linda, talvez. - Aria apertou um botão na câmera, ligando-a. - E porque ela veste tamanho trinta e quatro - acrescentou Hanna.
- Foi isso que eu quis dizer - Spencer deu uma olhada para o telefone de Ali, que
estava preso entre duas almofadas do sofá. - Querem ler as mensagens dela?
- Eu quero - sussurrou Hanna.
Emily levantou-se de seu assento no braço da poltrona.
- Eu não sei... - Ela começou a se afastar devagarinho do telefone de Ali, como se o
simples fato de estar perto do aparelho já a incriminasse.
Spencer pegou o celular de Ali. Olhou com curiosidade para a tela em branco.
- Ah, vai! Vocês não querem saber quem mandou a mensagem para ela?
- Provavelmente, foi só a Katy - sussurrou Emily, referindo-se a uma das amigas
de hóquei de Ali. -Você deveria colocá-lo onde estava, Spence.
Aria tirou a câmera do tripé e foi na direção de Spencer.
-Vamos ver.
Elas se reuniram em torno do aparelho. Spencer abriu o telefone e apertou um botão. - Está bloqueado.
-Você sabe a senha dela? - perguntou Aria, ainda filmando.
- Tente o aniversário dela - sussurrou Hanna. Ela tirou o telefone da mão de Spencer e mexeu nos botões. A tela não mudou. - O que eu faço agora?
Elas ouviram a voz de Ali antes de vê-la.
- O que vocês estão fazendo?
Spencer jogou o telefone de Ali de volta no sofá. Hanna deu um passo para trás de
forma tão abrupta que bateu a canela na mesa de centro.
Ali atravessou a porta da sala de estar pisando duro, com as sobrancelhas unidas. -Vocês estavam xeretando o meu telefone?
- Claro que não! - gritou Hanna.
- Estávamos - admitiu Emily. Aria a fuzilou com o olhar e depois se escondeu atrás
da lente da câmera.
Mas Ali não estava mais prestando atenção. A irmã mais velha de Spencer, Melissa, um
pouco mais velha que elas, já no ensino médio, apareceu de repente na cozinha da família Hastings, vinda da garagem. Ela carregava uma sacola de comida para viagem do Otto, um restaurante na vizinhança dos Hastings. Seu adorável namorado, Ian, estava com ela. Ali se endireitou. Spencer alisou o cabelo louro-escuro e arrumou a tiara.
Ian entrou na sala de estar.
- Ei, garotas.
- Oi - cumprimentou Spencer, em voz alta. - Como vai, Ian?
- Estou bem. - a rapaz sorriu para Spencer. - Bonita coroa.
- Obrigada! - Ela piscou algumas vezes, com os cílios negros.
Ali revirou os olhos.
- Seja um pouco mais óbvia - cantarolou ela por entre os dentes.
Mas era difícil não ter uma paixonite por Ian. Ele tinha cabelo louro e encaracolado,
dentes brancos e perfeitos e olhos azuis surpreendentes, e nenhuma delas podia se esquecer de um jogo de futebol recente, no qual ele trocara de camisa no intervalo e, por cinco gloriosos segundos, elas tiveram a visão de seu peito nu. Era quase uma certeza universal que tanta beleza estava sendo desperdiçada do lado de Melissa, que era uma grande puritana e agia de forma muito parecida com a sra. Hastings, a mãe de Spencer.
Ian se jogou no sofá perto de Ali.
- E então, o que vocês, meninas, estão fazendo?
- Ah, nada de mais. - Aria ajustava o foco da câmera. - Estamos fazendo um filme. - Um filme? - Ian pareceu divertir-se. - Posso participar?
- Claro - respondeu Spencer, depressa. Ela se jogou no sofá do outro lado de Ian. Ele sorriu para a câmera.
- E aí, quais são as minhas falas?
- É um talk show - explicou Spencer. Ela deu uma olhadinha para Ali, para conferir a
reação dela, mas Ali não respondeu.- Eu sou a entrevistadora.Você e Ali são meus convidados. Vou pegar você primeiro.
Ali deixou escapar um riso sarcástico e as bochechas de Spencer ficaram cor-de-rosa, no mesmo tom que sua camiseta Ralph Lauren. Ian fingiu não perceber.
- Tudo bem. Então, vamos à entrevista.
Spencer se sentou direito no sofá, cruzando suas pernas musculosas como uma apresentadora de televisão. Pegou o microfone cor-de-rosa do aparelho de karaokê de Hanna e o segurou próximo ao queixo.
- Bem-vindos ao Spencer Hastings Show. Minha primeira pergunta é...
- Pergunte quem é o professor preferido dele em Rosewood - pediu Aria.
Ali se empertigou. Seus olhos azuis faiscaram.
- Essa é uma boa pergunta para você, Aria. Você deveria perguntar a ele se quer ter
um encontro com alguma de suas professoras. Em um estacionamento vazio.
O queixo de Aria caiu. Hanna e Emily, que estavam de pé ao lado do aparador, trocaram
um olhar confuso.
- Todas as minhas professoras são horrorosas - disse Ian devagar, sem se dar conta
do que estava acontecendo.
- Ian, você pode, por favor, ajudar aqui? - Melissa fez uma barulheira de louça
batendo na cozinha.
- Só um segundo - gritou Ian de volta.
- Ian. - Melissa parecia chateada.
- Tenho uma. - Spencer colocou o cabelo atrás das orelhas. Ela estava adorando o
fato de que Ian estava prestando mais atenção nela do que em Melissa. - O que você vai ganhar de presente de formatura?
- Ian - chamou Melissa entre os dentes. Spencer deu uma olhadela para a irmã, através das portas duplas de vidro que davam para a cozinha. A luz da geladeira projetava uma sombra no rosto dela. - Eu... preciso... de... ajuda.
- Fácil - respondeu Ian, ignorando a namorada. - Quero uma aula de base jumping. - Base jumping? - perguntou Aria. - O que é isso?
- É pular de paraquedas do alto de um prédio - explicou Ian.
Enquanto Ian contou a história de Hunter Queenan, um de seus amigos que tinha
experimentado base jumping, as meninas se inclinaram para a frente com voracidade. Aria focou a câmera no maxilar de Ian, que parecia talhado em pedra. Os olhos dela passaram um momento por Ali. Ela estava sentada perto de Ian, fitando o espaço. Ali estava entediada? Era provável que ela tivesse coisas melhores para fazer - era possível que aquela mensagem de texto tivesse sido sobre seus planos com suas glamourosas amigas mais velhas.
Aria olhou de novo para o telefone de Ali, que estava na almofada do sofá, perto do braço dela. O que estava escondendo delas? No que ela estava metida?
Vocês não desejam simplesmente matá-la de vez em quando? A pergunta de Spencer dançava na mente de Aria enquanto Ian tagarelava sem parar. Lá no fundo, ela sabia que todas se sentiam da mesma forma. Seria melhor se Ali apenas... sumisse, em vez de deixá-las.
- Então, Hunter disse que foi a maior emoção da vida dele ter praticado base jumping - terminou Ian. - Melhor do que tudo na vida. Inclusive sexo.
- Ian... - advertiu Melissa.
- Isso parece inacreditável. - Spencer olhou para Ali, do outro lado de Ian. - Não é?
- É. - Ali parecia com sono, quase como se estivesse em transe. - Inacreditável.
O resto da semana foi um borrão: exames finais, planejamento de festas, mais noites passadas nas casas umas das outras e mais tensão. E, então, na noite do último dia do sétimo ano, Ali desapareceu. Simples assim. Num minuto ela estava ali, no outro... havia sumido.
A polícia passou um pente fino em Rosewood atrás de pistas. Eles interrogaram as meninas em separado, perguntando se Ali vinha agindo de forma estranha ou se alguma coisa fora do normal tinha acontecido nos últimos dias. Todas elas pensaram muito sobre isso, com muita seriedade. A noite em que ela desapareceu havia sido estranha: Ali estivera hipnotizando as meninas e depois saiu correndo do celeiro, após uma briguinha estúpida com Spencer sobre as cortinas e simplesmente... não voltara mais. Mas tinha havido outras noites estranhas? A noite em que tentaram ler as mensagens de texto de Ali, mas não por muito tempo - depois que Ian e Melissa foram embora, Ali voltara a agir de forma normal. Elas fizeram um concurso de dança e cantaram no karaokê de Hanna.As mensagens misteriosas no telefone de Ali foram esquecidas.
Depois disso, os policias perguntaram se elas achavam que alguém próximo a Ali poderia querer machucá-la. Hanna,Aria e Emily pensaram na mesma coisa: Vocês não desejam simplesmente matá-la de vez em quando?, as palavras duras de Spencer. Mas não. Ela estava brincando. Não estava?
- Ninguém queria machucar Ali - afirmou Emily, afastando aquela preocupação da cabeça.
- Claro que não - Aria também respondeu, num outro interrogatório, desviando os olhos do policial corpulento sentado perto dela no balanço da varanda.
- Eu acredito que não - disse Hanna quando foi perguntada, brincando, distraidamente, com a pulseira azul-clara que Ali havia feito para elas depois do acidente de Jenna. - Ali não era assim tão próxima de muitas pessoas. Só da gente. E nós a amávamos demais.
Claro, Spencer parecia bem brava com Ali. Mas, na verdade, lá no fundo, não estavam todas? Ali era perfeita - linda, inteligente, sexy, irresistível - e estava abandonando as amigas. Talvez elas a odiassem por causa disso. Mas aquilo não significava que alguma delas queria que Ali sumisse.
Bem, é incrível o que a gente não enxerga. Mesmo o que está bem diante dos nossos olhos.

Perfeitas- PLL 03Onde histórias criam vida. Descubra agora