Era um sábado chuvoso, por volta das 01h40min da noite quando João Pedro bateu na porta. Ele carregava consigo numa mão uma garrafa de vodka, já pela metade, e na outra o cigarro já apagado pelas gotas da chuva. A mochila nas costas com as poucas roupas que carregara quando foi embora. Não esperava ser atendido. Pelo contrario, acreditava que seria ignorado, não somente pelo horário, mas também pela lembrança da última vez que tivera na casa.
Saiu ele de casa brigado com a mãe, jogando palavras tão duras contra a mesma. Brigou por inveja a vida alheia, brigou por maldade, querendo afetar a única pessoa que lhe estendia a mão e que do pouco que tinha lhe oferecia o mundo.
- Pedrinho? - Perguntou uma senhora negra ao abrir a porta.
João Pedro olhou para mulher, o tempo havia passado e ela também. A mulher havia envelhecido, talvez pelo tempo, talvez pelo desgosto que terá ao perder um filho? Quem saberia dizer...
João lembrou-se da última vez que havia visto a mãe, uma mulher guerreira, que apesar de ser pobre sempre cuidou com garras de seus três meninos a quem amou com todas as suas forças. Lembrou-se também de todo o trabalho que ela havia passado para cuidar de sua criação e de seus irmãos. Lembrou-se da força daquela mulher que todos os dias batalhava pelo pão de cada dia, fazendo dupla jornada, limpando a merda de sinhá e de toda aquela gente que sempre se importou com o dinheiro e que nunca fez nada pela sua gente. Lembrou-se de sua luta para afastar os filhos do tráfico. Lembrou-se da sua felicidade em viver e do orgulho que sentiu ao gastar metade de um salário inteiro nos estudos do filho mais novo. Dizia ela contente e aos sete ventos para o bairro todo ouvir: - Meu filho vai ser doutor!
Tanto tempo se passou né? Dez anos... E a pergunta que se vinha à cabeça de João Pedro era: Valeu a pena abandonar a mãe? Assim... Do dia pra noite, sem ligar ao menos nos natais ou quando ela adoeceu? Valeu a pena abandona-la pra ser um burguês de merda? O que foi que recebeu de volta? Terno e gravata? Dinheiro? Mulheres? Viver em volta dos playboys na zona norte? Viveu feliz? A consciência estava tranquila?
- Me desculpa, mãe. - Abraçou-a tão forte e carinhosamente. Pedia desculpa, não só da boca pra fora, pedia perdão pelo abandono, pelas infelizes palavras e pelo desgosto que lhe dera.
- Ô, meu filho... - Dona Maria falava tão serenamente... Havia ficado tanto tempo o seu menino mais moço, sem poder acolhê-lo e ama-lo. A saudade era tanta... - Não precisa pedir desculpa não, eu tô aqui.
- Eu sinto tanto, mãe, por tudo...
A mulher tocou o rosto do filho, enxugando as lágrimas com a palma de sua mão. - Eu já não disse que tô aqui? Não precisa chorar, não, meu filho. Eu te perdoo, a vida é muito longa pra gente carregar culpa, menino. - E ela dispôs para o filho o seu sorriso, tão contente de vê-lo. - Agora entre, tá chovendo e cê pode pegar um resfriado. - Falou maternal e nostálgica.
João Pedro sorriu.
O tempo até podia ter passado, ter a maltratado e mesmo assim ela não desistia de ser a sua mãe.
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Vários clichês e um cotidiano
RomantikO afeto me afetou, hoje acordei com vontade de escrever sobre amor, acordei com vontade de viver um amor. Olho para o lado, tantas histórias, tantos namorados e no fim onde estou? Me olho nos espelhos vejo meu reflexo e cadê você? Que já amei outro...