Hannibal
Uma leve tensão pairava sobre aquele jantar que, de uma forma ou de outra, tinha gosto de despedida. Ambos, Hannibal e Will, estavam imersos em seus pensamentos, embora tentassem aparentar tranquilidade.
Graham repassava o plano em sua cabeça. Havia se tornado um hábito desde retomou sua terapia com o psiquiatra, sempre relembrar todos os motivos que tinha para se vingar. A traição, a manipulação, a maldade. Não podia se deixar persuadir, não podia se deixar esquecer. Devia isso ao mundo e principalmente a si mesmo. Enfim o acerto de contas pelo qual tanto ansiou.
Os sentimentos de Lecter eram um mistério até para si mesmo. O cheiro que sentiu em Will, o cheiro de Freddie Lounds, o curou da cegueira que tinha imposto a si mesmo. Mas mesmo tendo descoberto que Will estava tentando o enganar ele sabia que o outro não era o mesmo Will que conheceu. Ele estava mudado. Ele o mudou. A eficácia de sua influência seria o bastante para fazê–lo abandonar essas vãs esperanças de um acerto de contas sem sentido? Iria Will se permitir voar sem se preocupar com a queda? Ele ainda queria lhe dar outra chance e queria que ele a aceitasse.
Não importava o rumo que as coisas tomassem na noite seguinte, essa ainda seria a última refeição que teriam juntos ali naquele lugar no qual passaram por tanta coisa.
Embora a mente de ambos estivessem cheias de pensamentos, ainda sim tinham entre si mais um daqueles inúmeros diálogos aparentemente inofensivos, mas cheios de significados.
– É realmente necessário que Jack morra?
Will foi pego de surpresa por aquela pergunta, o que faria com que Hannibal hesitasse?
– É necessário. Jack merece saber a verdade sobre você. Sobre nós.
– Poderíamos desaparecer agora. Hoje à noite.
Will foi mais pego de surpresa ainda.
– Arrume suas coisas, alimente seus cães e diga adeus a essa vida. Dê uma chance ao seu novo eu, Will. Dê uma chance a nós e a vida que poderíamos dividir.
Ele queria contestar aquilo, mas não pôde. Sua mente entrou em pânico porque sabia que não devia hesitar, mas de alguma forma estranha a perspectiva de Hannibal ser preso e de nunca mais poderem compartilhar a intimidade que tinham o amedrontava. Não queria perder isso. Não queria perder seu alicerce novamente. Então cedeu.
– Ontem você me mostrou um desenho seu de Aquiles lamentando a morte de Pátroclo. Venho pensado bastante sobre nossa semelhança com eles, mas não quero que nosso fim seja como o deles. Se eles tivessem ficados juntos, se eles tivessem se afastado da guerra... – Will franzia o cenho enquanto encarava o próprio prato.
Hannibal não precisava que o outro terminasse a fala dele. Sabia que havia concordado.
Will o havia aceitado, então ele devolveria a cortesia.
O restar do jantar foi preenchido de olhares profundos e significativos de um para o outro. Eles estavam dando um passo enorme, o bastante para mudar ambos.
Eles seriam companheiros dali por diante. Sem máscaras agora.
Will foi a sua casa, mas pouco havia o que quisesse levar. Era de fato muito pouco apegado a suas próprias coisas. Tentou deixar uma carta para aqueles que estava abandonando, mas percebeu que não havia nada a dizer em um momento como aquele. Alimentou seus cães e se despediu deles com carinho.
Deixou aquela vida para trás.
Quando voltou à casa de Hannibal o mesmo lhe recebeu com um sorriso.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Quando a Xícara de Quebra [Hannigram]
RomanceO que aconteceria se Will aceitasse a oferta que Hannibal fez? Companheiros, membros de uma mesma família. A ligação dos dois os levaria ao nirvana ou à ruína.