Pré-História - A Jovem e o Caçador

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O tempo estava frio e inóspito, como sempre estava durante aquela época.

O jovem hominídeo havia saído para caçar.

Numa das mãos, levava uma pedra, toscamente lascada, que usava como arma. Havia usado tantas vezes a mesma ferramenta que o sangue de suas vítimas anteriores já modificara a cor da pedra, deixando-a com uma cor marrom-avermelhada.

Há tempos não conseguia uma boa caça para a família. O pai, exímio caçador, havia sido vitimado por um tigre-dentes-de-sabre á poucos meses, fazendo com que a responsabilidade de alimentar os demais recaísse sobre o primogênito do clã.

A progenitora havia feito questão de rogar aos espíritos da floresta que vigiassem pelo jovem caçador, antes que ele saísse á procura de comida, desenhando na parede das cavernas a pequena família composta de mãe, filho e duas crianças, rodeadas pela proteção do Espírito Touro.

A roupa, feita de pele de urso, não era o suficiente para evitar que o frio castigasse os braços do caçador. Ele estremecia, com os olhos apertados, tentando enxergar em meio ao vento cortante. Contanto que conseguisse um coelho ou um esquilo, poderia adiar em mais alguns dias a fome de sua família.

Tinha esperanças de achar algo maior... talvez um pequeno mamute, ou, quem sabe, um filhote de megatério. Aquilo era uma esperança boba, mas podia ser viável, contanto que ele se aproximasse dos rebanhos que se afastavam cada vez mais do vale.

Enquanto vigiava por entre as folhagens de araucárias, visualizou algo que o surpreendeu.

Havia uma pequena aldeia em meio ás árvores, composta por duas pequenas cabanas feitas de couro, com presas de mamute fincadas nas entradas.

Ele já vira o falecido pai lhes desenhar sobre estas aldeias. Eram de hominídeos muito diferentes deles. Mais adaptados á vida em meio aos perigos do vale. Porém, nem um pouco amistosos aos que viviam em cavernas.

O rapaz parou, tentando tomar numa decisão. Podia saquear a aldeia, levando a comida que encontrasse – e talvez alguns dos moradores sobreviventes – para casa. Poderia alimentar sua família sem esforço e, de quebra, levar alguns daqueles hominídeos estranhos para servi-los.

Antes que finalmente se decidisse, porém, viu uma movimentação atrás dele.

Ele se virou, erguendo a pedra em posição de ataque, praguejando.

Mas o braço caiu ao lado do corpo assim que ele descobriu o que estava ali.

A primeira impressão dele foi deduzir que nunca havia visto nada como a jovem que o encarava.

A garota não lembrava em nada a sua espécie. Em seu clã, todas as mulheres eram troncudas e rústicas, preparadas para a vida nas cavernas e para a procriação.

Mas a jovem fêmea que ele encontrara tinha um corpo muito mais franzido, com várias curvas que, para um rapaz acostumado á fêmeas atarracadas, estranhavam á primeira vista.

Ela usava roupas muito mais leves e abertas do que as do seu clã, e tinha uma tez mais escura comparada á dele. Pernas torneadas, mas nem um pouco resistentes, e olhos escuros, da cor da madeira, saltados de medo, fitavam os seus.

Para a jovem, também era um choque conhecer um dos hominídeos que sua família representava de modo tão ameaçador, como se fossem mamutes furiosos.

Ela estranhou a fisionomia do jovem macho, que era quase pálido em comparação com a cor de sua pele. Tinha pelos incomuns, da cor das labaredas de uma fogueira, que caíam ao redor de sua cabeça, completamente diferentes dos pelos escuros de seu clã. Os olhos eram bizarramente claros, tão claros quanto a água das nascentes do vale.

Romione - Quando o Amor Ultrapassa os Tempos - HIATUSOnde histórias criam vida. Descubra agora