Cidade de Baleias

13 1 0
                                    

  Agora me pergunto, se a formigas pudessem pensar como seres humanos, o que elas pensariam de nós?
O que sinto por dentro e por fora é um sentimento de vazio, um completo vazio, como se minha vida não significasse absolutamente nada.
Nunca achei que fosse possível uma pessoa se sentir tão pequena de maneira tão agressiva.
Penso sobre meus valores, mágoas, arrependimentos e regras que segui minha vida inteira. Lixo (???). Perdi a noção de tudo.
Harenvard 5, nossa nave espacial, estava em direção a Plutão, onde instalariamos o telescópio Hórus. Eu era o engenheiro principal, Edward, um rapaz robusto de cabelos negros, era o capitão, e Matias era o astrofísico. Nono primeiro dia de viagem. Por volta de algumas horas, estaríamos chegando em nosso destino.
A noventa dias atrás, a imensidão do espaço me fascinava de uma maneira impressionante. Algumas vezes, dava vontade de chorar, só de ver o quão perfeito e maravilhoso é o nosso universo, pelo menos parte dele. Sensações que não podem ser descritas com palavras, sentimentos mágicos...
- O espaço é lindo, vocês não acham? - Era o que Matias sempre dizia.
É e claro, eu e Edward sempre concordavamos - realmente, maravilhoso...
Com o tempo, a imensidão do espaço ficava cada vez mais ameaçadora, a saudade de casa aumentava cada vez mais. Meus filhos, minha mulher... Os comentários sobre a beleza da Via Láctea eram bem poucos. Matias, que sempre se expressava ao olhar pelas janelas, agora apenas as observava, sem emitir nenhum comentário. Quando não estava preparando relatórios ou revisando a nave, Edward evitava olhar para fora de nosso veículo, ele se deitava, e ficava encarando o teto da nave. Já eu, em tentativas de reprimir a saudade, brincava com a gravidade, deixando fotos da minha família flutuando em volta do meu rosto.
- A pintura que a iluminação de astros mortos forma na tela sem fundo e infinita do nosso universo é fantástica - disse Matias, depois de alguns dias.
Apesar de toda a depressão, tive que concordar - É mesmo... - de fato, realmente fantástico.
- A maioria desses planetas que vemos daqui, já estão mortos, a luz deve ter levado anos para nos alcançar. E pra que? Só para serem observadas...
- Sim...
- E os outros milhares de pontos espalhados por todo o universo? Eventos raros acontecendo, pinturas magníficas espalhadas por aí, prontas para serem adoradas... Mas ninguém para aprecia-las...
- Ninguém?
- Ninguém....
É incrível como o homem, mesmo sabendo de sua insignificância, ainda tenta se colocar como protagonista nesse filme tão longo... chamado Universo.
- Eu sei que sou o capitão, e não deveria falar isso, mas começo a ter crises... Quero voltar para para a terra, mesmo sabendo que já estamos com mais da metade da missão feita... - disse Edward - não adianta, são mais setenta dias de viagem para voltarmos... Não seria do dia pra noite. Qualquer escolha dá no mesmo resultado... sofrimento...
Ninguém tinha o que responder. Triste era saber que eu e Matias também já havíamos fantasiado sobre aquilo e... Todos concordavam.
Eu já podia ver Cerberos e Nix, alguns dos satélites de Plutão, estávamos perto... Foi nesse momento que eu, de alguma maneira, perdi meus pontos de sanidade e comecei a lutar contra um devaneio terrível. Todas as luas começaram a se tornar baleias, cada vez mais baleias apareciam e a cada nova, o tamanho delas aumentavam. Não sei porque relacionei dessa maneira, mas foi o que senti.
O tempo já não passava rápido, quando estive vivendo esse momento de terror, parecia que o tempo, de fato, não passava. As baleias viajavam tão lentamente em nossa volta, em um nado sincronizado tão fantástico que eu não conseguia nem sentir desespero enquanto as assistia. A perspectiva só ficava mais tensa, e em poucos segundos, vi que a Harenvard já era menor do que o olho de uma das grandiosas baleias. De repente, Plutão já estava a mais vinte anos-luz de nós, e as baleias já não podiam ser contadas. Se eu parasse para contabilizar quantas tinham ali, eu morreria antes de contar um terço. Me senti como uma formiga carregando uma semente, tentando atravessar uma família de elefantes.
Quando acordei, percebi que tinha adormecido por apenas dois minutos...

Mas é como dizem, os pequenos momentos são os que mais marcam as nossas vidas...


Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Oct 24, 2015 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

 Cidade de BaleiasOnde histórias criam vida. Descubra agora