Não havia ninguém na cidade. Ela estava morta.
Não tinha nenhum ser humano, nenhum animal; não se ouvia nenhum carro, nenhuma buzina; nada. Absolutamente nada. Nem os pássaros cantavam. Esses sabiamente tinham previsto o que aconteceria, e não precisaram de máquinas e nem de avançados computadores. Os animais usavam o instinto. As máquinas e computadores no fim não serviram de nada, a não ser para alertar o fim a todos. Contudo, ao final, todos teriam desaparecido, homens e animais. Não tinha para onde fugir.
Uns morreriam na hora, como era o caso do velho na varanda. Outros levariam horas, outros dias, e talvez, outros meses ou anos. No entanto, mais cedo ou mais tarde, todos se juntariam a ele. O fim um dia chega, e não há nada que se possa fazer. Terry sabia disso, e por essa razão era o único homem em um raio de milhas.
Pelo menos era velho. Tinha setenta e três, e sua hora não tardaria a chegar. Já via a luz no fim do túnel da vida há alguns anos, contudo estava relutante em alcançá-la, mas agora não. Agora a encarava de frente.
Terry se encontrava na varanda de seu apartamento em Miami, onde morara por anos. Muitos anos, aliás. Estava sentado em sua poltrona preferida, que com muito esforço tinha arrastado para a área externa. De lá do alto (quarto andar) via a orla da praia, que há anos ficara cheia de gente, e que nos dias ensolarados eram de uma animação sem palavras. Todos pareciam felizes e jovens. Até os velho como ele, que caminhavam por ali de vez em quando. Agora tudo estava silencioso, um vento fresco vinha do leste e deixava o mar levemente agitado. O mar que o mataria.
Os carros estavam largados na rua, sem nenhuma utilidade aparente, como uma cena de filme de catástrofe. Terry achou graça desse pensamento irônico. Era exatamente onde estava, em uma cena de catástrofe, a única diferença era que Terry não era um ator ou diretor.
Aconteceria a qualquer momento, aliás, já poderia estar acontecendo. Já devia estar acontecendo, pensou sem real preocupação.
O céu estava claro no fim de tarde, e as nuvens finas como seda tinham a coloração alaranjada que Terry tanto gostava. Parecia que o céu era uma tela, e que as nuvens eram uma pincelada descuidada de um artista qualquer.
Todos tinham ido embora há mais de dois dias, e o velho continuou onde estava, não movendo um músculo se quer. Era viúvo e morava sozinho, porém seus filhos insistiram para ele os acompanhar para um dos inúteis abrigos nas montanhas. Ele recusou veemente, e de qualquer forma não haveria vaga em um lugar assim para um velho como ele. Esses lugares eram destinados aos jovens cheios de vida, que poderiam reconstruir tudo depois dos anos de escuridão. No seu íntimo, Terry achava que ninguém sobreviveria. Achava que se matariam de algum modo nos anos que viriam. Mas receava que essa fosse uma opinião ultrapassada, opinião de gente velha. Ás vezes tinha que se confiar nos jovens e no que eles diziam. Mas de qualquer maneira, não sobreviveria para saber se sua opinião era a certa.
Os cientistas da NASA podiam calcular o momento exato do impacto, e onde seria, mas não podiam fazer nada para impedir a colisão. Uma pena, pensou Terry.
O impacto seria a alguns quilômetros de seu apartamento, no meio do mar, próximo à praia de Miami. Terry veria tudo de camarote, era como gostava de encarar a situação.
Honestamente não se preocupava com o fim da humanidade (mesmo não sendo assim de forma oficial), ou o fim do mundo conhecido. Sentia-se um pouco mal por isso, pois parecia a si mesmo que não tinha coração ou algo do tipo.
Na verdade, Terry não se preocupava com nada. Morreria e sabia disso. E morreria dentro em pouco. Sentiu um pouco de pesar por seus filhos. Não porque fossem morrer, pois eles estavam nos abrigos, e de uma forma ou de outra, se manteriam vivos por um tempo, e isso era um conforto para o velho sentado na varanda. Mas sentiu um peso no estômago ao imaginar que não os veria mais, a não ser na vida após a morte, e isso não era tão encorajador quanto ele esperava que fosse.
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O Velho Sentado na Varanda
Science FictionO mundo vai acabar! E ao invés de fugir, Terry prefere ficar em sua varanda, tendo seus últimos pensamentos conscientes antes que o meteoro destrua o mundo e sua vida.