O Coração

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Passam alguns minutos conversando banalidades - lugares que gostam de frequentar, viagens que fizeram e que pretendem fazer, filmes que assistiram e livros que leram. A conversa flui com facilidade. Olivia está encantada com Joshua, nunca sentira esse súbito interesse, uma sensação de compatibilidade que perpassa a barreira da intensa atração sexual. Em um momento da conversa, Joshua se aproximou de Olivia, diminuindo a distância que ela havia estabelecido. Ela não rejeitou a proximidade, não rejeitou o toque em sua mão e as carícias em suas costas.

Antony convidou todos para a pista de dança e os dançarinos que estavam no palco se juntaram aos que lotavam o local. Olivia olhava a movimentação com curiosidade e entusiasmo.

- Quer dançar, Liv? Vamos. – Diz estendendo a mão. Olivia a pega, incapaz de recusar o convite.

Joshua conduz Olivia até a pista de dança, no primeiro andar da Surrender, com a mão apoiada na parte nua de suas costas. Aquele toque foi suficiente para que as reações que Olivia ocultara durante todo o tempo em que conversaram viessem à tona. Antony selecionara uma lista de músicas com uma melodia sexy e ousada para aquela parte da Festa Cabaré. Quando alcançam a pista, soam os primeiros acordes de Lady Marmalade, música tema do filme Moulin Rouge que inspirou a festa, e os dançarinos fizem uma coreografia.

Olivia se aproxima do palco e acena para Antony. Logo, a música chega ao fim e um dos dançarinos a aborda e a convida para dançar. Sem perceber o que sua atitude significa, busca Joshua com um olhar, pedindo sua permissão. Ele assente e aquele lindo sorriso brinca novamente em seus lábios. Começa a tocar Feeling Good, uma versão na voz de Michael Bublé, e Olivia não faz ideia de como dançar aquela música ou aquele ritmo, mas o dançarino a conduz lindamente pelo salão, com movimentos leves e sensuais.

Assim que a dança acaba, Olivia sente mãos fortes brincando em sua cintura e quando se vira é obrigada a se esquivar de um beijo. Antes que pudesse repreender o homem, ele a segura pela nuca e insiste em beijá-la, sem que ela consiga se desvencilhar. De repente ela escuta um rugido de dor. O homem que a segurava, contra sua vontade, está no chão e o nariz sangra. Que pancada!

Tudo acontece tão rápido que Olivia não percebe que Joshua a observava, encantado com a graciosidade e sensualidade da dança de Olivia. Quando percebeu que um homem extrapolava os limites, correu em sua direção e a libertou dos braços abusivos. A raiva percorreu todas as terminações nervosas de Joshua, que não continuou batendo no infeliz porque os seguranças rapidamente o carregaram para fora do estabelecimento.

- Você está bem?

- Sim, estou. Obrigada.

Joshua a abraça, tentando protegê-la. Ele a envolve em seus braços e a movimenta no ritmo suave da música. Olivia apoia o rosto no peito de Joshua. A música termina e seus olhos se encontram e as bocas se aproximam. A expectativa do beijo desponta no instante em que ele toca seu rosto, com movimentos tão leves que a fazem fechar os olhos para desfrutar o prazer do momento. Seu dedo segue o caminho da sua boca e a contorna com suavidade. Os lábios de Olivia se entreabrem e a respiração descompassa. Abre os olhos procurando os dele, mas estão fechados, mostrando-o tão entregue quanto ela. As bocas se tocam sutilmente. Suas mãos se enroscam em seus cabelos e as bocas se unem complacentes. Olivia sente seu gosto e, gentilmente, sua língua percorre sua boca, pedindo passagem. Ela cede. Ela aproveita. As bocas sobrepostas estão em total sintonia. A necessidade do contato faz o delicado beijo se prolongar.

Ficam assim por alguns minutos. O tempo parece congelar. Não existe mais ninguém ao redor, apenas eles.

- Fica comigo essa noite? – Ele pergunta com a voz sussurrada.

- Eu...

- Por favor. Faz muito tempo que não me sinto tão bem, tão leve. Eu não sei o que é isso que eu estou sentindo, mas eu estou gostando muito de estar com você.

- Eu também estou. Gostando de... de ficar com você, mas...

- Só por hoje... Não pense em nada... Só por hoje.

- Tudo bem. Apenas essa noite.

Ela não conseguira dormir. Observara Joshua dormindo com um semblante sereno, mas fora invadida por um sentimento de culpa, como se cometesse um pecado terrível. Como poderia investigar o Caso Parker, completamente envolvida por Joshua? Participando da emboscada que a vida criara. Da infidelidade.

A noite fora simplesmente maravilhosa. Após deixar a boate seguiram para um pequeno apartamento, moradia temporária de Joshua. Sentaram-se no sofá e ele selecionou algumas músicas, mas Olivia não conseguiu prestar atenção em nada. Ao mesmo tempo que ansiava por aquele contato, se condenava por estar diante de um dilema ético. Precisava relaxar, havia decidido aproveitar. Apenas uma noite. Josh abriu uma garrafa de vinho. Beberam, conversaram e trocaram beijos carinhosos. As carícias foram aumentando vagarosamente. Ele a contemplava, beijava cada pedacinho de seu corpo exposto. Ela o admirava e retribuía em êxtase. Olivia vivera o estágio pleno do fazer amor, ali, no sofá da sala. Compatibilidade, química e intimidade. Não fora apenas sexo casual, ambos tinham consciência disso. Tanto, conquistado em tão pouco tempo. Tão intenso. Irreal demais, aos olhos céticos dela. Os primeiros vestígios da manhã despontavam na sala quando Joshua adormeceu. Olivia deitou em seu peito e apenas refletiu sobre como agir após esse encontro. Não queria que acabasse ali.

Nunca acreditei em amor à primeira vista. Na paixão, sim: a parte irracional que responde aos estímulos primários sentidos pelo corpo. Atração sexual, desejo, o despertar, o primeiro contato. Tudo isso é paixão. A parte mais racional, conquistada aos poucos, catalisadas pela paixão, significam o amor. Mas o que é o amor? Entrega, intimidade, complacência, completude. É tudo tão abstrato que não consigo definir. Rótulos? Por que precisamos de rótulos? Será possível viver o conto de fadas da vida real? Inventar o meu mundo cor de rosa?

As peripécias da vida a fizeram ver o mundo racionalmente. Tudo preto no branco. Mas não havia nada racional em estar na cama do marido da sua futura cliente. Não havia nada racional naquele sentimento de querer mais e querer bem, que sentia em tão pouco tempo. Não havia nada racional na angústia que elucidava a despedida. Nada era racional, apenas sentido. Pensou. Especulou. Decidiu. Colocou na balança a razão e o coração. Aferiu a linha tênue que os divide, que os equilibra. Optou pelo coração. Por isso, decidiu deixá-lo.

Joshua acordou esperançoso. Almejando dias melhores, com a ilusão de viver aquela insana emoção. No entanto, encontrou o desapontamento, a desilusão, nas palavras lidas naquela carta. Se sentiu usado, traído. Como ela pode ajudar a Melissa?

Josh,

Faltam apenas dois meses para se tornar um homem livre. Poderia parecer uma atitude egoísta sair sem me despedir, fugir. Por isso, resolvi deixar essa carta. Não poderia conviver com a culpa de ser a ruína da sua vida profissional, sei que você está em um casamento de conveniência e que a infidelidade é uma cláusula que pode comprometer seus sonhos.

Infelizmente omiti que a Melissa me procurou e que sou detetive particular. Ela está sendo chantageada e buscou minha empresa. Vou encontrá-la hoje e farei o possível para ajudá-la.

Não imaginei que tudo se desenrolaria ou se enrolaria dessa maneira, que me envolveria com você. Não imaginei me apaixonar.

Faltam apenas dois meses para que eu possa te encontrar novamente. Se me quiser, como eu te quero, me espere. É tudo que peço.

Com amor, Azeitona.




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