Capítulo 1

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Saí apressadamente do carro e voltei á casa onde passei toda a minha infância. Subi as escadas e corri para o meu quarto, peguei na moldura e regressei ao carro onde a minha tia me esperava.

Foram duas horas até chegarmos ao aeroporto. Durante o caminho nenhuma de nós abriu a boca, acho que estávamos á espera que alguém ganhasse coragem mas isso não aconteceu.

O voo durou a noite toda e quando finalmente chegámos já era de manhã. Mal saí do avião ouvi os pássaros a cantar, por momentos senti-me em casa, junto de todas as memórias que tinha construído ao longo destes dezasseis anos.

Um barulho fez-me voltar á realidade.

Segui a minha tia pelo aeroporto, fomos buscar as malas e chamámos um táxi para que nos levasse á nossa nova casa. Quando entrei no táxi não pude deixar de reparar no cheiro a álcool e cigarros e no aspeto pouco amigável do condutor. Caucasiano, com 40 anos, cabelo escuro e oleoso, pele pouco cuidada e barba por fazer.

Fechei os olhos e dormi durante o caminho. Nada do que estava a acontecer fazia sentido, este último ano tinha mudado completamente a minha vida, e pior, tinha arrastado a minha tia para esta nova fase que iriamos viver.

- Chegámos! - disse a minha tia sorrindo pela janela do táxi.

Tentei não demostrar o meu desagrado pelo prédio decadente. Subimos as escadas até ao terceiro andar e entrámos.

Para meu espanto era um belo apartamento, havia espaço suficiente e a luz que entrava pela janela da sala iluminava toda a casa. Existia apenas uma casa de banho e uma pequena varanda que nos permitia ver uma pequena parte da nova cidade.

- O teu quarto vai ser este, podes decorá-lo como quiseres. - informou a minha tia - Vou desempacotar algumas caixas.

As nossas conversas desde o acidente não eram propriamente interessantes e duradoras. A minha tia esforçava-se para manter a distância.

Meti a moldura que trazia na mão em cima de uma prateleira e sentei-me na cama. Dei por mim a chorar, pequenas lágrimas infantis desciam pelo meu rosto.

- Meg! - gritou a minha tia da cozinha.

- Sim!

- Vamos procurar um sítio para almoçarmos.

Limpei as lágrimas do rosto, peguei na minha mala e fui até á porta do apartamento. Descemos as escadas e atravessámos a estrada. Do outro lado da rua havia um jardim, encontrava-se no auge da sua vida e verdura. Pessoas sentadas no chão desenhavam as perfumadas flores, as crianças brincavam e subiam as árvores e casais sentavam-se encostados a grandes troncos. Voltámos a passar a estrada e do outro lado da rua existia uma fileira interminável de restaurantes.

Depois de almoçarmos, dirigimo-nos á minha nova escola. Ainda faltavam três semanas para as aulas começarem, mas a minha tia insistiu em resolvermos todos os problemas que pudessem surgir com a minha transferência.

As três semanas foram passadas a desempacotar caixas, a decorar o meu novo quarto, a passear no jardim e a tentar aproximar-me da minha tia.

Naquela noite não conseguia dormir, o estranho pensamento de que iria para a escola na manhã seguinte deixou-me assustada. Nunca me tinha sentido assim, nos anos anteriores não me preocupava, sabia que os meus amigos estariam lá, mas agora era diferente, ia estar sozinha. Nem sabia se era boa a conhecer pessoas novas, nem em que turma iria ficar.

Por fim, consegui dormir.

Trimmmm! Trimmmm!

O som estridente do despertador acordou-me num sobressalto e podia garantir que a todo o prédio também. Vesti-me e mal saí do quarto vi a minha tia, pela primeira vez sorriu-me.

- Estás linda...

O comentário fê-la deixar escapar algumas lágrimas.

- Tenho medo, tia.

- Vai tudo correr bem. Os teus pais estariam orgulhosos da mulher que te estás a tornar.

Abracei-a, peguei na mala e saí do prédio. Atravessei o jardim e segui a rua dos restaurantes até ao cruzamento em que se iniciava a rua da escola. Ainda no princípio desta podia vislumbrar um amontoado de gente á entrada, apesar de ser o secundário muitos pais levavam os filhos e deixavam-nos com um beijo na esperança de que o dia corresse bem.

Não consegui passar pelo portão, tirei um cigarro da mala  e tentei ganhar coragem enquanto o fumava. Uma rapariga aproximou-se de mim.

- Olá, dás-me lume?

- Claro. - respondi tirando o isqueiro da mala.

- És nova na escola?

- Sim, mudei-me para cá há algumas semanas.

- Eu sou a Amy.

- Margareth, mas todos me chamam Meg.

- Sê bem vinda ao inferno, Meg. - disse fazendo uma vénia e sorrindo para um professor que passava.

Parecia-me ser a típica rapariga rebelde que passava mais tempo de castigo do que nas aulas.

- Vamos entrando.

 Apaguei o cigarro e segui-a.

- Se tiveres alguma dúvida podes falar comigo, estou na maior parte do tempo na direção. Agora vamos para o auditório, todos os anos temos de ouvir o mesmo discurso de como esta merda de escola é das mais prestigiadas do país. Depois dividem as turmas.


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