Caleb

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Sinto meu corpo como quando passo todo o dia na cama. Aquela sensação de dormência, leve dor e forte incômodo.

O corredor é estreito, de paredes impecavelmente brancas. As lâmpadas fluorescentes seguem pelo teto.

Não presto atenção ao rosto das pessoas a ponto de pensar quem são ou com quem se parecem. Apenas pânico. Pânico é tudo que percebo na face de todos eles que correm para a sala no fim do corredor. Apenas agora me dou conta de que também estou correndo.

Entro na sala e olho para trás para ver os últimos a também entrarem nela. Então a porta eletrônica se fecha.

Da primeira sala, vamos todos para uma outra com várias portas semelhantes à primeira, que são todas trancadas logo que me sento sobre um tipo de baú.

Um robozinho branco parecido com uma daquelas bolinhas de borracha colecionáveis, vem rolando para perto de mim. Coloco as costas de uma das mãos no chão, e ele sobe na palma dela. Com o dedo indicador da outra mão, traço caminhos que ele segue parecendo contente, se é que uma maquinazinha pode ser contente.

Na mesa à frente, um sanduíche comido pela metade e uma garrafa de coca vazia. Atrás dela, as telas que exibiam o que as câmeras viam, mostram agora apenas a estática. Ao mesmo tempo pode-se ouvir um som. São as portas se abrindo.

As portas que nos protegiam, agora todas se abriram. Todos aqueles que se escondiam ali dentro se dissiparam, procurando outro lugar para se esconderem.

Corro o mais rápido que posso em direção a uma das portas abertas. A sensação de poder estar correndo justamente para onde está o perigo, é inevitável. As risadas que podem ser ouvidas vêm de todos os cantos, pelas caixas de som espalhadas por todo aquele lugar.

Alcanço um corredor que termina em "T". Não há tempo para pensar para onde ir. Não sei o que está acontecendo. Apenas sei que é perigoso. Vou para a direita. Passo por várias portas eletrônicas abertas. Nenhum lugar parece seguro.

Há algo ou alguém logo atrás de mim. Não tenho forças para olhar o que receio que causará minha morte. O calor me consome os ossos. A palma da mão dói com minhas unhas cravadas nela enquanto aperto cada vez mais, buscando forças para continuar a corrida. As risadas ainda estão pelas caixas de som. Minha respiração está alta, ofegante. O ambiente cheira suor e perigo.

Os passos de quem me persegue finalmente me alcançam. Me permito olhar para o lado e ver que é apenas mais um cara assustado.

O tempo passa enquanto corro, procurando um bom esconderijo. Isso parece simplesmente não existir. Uma saída também seria algo bom de se achar, mas também não há uma. É como uma grande prisão sufocante. Me sinto como uma criança que se perde dos pais num supermercado, vendo fileiras intermináveis de produtos, com intensa vontade de chorar. O pânico de verificar cada rosto, procurando um conhecido, é o mesmo que sinto verificando cada porta, procurando uma que possa ser fechada.

As risadas as vezes param. As vezes voltam. Gritos de terror ecoam pelos corredores com alguma frequência enquanto corro ao lado daquele homem.

E então, por fim, uma porta com maçaneta, no fim de um dos corredores em que viramos. Corro ainda mais rápido em direção a ela. Tudo é escuridão enquanto aperto os olhos com toda a força.

Passamos pela porta, fechando-a e trancando-a. É uma sala estreita e comprida. Corro para o fundo e sento no chão, as costas contra a parede.

Novamente me sinto como uma criança que brinca de esconde-esconde. Encolhida no esconderijo, depois de correr para chegar até ele, a criança prende a respiração para evitar barulhos, e fecha os olhos, como se isso a fizesse invisível. Qualquer som pode me denunciar. Tento, aos poucos normalizar a respiração e fazê-la baixa. Olho para o cara ao meu lado. "Procura outro lugar! " É o que eu diria se fosse apenas uma brincadeira. Talvez, para alguém, seja mesmo uma brincadeira.

Horas se passaram sem nenhum som diferente das risadas e gritos. Passei todo o tempo encarando a porta. Apenas agora vi em que sala estamos. Está repleta de materiais de limpeza. O aroma chega a ser agradável. Traz aquele peso na consciência de entrar em casa com os pês sujos de barro logo depois que mamãe limpou tudo.

Pelo espaço entre a porta e o chão, duas sombras podem ser vistas. Som de passos. O Cara a meu lado tapa a própria boca para não gritar. O gosto de sangue invade minha boca enquanto mordo um pedaço da língua. Meu objetivo é o mesmo de meu colega, mas minha ação é inconsciente. A maçaneta redonda gira devagar, e a porta se movimenta um pouco. A chave balança do lado de dentro como a campainha na porta de um café.

Então toda a porta sai do lugar, arrancada com facilidade. Contra a luz que vem de fora, vejo o ser que causou tanta confusão. O corpo tem a forma de um garoto. Os pés descalços. O abdome é de aço. Um dos braços também é aço, enquanto no outro, cortes profundos permitem ver-lhe o osso. Apenas metade do rosto é de carne. Um sorriso está em sua boca. Um rio de lágrimas saí de seus olhos e também dos meus enquanto minha memória volta. Com voz metálica, o garoto pronuncia:

_Papai...





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