UM DIA, RECEBI UMA VISISTA. Eu estava na sala de TV, vendo Lisa assistir à televisão, quando uma enfermeira veio me avisar.
- Tem uma visita para você - ela disse. - Um homem.
Não era meu namorado problemático, que por sinal não era mais meu namorado. Una pessoa internada lá pode ter namorado? Além do mais, ele não suportava entrar ali. Sua mãe também esteve internada em um hospício, como fiquei sabendo depois; e ele não suportava lembrar disso.
Não era meu pai, que andava ocupado
Não era meu professor de inglês do ginásio, que havia sido despedido e se mudará para a Carolina do Norte.
Fui ver quem era
Ele estava de pé junto à janela da sala de visitas, olhando para fora: alto como girafa, ombros caídos, acadêmicos, pulsos aparecendo pelas mangas do paletó, cabelos claros espetados como uma auréola em torno da cabeça. Ao me ouvir chegar, virou-se.
Era Jim Watson. Fiquei contente em vê-lo ali, pois, nos anos 1950, ele descobrira o segredo da vida, e talvez agora me contasse qual era.
- Jim! - Exclamei
Ele se aproximou, levitando. Quando conversava com alguém, levitava, hesitava e se anulava; e eu tinha simpatizado com ele exatamente por isso.
- Você está ótimo! - Ele disse
- E você esperava o quê? - Perguntei.
Ele sacudiu a cabeça.
- O que eles fazem com vocês, aqui? - Falou, em um sussurro.
- Nada - respondi. - Não fazem nada.
- Isso aqui é horrível - disse ele.
A sala de visitas era uma parte especialmente horrível do nas forradas com vinil, que peidavam quando alguém se sentava.
- Não é tão ruim assim - afirmou. Contudo, eu estava acostumada; ele não
Ele levitou de novo até a janela e olhou para fora. Após uma pausa, chamou-me com um gesto do braço comprido.
- Olhe - disse, apontado para alguma coisa.
- O quê?
- Aquilo ali - apontava para um carro, um carro esporte vermelho, um Mustang, talvez. - É meu - disse.
Como ele ganhara o Prêmio Nobel, provavelmente comprara o carro com o dinheiro.
- Bonito - observei. - Muito bonito.
- Podíamos ir embora - sussurrou.
- Hã?
- Você é eu podíamos ir embora.
- De carro você quer dizer? - Eu estava perplexa. Seria esse o segredo da vida? O segredo da vida seria fugir? - Eles iriam atrás de mim - falei.
- Ele corre muito! - Disse. - Eu poderia tirá- Lá daqui.
De repente, tive por ele um sentimento de proteção.
- Obrigada - respondi. - Obrigada por oferecer. É muita gentileza sua.
- Você não quer ir embora? - Ele inclinou-se para mim.
- Podíamos ir para a Inglaterra.
- Para a Inglaterra? - O que a Inglaterra tinha a ver com o que quer que fosse? - Não posso ir para a Inglaterra - respondi.
- Você poderia trabalhar como governanta.
Durante cerca de dez segundos fiquei imaginando aquela outra vida que começava comigo entrando no carro verdade de Jim Watson e nós dois disparando a toda do hospital para o aeroporto. A parte de ser governanta não me parecia clara. Alias, nada me parecia claro. As cadeiras de vinil, as telas de segurança, a campainha na porta da sala das enfermeiras: essas coisas, assim, eram claras.
- Agora estou aqui, Jim - falei. - E acho que é aqui que tenho Zé ficar.
- Tudo bem.
Não parecia aborrecido. Deu uma olhada na sala uma última vez e sacudiu a cabeça.
Fiquei ali, junto à janela. Minutos depois, vi-o entrar no carro vermelho e ir embora, o escapamento soltando pequenas baforadas. Em seguida, voltei para sala de televisão.
- Oi, Lisa - falei. Era bom encontrá-la ainda ali.
- Humm - disse ela.
Eu e ela nos acomodamos para ver um pouco mais de TV.