Carmesim

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     Um simples golpe e ela me desmascarou. Tudo veio ao chão. O meu colete protege o peito, minha faca não foi afiada suficiente para que penetrasse sua desconfiança. Estou como um mendigo amarrado, sendo almejado com ódio. Ela tem a arma, a pólvora, o alvo. Não irá demorar ate que me derrube. Levo em consideração que sua indecisão não a deixará ser fria. Sussurros. Minha voz diz: Atire, não perca tempo já que nada lhe impede.
Espere. Tudo bem, me expressei mal. Havia um cadeado complexo sobre o qual não compreendi e fui adolescente e o forcei lentamente até quebrar. Estou dentro, percebe? Não sou o certo, nem o errado. Sou o que preciso e o que desejo. Seu amigo, acariciando seus cabelos devagar, ouvindo seu delírio ou devaneio, falando o que você quer, falando aquilo que você deseja em seu íntimo escondido. Estou aonde ela não vê. Esta em dúvida, tremendo sem perceber o que lhe escorre entre os dedos, enquanto mira aonde acredita que eu esteja ou no que ela acredita que eu seja. Alguém lhe socorre, ele a acalma, instrui como prosseguir. A respiração pesada desaparece enquanto os braços dele se unem aos dela. Ela a diz: Atire. Ela não confia no estranho homem, mas esta cega, seu ódio insensato a seduz, sua raiva anseia por aquilo. Sua mente não estava preparada para aquela situação. Por que se preocupara tanto com um mero ninguém? Mesmo sendo Lindo, veja comigo enquanto estou no chão e entenda melhor.
Ele a vê, a sente, sabe o que ela quer e o que tanto precisa. Como um bem feitor, acolhe de braços abertos seus problemas enquanto ela o teme, se intriga sobre essa figura desconhecida, doce e tão serena. Um perfeito acaso do destino, não? Um pouco estranho posso dizer. Ela não decida se é bom ou mal, amigo ou inimigo, mesmo que ele a tenha nos braços sem perceber que já esta nas mãos dele. Ela continua indecisa, porém mais calma e ingênua. Mas ela percebe? Devo me importar? Afinal, quem esta no chão sou eu e não ela. O que fazer....
Amor e ódio. Certeza e dúvida. Estou sorrindo de maneira cínica. Quer que atire ao invés de ficar pensando. Faça-o de maneira que eu não sinta, da maneira que não sinta remorso. Somos parecidos – ou já fomos em parte – mas não sou nada para ela. Parte de mim, não gosta disto. A outra parte esta adorando, desafios lhe chamam atenção, mesmo que não esteja nem ai. Um fogo cruzado. Estamos travando uma batalha para que nada mude então? Ela cai. Seu pedestal não duraria para sempre, Nada duraria. Por mais alto que se possa chegar, haveria momentos assim. Tratada como tudo, como a única, seja por quem for e da maneira que for. Uma rosa perde seus espinhos. O estranho a desarma tirando aquilo que pode ferir, cortando todos os seus ramos para que não volte a crescer. O estranho ajuda-a enquanto eu fico escondido. Haveria então diferença entre o mero mendigo e o sábio que a aconselhou? Como um amante apaixonado, ele a deseja, a seduz, quer sentir seu gosto e provar seu sabor mais profundo. Quer ouvir sua voz gritando baixinho enquanto perde todo o oxigênio ao seu redor.
Quer colocar as mãos no pescoço e ver a face avermelhada com medo, implorando por mais.
Volte. Por favor, volte. Não seja o fim daquilo que começou. Devolva a arma , os argumentos e deixe-a decidir. Deixe que desabroche suas pétalas durante a noite, da maneira mais bela e pura possível. Deixe que formule suas ideias sobre quem não conhece, tendo uma opinião da qual ela pode defender. Deixe que tenha a beleza marcada nas estrelas, enquanto suas lágrimas banham o mais perdido dos homens, sendo guia nas noites difíceis. Deixe que seja o que ela preferir.
Sou o que devo ser e se precisar serei apenas um cadáver, a vela que apaga aos poucos a sua própria existência. Se ela prefere puxar o gatilho, assim seja, mas espero que não olhe para traz, muito menos chore rosas no seu quintal, afinal Ele pode se tornar um jardim Carmesim.






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