Ele estava sentado em sua biblioteca. O lugar com pouca luz dispunha apenas de algumas velas que faziam o trabalho de ajuda-lo a analisar cada documento. Cada obra escrita em um passado além da compreensão de qualquer um que ele conhecerá desde sua queda. Á milhares. Não. Milhões de anos atrás.
Eram documentos e táticas de guerras guardadas em sua mente. Coisas que ele reproduziu em cada um desses livros. Estudos que fez junto aquele que ele aprendeu a chamar de irmão. Táticas e mais táticas. Fraquezas dos inimigos postas em papel para ser usado em uma chacina que nem fazia parte de sua existência. Não antes.
Agora era parte dele. Era parte dele por que englobava sua esposa. Era parte dele por que ameaçava suas filhas.
Ao pensar nisso ouviu um barulho de passos. Pequenos pés que se moviam vagarosamente pelas tabuas do chão encerado. Junto com os passinhos um arrastar, leve. Em meio a escuridão que ali tomava como sua aquela sala, ele viu os pequenos olhinhos. Meio fechados pelo sono.
A pequena garotinha tinha apenas cinco aninhos. Segurava em suas mãos um ursinho de pelúcia. Mas seus olhos condenavam aquele que ali estava, mesmo que cansados.
- Papai!
Disse ela.
Ele virou sua cadeira calmamente. Nunca fora considerado um anjo paciente. Mas ela mudará tudo.
- Oi minha pequena.
- Voxe não vai dormir?
Seu coração ainda derretia ao ouvi-la falar com aquela voz de criança que ainda não aprendera bem a articular todas as palavras.
Ele a pegou e sento-a em seu colo. Ela era tão pequena. Seus cachinhos loiros caiam fartos sobre seus ombros e seus olhinhos esmeraldas davam a ela um ar inocente. Vestida em seu pijama era frágil e mesmo junto a seu peito ela parecia tão pequena.
- Vou em breve pequena. Tenho muito trabalho.
- Voxe trabalha de mais papai.
- Por que preciso te proteger nariz de batatinha.
Ao dizer isso ele fez cocegas em seu pescocinho que se contraiu. Sua risadinha era uma sinfonia de pássaros, que o faziam amolecer. Ela a amava mais do que um dia amou a si mesmo.
- Mas você esta certa pequena. Por que não vamos até a cozinha fazer um chá de rosas negras para você e um café pra mim. Afinal lindas menininhas precisam dormir.
Ela sorriu. Sempre se sentia única no colo do pai e ele sempre se sentia único ao estar com ela.**************
A área de guerra estava tomada. Na fronteira Titânia a Rainha das Fadas sentava-se em seu trono de mármore. Usava uma armadura feita de cristal e pedras preciosas. Ela era a guerreira. Sua pele se destacava branca como marfim, seus cabelos de mechas coloridas com todas as cores já imaginadas e outras que ela mesma imaginou desciam livras sobre os ombros, linda e perfeita ela levava sobre a sua cabeça a coroa do Sonhar, o mundo das fadas.
Em sua frente estava a Tirana dos Pesadelos. Uma criatura cruel. Usando um vestido de seda rasgado em vários lugares. Sentada de modo vulgar sobre seu trono de ossos ela deixava aparecerem seus seios murchos sobre os vários buracos naquilo que vestia. Seus cabelos brancos e crespos eram como teias de aranha que caiam desgrenhados por toda parte. Ela era o oposto a linda rainha das fadas. Ela era seu lado ruim, seus pesadelos. Que a própria rainha do sonhar banira para outro reino o Reino dos Pesadelos.
Entre elas, havia um tabuleiro, por ele elas controlavam seus exércitos. Havia uma guerra entre elas. Sempre houve. Mas agora era um momento de decisão.***************
Ele estava ali. Era mais uma vez um general. Achava que agora que estava com a sua esposa, suas filhas, nunca mais teria que lutar. Mas estava errado.
Deixou sua pequena em casa protegida com o único guarda de sua confiança e agora estava ali pronto para a batalha. Samael era um anjo caído que nunca temeu a luta.
Então as trombetas soaram. A luta estava para começar. Oberon o rei das fadas atacou primeiro. Comandando a cavalaria de dragões rumava contra as bestas malditas criadas pela Tirana dos pesadelos. Seres indescritíveis que atacavam sem piedade ou consciência tudo em seu caminho.
Os dragões cuspiam fogo, as peles queimavam e o cheiro de carne podre, assada ao sol subia deixando nauseado qualquer um que estava perto.
Na linha de frente Samael corria com sua espada em riste. Cabeças, braços e vísceras eram lançados para todos os lados enquanto ele avançava ao lado de seu irmão e outros cavaleiros lendários. Nenhum monstro ficava de pé. Nenhum mostro deveria sobreviver.
Nas lutas corpo a corpo estava uma de suas filhas mais velhas. Uma criação da Princesa de Marfim no inicio de seus poderes. Ele a adotara como filha. Elizabete era meio humana e meio cão. Atacava com força bruta, em socos e chutes. Um soco seu poderia rachar uma montanha. Sorte que Samael a ensinara a lutar. Ela era líder dos lutadores e seu poder de ataque era impressionante.
Em retaguarda a própria Princesa de Marfim atacava junto com sua filha mais velha portando um arco longo. Ambas usavam a fraqueza das fadas a seu favor. Ferro. Todas as criaturas feéricas são vulneráveis a ferro. Então elas atiravam junto com os elfos, milhares e milhares de flechas feitas de puro ferro.
Por fim na área magica ficava suporte ficava sua filha do meio. Suas magias poderosas alteravam o campo de batalha causando dilúvios e terremotos. Ela tinha um poder estupendo fazendo dela uma das maiores armas do lado do Sonhar.
Mas mesmo assim, Samael não se sentia em paz. Matavam mas seu coração, sua cabeça estava em sua pequena que ficara em casa com o guardião de sua confiança. Ainda sim temia.************
Sérvio, sempre fora fiel a Titânia e um poderoso guardião da Princesa de Marfim. Eram amigos desde pequenos e nunca a decepcionara.
Enquanto corria pelo jardim se divertia com aquela pequena que corria de um lado a outro, fazendo-o cansar. Ela era elétrica e meiga. Isso o satisfazia. Muito mais do que lutar. Que claro era algo que fazia bem.
Sérvio era um invocador de arcanas. Trazia para suas batalhas criaturas baseadas em seu baralho de tarot. O qual ele sempre trazia consigo. Às vezes ele o utilizava para ver o futuro, porém o futuro é sempre incerto.
- Vem tio Sérvio, vem me pegar.
Ela chamava-o e ele sempre sorria com isso.
Mas algo o perturbou. Ele podia sentir uma sombra. Algo que mudava o ambiente. Ele não conseguia saber o que é. Ela continuava a correr.
A pequena escondia-se de seu guardião, querendo apenas se divertir. Foi então que em meio as arvores ela viu um rosto conhecido. Em meio as flores ela via o rosto de seu pai. Mas o corpo estava encoberto pelas sombras.
- Papai voxe voltou.
Feliz ela começou a correr em direção a figura, mas algo segurou seu pequeno vestido. Seth. O filhote de cachorro com três cabeças segurava seu vestido pela barra com duas bocas enquanto a terceira latia frenética.
- Sim filha. Voltei.
A voz era estranha, maligna. Mas a saudade da pequena criança era muito maior.
Ela caminhava em transe quando aquele ser pulou sobre ela. O corpo de leão da criatura caiu pesado com o bote. Enquanto a calda de escorpião cravara no chão, onde deveria estar à criança.
Sérvio havia ouvido o latir do pequeno Cérbero e usando uma de suas cartas invocou uma arcana para ajuda-lo.
A criança segura no colo da arcana imperatriz chorava de medo diante da manticora que quase a matara.
- Imperatriz. - disse Sérvio - Leve daqui a criança, esconda-se no laboratório de Hemisarê até eu voltar. Se eu não chegar em 5 minutos invoque esse feitiço e a entregue para essa pessoa.
Sérvio entregou o papel para a imperatriz. Que fugiu o mais rápido que pode com a pequena.
Então ele sacou o baralho e lançou ao ar cinco cartas.
- Força, Louco, Imperador, Diabo e Fortuna. Vamos acabar com isso.************
A batalha contra a Tirana do Pesadelo foi difícil. Houveram baixas é claro, como toda a batalha. Mas eles venceram. Com um sorriso maligno a própria Tirana fugiu. Mas agora Samael podia ir para casa.
Estavam todos cansados, mas ao chegarem ao portão percebeu que algo estava errado. A cerca fora derrubada. A pequena guardiã do portão havia sido derrotada em seus dentes um chumaço de pelos. Era pelo de Manticora.
Com todo o folego que ainda restara. Samael, a Princesa de Marfim, Hemisarê e suas filhas correram. Não podia ser tarde de mais. O jardim estava destruído. As arcanas de Sérvio estavam caídas ao chão. Eram sete no total.
Pelo que podia se ver, a batalha foi seguindo até o laboratório de Hemisarê. Eles seguiram com armas em riste. A criatura ainda podia estar ali.
Quando chegaram ao laboratório a porta havia sido destruída, então correram. Do lado de dentro Sérvio estava desacordado, mas a criatura estava morta, com uma das armas que Hemisarê guardava ali. Ainda ansiosos, eles caminharam mais um pouco até que encontraram a arcana imperatriz. Ferida mortalmente mais ainda consciente.
- Eu a Salvei.
Disse a arcana antes de desaparecer. Nesse momento o ritual que Samael havia dado a Sérvio para caso acontecesse algo como o que ocorreu, ele pudesse enviar a menina para a terra, onde um amigo que lhe devia um favor cuidaria dela.
Sérvio sempre fiel cumprira com sua missão. Ele nunca falhara. E Samael poderia ao menos ficar tranquilo, pois sua pequena Michaela seria bem cuidada até que pudesse trazê-la de volta.
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Gêneses: Entre o Sonhar e o Pesadelo
RomanceApós ter sobrevivido a tentativa de assassinato do pastor Isaque, Michaella ainda tem sonhos que não sabe explicar. Sonha com um lugar onde uma mulher que ela chama de mãe ainda espera por ela. Seu amado Nero porém precisara viajar enquanto isso ela...