A Queda d'um Anjo Romance

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A QUEDA D'UM ANJO ***

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A QUEDA D'UM ANJO

ROMANCE

POR

CAMILLO CASTELLO BRANCO

LISBOA

LIVRARIA DE CAMPOS JUNIOR--EDITOR

77--Rua Augusta--81

1866

Imprensa de J. G. de Sousa Neves--Rua do Caldeira, 17

*DEDICATORIA*

ILL.^{MO} E EX.^{MO} SR. ANTONIO RODRIGUES SAMPAIO

Meu amigo.

Volto a offerecer-lhe uma das minhas bagatelas. Chamo assim, para me fingir modesto, bagatelas a umas coisas que eu reputo no maximo valor. Se não fossem ellas, naturalmente eu não chegaria a grangear a estima de V. Ex.^a, que m'as tem lido, e alguma vez louvado. Já V. Ex.^a, antes de me conhecer, quiz encravar a roda do meu infortunio, roda com que eu estou sempre brincando como as creanças com os seus arcos. Que tinha eu feito para commover a bemquerença do meu prestante amigo? Tinha feito uns livros futilissimos, á imitação d'este que lhe offereço.

Não é esta boa opportunidade de eu vir com a minha oblação de pobre a V. Ex.^a Lembra-me a sentença do nosso Diogo de Teive:

_Donat cum egenus diviti Retia videtur tendere_.

Os praguentos hão de querer ver aquellas _rêdes_, por que não sabem que V. Ex.^a já me constituiu, ha muito, no dever de eterna e profunda gratidão.

Lessa da Palmeira 27 de setembro de 1865.

CAMILLO CASTELLO BRANCO.

I

*O heroe do conto*

Calisto Eloy de Silos e Benevides de Barbuda, morgado da Agra de Freimas, tem hoje quarenta e nove annos, por ter nascido em 1815, na aldeia de Caçarelhos, termo de Miranda.

Seu pae, tambem Calisto, era cavalleiro fidalgo com filhamento, e decimo sexto varão dos Barbudas da Agra. Sua mãe, D. Basilissa Escolastica, procedia dos Silos, altas dignidades da egreja, commendatarios, sangue limpo, já bom sangue no tempo do senhor rei D. Affonso I, fundador de Miranda.

Fez seus estudos de latinidade no seminario bracharense o filho unico do morgado da Agra de Freimas, destinando-se a doutoramento _in utroque jure_. Porém, como quer que o pae lhe fallecesse, e a mãe contrariasse a projectada formatura, em razão de ficar sosinha no solar de Caçarelhos, Calisto, como bom filho, renunciou á carreira das lettras, deu-se ao governo da casa algum tanto, e muito á leitura da copiosa livraria, parte de seus avós paternos, e a maior dos doutores em canones, conegos, desembargadores do ecclesiastico, cathedraticos, chantres, arcediagos e bispos, parentella illustrissima de sua mãe.

Casou o morgado, ao tocar pelos vinte annos, com sua segunda prima D. Theodora Barbuda de Figueirôa, morgada de Travanca, senhora de raro aviso, e muito apontada em amanho de casa, e ignorante mais que o necessario para ter juizo.

Unidos os dois morgadios, ficou sendo a casa de Calisto a maior da comarca; e, com o rodar de dez annos, prosperou a olho, tendo grande parte n'este incremento a parcimonia a que o morgado circumscreveu seus prazeres, e, por sobre isto, o genio cainho e apertado de D. Theodora.

_Remenda teu panno, chegar-te-ha ao anno_, dizia a morgada de Travanca; e, afferrada ao seu adagio predilecto, remendava sempre, e sergia com perfeição justamente admirada entre a familia, e fallada como exemplo na área de quatro leguas, ou mais.

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⏰ Última atualização: Mar 16, 2008 ⏰

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