Cinco

O início

Nem parecia que o apocalipse tinha começado. Hoje o dia começara calmo. Deve ter sido a primeira noite onde eles conseguiram dormir descansados, ou pelo menos aquele descansados de guerra onde se tem de estar constantemente com um olho aberto e os ouvidos à escuta, mas, acima de tudo, com a mão no gatilho.

No quarto ao lado ouvia-se um choro miúdo abafado pelo pedido de silêncio da mãe. No meio de tanta guerra havia ainda estas pequenas esperanças que iam aparecendo. Era, por esperanças como estas, que muitos se aventuravam a lutar contra coisas que antes nem sequer pensavam existir, coisas que caminhavam dentro de alguns corpos e perdidos nas sombras. Outros combatiam porque tinham perdido família e já não havia mais nada a perder. Outros sem esperança vendiam corpos ao Diabo pela promessa de serem guerreiros de um novo dia e serem imortais. Havia de tudo, rebeldes e traidores, fracassos e gente sem escrúpulos.

Alail não descansava. Afinal anjos não dormem, nunca.

Ao primeiro raio de sol deslocava-se ao local onde sempre se encontrava com o seu companheiro. Eram irmãos de armas desde sempre. As campanhas em conjuntos não davam para contar já pelos dedos das mãos de ambos. Houve um ano na Rússia, outro na Alemanha, outro na Áustria, Japão, Médio Oriente. Mas, antes destas guerras todas que os homens criaram havia Sodoma e Gomorra, havia o fim de Lúcifer no Céu, havia o Purgatório. Juntos procuravam agora levar ao fim esta guerra com os demónios e devolver à Terra aquilo que Deus criou no início de tudo. Alail comandava o exército na Terra, de anjos e humanos, enquanto o seu irmão procurava Metatron e Miguel; ambos tinham desaparecido pouco tempo depois das portas do Inferno terem aberto. Metatron fugiu com o pretexto de guardar todas as palavras e escritos que tinha produzido a comando de Deus; Miguel fugiu para a Terra e tornou-se indetectável, ninguém sabia onde ele estava.

O encontro de hoje entre Alail e Aleksi era sobre o que todos queriam encontrar.

Deus antes de tudo ruir, com a ajuda de Metatron e Aleksi, criou cinco crianças com dons para poderem combater os demónios durante o Apocalipse, mas, os dons podiam ser também usados para destruir os anjos e os demónios sabiam disso. Após a sua criação, Deus apagou a memória de Aleksi sobre este momento e enviou-o de novo para a terra ficando, assim, Metatron a ser o único, além de Deus, sobre a localização destas crianças. Porém, Aleksi, com a ajuda de outro anjo conseguiu reconstruir o seu diário durante a última estadia e as últimas visitas à Terra e conseguiu localizar uma criança, mas, nem tudo fora simples. A criança tinha estado no Inferno após um pacto que o pai realizara com um demónio onde, em troca de sucesso na sua vida trocaria o seu primogénito sem saber. Esta criança tinha sido a última missão de Alail e Aleksi juntos. Eles entraram no Purgatório e, com a ajuda de um demónio que hoje luta ao seu lado, resgataram a criança do Inferno. A criança é mantida segura num mosteiro que ainda sobrevive numa zona remota da Rússia onde Aleksi viveu alguns anos com a sua irmã Nadezhda e que hoje protege e criança juntamente com Nicolae, o demónio.

Aleksi trazia novidades, a criança resgatada, hoje com 21 anos estava preparada para se juntar ao exército bem como Aleksi e Nicolae. Iriam parar de procurar por Metatron por uns tempos e iam coordenar ataques a alguns sítios fulcrais para capturarem dois generais de Lúcifer e, eram aqui, após a captura destes demónios que a criança iria entrar. Durante a estadia dela no Inferno, Nicolae ensinara-lhe tudo o que havia para saber sobre tortura, como torturar pessoas, anjos e demónios. Em pouco tempo a criança subira na hierarquia do Inferno e era já um dos melhores. O que Lúcifer não esperava era a revolta de Nicolae contra ele, após o primeiro ter mandado Nicolae para o Purgatório até ao fim dos seus dias.

Amanhã era dia de reunião.

Aleksi iria trazer Nicolae e a criança para se juntarem ao exército, mas era importante permanecer segredo a existência desta criança entre eles, pois isto só iria fazer com que o alvo, que hoje em dia todos carregavam às costas, se tornasse maior.