Prólogo

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Eu nunca parei para pensar qual era o ponto central, aquele que você se dá conta que aquela pessoa não é a certa para você

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Eu nunca parei para pensar qual era o ponto central, aquele que você se dá conta que aquela pessoa não é a certa para você. Eu nunca pensei nisso porque eu tinha medo de chegar em alguma conclusão que não me agradava. Entretanto, agora eu percebia que muitos pontos centrais apareceram como sinal de que aquilo não era certo, mas eu ignorei todos.

O ponto central que me fez acordar finalmente para realidade? Eu acho que foi quando me vi sentada naquela sala de interrogatório tomando toda a culpa para mim, algo que eu tinha certeza de que ele não faria por mim em hipótese alguma.

Aquele dia foi o ápice, eu estava em total completo estado de choque pelo que tinha acabado de acontecer, não conseguia focar minha atenção em nada, tinha uma leve certeza de que o policial me fazia perguntas, mas sua voz parecia longe, no meu ouvido só tinha zumbidos, até mesmo o barulho das lâmpadas no teto rangendo estavam me incomodando.

Atrás do policial que me interrogava tinha uma parede de vidro escura e lá eu podia ver meu reflexo deplorável. Havia um curativo próximo do meu cabelo, outro na minha sobrancelha esquerda, minha pele tinha resquícios de sangue seco e algumas partes logo mais ficariam roxas, eu não sentia nenhuma dor, mas a agonia que eu sentia dentro do meu peito podia-se dizer que era muito pior.

Mesmo que eu tivesse em condições de falar alguma coisa, eu não saberia o que dizer, eu não lembrava muito o que tinha acontecido, eu só me lembro de gritar por socorro, completamente desesperada, tinha sangue nas minhas mãos, mas não sabia de quem era. Ele não estava por perto, ouvi barulho de motor e de pneu cantando e eu estava sozinha quando sons de sirene se aproximaram.

Eu já tinha sido fichada antes, e por conta disso minha situação piorou, mais tarde naquela mesma noite, eu descobri que não estava sozinha quando a polícia chegou, tinha mais alguém, um homem, mas ele não estava vivo e o sangue nas minhas mãos e roupas eram dele. Provavelmente.

Tudo que aconteceu depois daquela noite não passa de borrão na minha mente, há flashes de Alex — meu pai — chegando completamente transtornado na delegacia, ele iria gritar comigo como sempre fazia, mas desistiu quando viu meu estado, sei que ele deu seu jeito para que me soltassem, embora eu achasse que não merecesse, mas pessoas influentes conseguiam tudo que queriam nesse mundo e ele não seria diferente.

No carro, eu sentia o clima desconfortável e o quanto ele queria gritar comigo, jogar na minha cara que eu era uma merda problemática como ele nunca perdia a chance de fazer, mas ele ficou em silêncio o caminho todo e eu agradecia mentalmente por isso, não estava com saco para lidar com mais alguma coisa naquela noite.

Quando chegamos em casa, abraçando meu próprio corpo e apertando casaco que a polícia colocara nos meus ombros, subi direto para o meu quarto, sentei-me na beirada da cama e respirei fundo, a garganta doendo ao tentar evitar que as lágrimas rolassem.

Ele não hesitou por um momento se quer ao meu deixar lá e fugir sozinho para se safar. E aquilo foi o sinal que eu precisava para finalmente acordar para a vida.

Meu pai entrou no quarto de maneira receosa quando me viu sentada imóvel, suspirou então falou:

— Tayla... — eu não o olhei, meus olhos estavam fixos na escrivaninha no canto do quarto. — Um inquérito foi aberto para investigar a morte daquele homem.

Finalmente ergui a cabeça para encará-lo.

— Não acredita que eu tenha feito aquilo, não é? — ele balançou a cabeça, as mãos dentro da calça social e o rosto sem expressão alguma.

Era assustador o fato de sermos praticamente idênticos, os cabelos pretos e lisos, os olhos azuis como uma pedra Turquesa, eu não tinha nada da minha mãe e as vezes ficava frustrada com isso, mas ele dizia que muitas coisas em mim o lembravam dela e isso costumava me tranquilizar ao menos um pouco.

— Nem eu e nem os investigadores, mas eles acham que você sabe de alguma coisa, em dois meses podem encerrar de vez e aí então você está livre. — franzi o cenho confusa.

— Livre?

Ele soltou outro suspiro. Olhou em volta procurando uma maneira de dizer aquilo então se voltou para mim.

— Eu andei conversando com um amigo em Portland e ele concordou comigo quando eu dei a ideia de você passar um tempo lá.

Soltei uma risada soprada e sem humor.

— Uau, planejando as coisas pelas minhas costas, típico, Alex. — respondi com cinismo, ele ao menos esboçando alguma reação com a maneira na qual o chamei, já faz alguns anos que não o chamo mais de pai e ele parecia já ter superado isso.

— Você é uma grande conhecida da delegacia, sempre causando problemas, tanto eu quanto eles estamos cansados disso, Tayla. E graças ao acordo que eu fiz, você não será indiciada como cúmplice, então seria de grande valia que parasse de sarcasmo e levasse as coisas a sério, pois a próxima vez eu não serei capaz de te livrar. — seu tom sério foi o bastante para que a expressão que havia em meu rosto vacilasse. Engoli em seco.

— Que acordo foi esse?

— Quando o inquérito for concluído, você vai sair da cidade, para bem longe daqui, e principalmente longe daquele delinquente, foi ele que te colocou nessa situação. — abaixei a cabeça sem saber o que dizer, até porque ele tinha razão. — Eu cuidei de tudo 'pra você, pode ficar no apartamento de Emma. Eu lembro que vocês eram grandes amigas antigamente, ela pode te ajudar a se habituar.

Emma. Fazia muitos anos que eu tinha ouvido aquele nome, era verdade que éramos grandes amigas... quando tínhamos uns doze anos, quando eu me mudei perdemos completamente o contato e agora teríamos que agir como se nada tivesse mudado, Alex só podia estar de brincadeira.

— Claro que pode... — murmurei, torcendo para ele não perceber o sarcasmo, ela sempre foi a boazinha, a alegre, a obediente, eu sempre era a irresponsável, antissocial e acima de tudo, que sempre arrumava problema, não que tenha mudado alguma coisa. Uma coisa sim não mudara, a esperança do meu pai em Emma me "concertar" de alguma maneira.

Ele podia sonhar.

— Eu pensei que talvez você também quisesse voltar a estudar, a universidade de lá é ótima e vai ser bom para você se distrair com algo de útil. — rolei os olhos.

— Parece mais um plano de tentar me colocar no caminho "certo", do que preocupação se eu vou ser presa ou não. — murmurei azeda. Ele suspirou cansado, talvez frustrado por não conseguir me controlar como adorava fazer com tudo a sua volta.

— Veja isso como um recomeço, uma chance de fazer tudo certo dessa vez. Saiba que se causar problema lá também, eu não estarei por perto para te ajudar. — abri a boca para rebater, dizer que não precisava de sua ajuda, mas me calei, preferi evitar mais uma discussão desnecessária, onde ele jogaria na minha cara todas as vezes que me ajudou sem ao menos eu ter pedido, apenas porque odiaria que a mídia soubesse que a filha de um advogado tão renomado como ele estava envolvida com coisas ilegais. — E mais uma coisa.

Arqueei as sobrancelhas.

— Se for pega correndo, você vai voltar para cá e responder aqui e eu não terei nada a fazer contra isso. Você vai presa, Tayla.

E foi assim que parei na área de embarque do aeroporto, Alex fez questão de me acompanhar para garantir que eu não fosse fugir, mas eu estava decidida a primeira vez fazer o que ele aconselhou. Com o processo correndo, tive muito tempo para pensar e percebi que aquela viagem poderia ser benéfica.

Não porque eu precisava de uma nova vida, mas porque eu sabia que com o encerramento do inquérito, e o meu depoimento sendo uma das mais importantes para isso, ele viria atrás de mim, exigindo uma explicação do porquê o trai. Ele não vai ser preso, ele sempre se livrava de alguma maneira, então eu tinha que sair dali antes que ele me achasse e não havia solução melhor do que cruzar o país.

Bem longe de casa, bem longe de tudo ferrado que eu já fiz na minha vida e principalmente, longe de Bryan. 

Bad Decisions - Série Mitchell | Livro 01Onde histórias criam vida. Descubra agora