Do Livro 1
Antes que continue, digamos os motivos que me faz debruçar sobre as folhas, para que possa estar ciente, leitor pontilhoso, de quais minhas aspirações para o livro. Desta forma poderás ao fim deste julgar se fiz um bom trabalho e dar a recompensa que mereço. Exploremos a causa destas páginas que tem em mãos para livrar-se do tédio de tua própria companhia.
Este livro não deve se tornar moda entre os adolescentes estúpidos que vejo na rua, não deve também estar nas mãos dos grandes homens PhDs que rondam a universidade de Coimbra.
Para que serve o livro então? Creio que o livro serve mais ao autor do que ao leitor, diferente dos demais, este livro nasceu para ser escrito e não lido. Lembra-te disto quando odiares algo nestas páginas, aliás, acho difícil que tenha gostado de alguma das palavras que leu até aqui.
A priori escrevo por tédio. Tenho lá meus 62 anos e resta-me alguma consciência e tempo antes que os saprófitos me tenham por alimento; resta-me consciência, porém a vida esqueceu de deixar-me instruções sobre o que fazer com ela, então resolvi utilizá-la para algo nobre, algo grande, contudo não encontrei e me pus a escrever estas páginas.
A posteriori escrevo por saudades. Fico a toa em minhas terras, observo o horizonte bucólico, nele encontro montanhas e lembranças do vigor que um dia tive para escalá-las, lembro dos tempos de faculdade, lembro dos velhos amores, lembro de Simone, lembro-me e com medo de esquecer decidi eternizar estas memória nestes papeis. Malditos papéis! Os deuses não se apiedaram de vós e agora carregará minha dor pela eternidade e anunciaras a todos os povos o caminho do fracasso.
Tentei escrever de acordo com as características de um Arcadismo, porém sinto que tentando achegar-me a este fui puxado por certas doses de um certo Barroco, re-analisando a obra, porém, sinto não ter deveras nenhuma filosofia ou escola literária aqui contida, não passando de pura especulação tudo que leres, concluímos portanto que estais diante de um livro estéril.
Permita-me, antes de continuar anunciar-vos um fato: talvez as memórias não sejam acabadas, posso expirar antes e caso o faça não me guarde rancor, antes ergas as mãos aos céus e agradeça o amor que tens recebido. Caso a obra seja terminada tome o que aqui lerás como os passos que não deves seguir para ser feliz, há aqui todos os ingredientes para uma vida pataca e enfadonha e desgraçada.
Direi algo com autoridade de ancião, tão sério é esta cousa que deixei-lhe em um capítulo a parte, o posterior. Esta filosofia veio-me em uma tarde, antes de se por o Sol veio-me sussurrar algumas palavras. Ainda entenderás tudo isto, leitor confuso, apenas siga as páginas e a filosofia do blues.
A filosofia do Blues 2
Eis minha filosofia.
Morrerei. Isto é tudo que sei, o resto escolho. Como uma improvisação de blues: a música acabará e isto é um fato, porém as notas que serão tocadas entre seu intróito e seu cabo sois vós quem escolhe, meus cavalheiros. Quer dó? Pois vá tocar um dó, mas lembra-te que estás a rejeitar o ré e o mi e o fá deixou de ser escolhido. Caso opte pelo lá estarás largando as demais, tais qual um si, por exemplo.
Observe também que podes pensar em usar o si e utilizar o sol, neste caso o si passa a ser mera especulação e jamais se tornará verdade, não passando de uma possibilidade deixada de canto. Também há casos em que optas por tocar uma mesma sequência de notas por três ou quatro vezes e neste caso pode estar perdendo um precioso tempo antes que a música acabe. Não esqueçamos, contudo das escolhas fora da escala, que pode estragar a música, podes muito bem fugir do tempo e de semelhante forma torná-la desgostosa.
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Agonia
Romance"Eis minha filosofia. Morrerei. Isto é tudo que sei, o resto escolho. Como uma improvisação de blues: a música acabará e isto é um fato, porém as notas que serão tocadas entre seu intróito e seu cabo sois vós quem escolhe, meus cavalheiros. Quer dó...