Rebaixado.

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Não é muito necessário saber meu nome, já que não sou importante pro mundo... Mas me chamo Matheus.

Não, isso não é drama, apenas trauma. Fui abandonado a pouco tempo, precisamente, dois dias.

Como já sou grande, estou beirando meus 16 anos, já sabem pra onde vou né? Sim, um internato. Lugar para rejeitados. Para quem não tem e não vai ter amor, e que não merece ter.

Nesse momento, mais ou menos umas onze horas da noite, estou parado frente à uma escola-internato. À dois dias sobrevivo na rua, então devo estar meio sujo, até fedorendo. Meus ferimentos, ainda visíveis, ardem e me lembram do mal momento que tive...

Fui jogado no chão, esmagado como uma formiga, torturado como um traidor. Meus braços e pernas doem muito, afinal várias cadeiras foram quebradas neles. Provavelmente perderei a visão de meu olho esquerdo, graças à ponta avassaladora de uma faca, que o esmagou. Estou suando frio. Não como à dois dias, me sinto fraco... Derrotado.

Me arrasto calmamente até a entrada da escola, tentando não me machucar mais. Toco a campainha e me acomodo no pequeno degrau de madeira, esperando que alguém aparecesse.

Ao mesmo tempo que minha visão fica embaçada, ouço vozes gritando por ajuda, e aceito o fim.

Porém, não...

Acordei em um lugar que julgo ser uma enfermaria. Sinto algo em minhas pálpebras e várias enfermeiras em volta de mim.

- O que será que esse garoto fez? Sussurrou uma delas. - Ou o que ele sofreu. Completou outra.

Mantive meus pensamentos firmes até que um médico entra no quarto, dizendo que já poderiam me dar alta. Quando escuto isso, me auto levanto e, aparentemente, surpreendo todo mundo, por ainda conseguir andar.
Paro um pouco e avisto meus membros, braços e pernas enfaixados, vários hematomas quase pretos pelo corpo e um curativo no olho.

Contínuo andando pelos corredores daquilo que identifiquei ser a escola, recebendo olhares de medo e repulso. Avisto uma placa que informa a direção da sala da diretoria.

Me dirijo até lá, e encontro duas senhoras conversando, que quando me olham, passam um leve sentimento de conforto.

- Olhem quem já se recuperou! Alegremente, uma das senhoras tenta me abraçar, mas desvio e somente sorrio falsamente.

- Só quero me matricular aqui. Tento ser o mais confiante possível. - E um quarto, por favor.

As senhoras tentam conversar mais, porém meus olhares frios são o suficiente para dizer que não quero conversa.

Pouco tempo depois, saio mancando da diretoria e subo lentamente os sete andares de escadaria. Sim, sete... Alguns minutos depois, chego ao oitavo e último andar da escola, onde ficaria meu quarto.

Adentro um pequeno cômodo mofado, vejo que nele tem duas camas, ou seja, tenho um "colega" de quarto. Perto de uma das camas, uma estante preta está toda decorada com fotos de uma família, provavelmente da pessoa com quem dividirei quarto.

Me dirijo à outra cama, que possui outra estante preta vazia, e sento na cama, pensando no que fazer daqui pra frente. Porém, ouço uma voz se aproximando.

- Bang Bang, there's go your heart! Yeah, I know you wanna! Um menino loiro, com aparentes 16 anos e olhos azuis aparece cantando ( e invadindo) o quarto, só de toalha e com uma touca de banho.

- Err, Oi? Sua voz meio fina tomou conta do lugar, e, estranhamente, me estremeceu.

- Matheus. Falei tentando não manter contato visual, e acabei olhando para uma de suas fotos com a família.

- Não, eu me chamo Cadu! Cruzou os braços como se estivesse indignado. Mas que menino burro!

- Eu me chamo Matheus. Revirei os olhos. - Onde fica o banheiro?

Ele me informou de que era no final do corredor oposto ao corredor do quarto, e que eu ficasse tranquilo já que não haviam outros quartos no andar, somente salas de depósito.

Antes de sair, pensei rapidamente uma coisa simples: Roupas. Onde arranjaria roupas que servissem em mim? Mais uma vez, graças a minha estupidez, terei que me rebaixar aos outros.

Voltei rapidamente ao quarto, Cadu já havia se vestido.

- Cara, você pode me emprestar alguma roupa? Qualquer uma, pode ser velha mesmo.

Ele me encarou de forma estranha, como se fosse diferente de tudo usar roupas, mas me deu um conjunto preto, meio velho, mas confortável.

- Ei Math, posso chamar de Math né? Não, não pode, pensei. - Onde estão suas coisas?

- Isso é pessoal, qualquer dia te conto. Sai correndo do quarto, antes que contestasse mais.

Ser rejeitado pela família não é algo bom, então ninguém alem de mim e meus monstros internos precisam saber disso.

Adentrei o banheiro e tranquei o mesmo. Olhei fundo em meus olhos castanhos que brilhavam por conta da luz do sol no espelho. A partir de hoje, eu sou um novo Matheus.



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