O objeto redondo

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Eu só queria saber o motivo. Só queria saber a razão. Saber por que eu estou aqui. O que eu estou fazendo aqui? Será que eu faço alguma diferença? Liz diz que todos os Habitantes têm um motivo de estar ali. Um destino. E eu tinha que encontrar o meu. Mas não há objetivo para mim. Não há porquê eu estar viva. Depois de dezoito anos capturando peixes pra vender, eu descobri que é só isso que eu faço. É só isso que eu vou fazer até o fim dos meus dias. E, se eu parasse de vender os peixes, não faria muita diferença já que outros vários Habitantes fazem o mesmo.

Eu sou mesmo uma pessoa desnecessária nesse Universo.
Pelo menos eu posso poupar-me desse pensamento quando estou nadando. É como se cada sentimento ruim se esvaísse de mim. O único fato que chega a ser distante de perfeito em ficar em baixo d'água é não poder falar ou respirar. Mas isso, de um modo geral, nunca foi um problema para nós. Ficar embaixo d'água por apenas duas horas e se comunicar através dos sinais. Só não sei por que temos que aprender a língua dos sinais desde crianças, já que só podemos nadar sozinhos a partir dos dezesseis.

A corrente fria me causou um calafrio e bolhas saíram das minhas narinas em abundância. Vejo algo brilhar entre os corais. Com a curiosidade me cutucando, movimentei os braços e pernas para ver mais de perto. Mas, me aproximando, fico apenas mais confusa sobre o que é: um objeto redondo, prateado, com estranhos símbolos nas bordas e três setas, lembrando retas, com origem no centro e apontadas para diferentes direções.

Muitas perguntas perfuravam meu cérebro, mas não tive tempo para elas. Minha garganta começou a se fechar. Olhei no cronômetro em meu pulso e eu estava em baixo d'água a duas horas e meia, trinta minutos a mais do recomendado. Meu pulmão logo ia começar a se encher de água, então nadei para cima, ainda assustada de como consegui encarar o tempo e a minha natureza.

                                ***

Assim que pulo para fora do Lago, deito no chão com braços e pernas abertos. Eu consegui. Eu sobrevivi! Liz vai me matar.

Tossi um pouco, cuspindo água e sentindo meu pulmão puxar todo o ar que pudesse. Algumas pessoas que estavam passando olharam para mim. Não era comum nos afogarmos, porque ninguém era desligado o suficiente para se esquecer do tempo. Um dos únicos casos que tivemos foi de um homem que se afogou por não carregar a bateria do cronômetro.
O que nós fazemos diariamente. Saco.

Levantei-me de forma um tanto desajeitada, e consegui me sentar. Percebo que todo mundo está indo na mesma direção. E, quando vejo, não há mais ninguém por perto. Apenas pequeninas pessoas ao longe se direcionando para o salão de reuniões. Cheguei a questionar o motivo, mas não me demorei a deixar isso de lado.

Queria ter tido mais tempo para pegar aquele curioso objeto. De todos os objetos estranhos que eu já vi, aquele superou. Porque alguém precisaria de algo como aquilo? Como será que funciona?

Antes que eu pudesse mergulhar novamente no Lago, ouço a voz de Liz se aproximando.

"Kiara! Ainda bem que eu te achei! Vamos, o Concelho está convocando uma reunião de emergência!" ela me puxou pelo braço e me levantou.

Liz usava uma saia branca até os joelhos, os seios à mostra. Eu estava nua. Afinal, nadar vestida me incomoda mesmo. Todos nós, habitantes de Corais, usávamos roupas brancas. Era nosso padrão. Cada Mundo tinha um padrão. Os Habitantes do Mundo das Chamas usavam roupas vermelhas, os do Mundo dos Cristais usavam roupas azuis-claro. E os Habitantes do Mundo dos Ventos usavam roupas cinza.
Porém nós usávamos roupas em poucas ocasiões. Como por exemplo uma reunião, onde todos usavam pelo menos uma peça de roupa. É por questão de respeito ou alguma coisa, eu acho uma idiotice. Odeio usar roupas. Pinicam, me deixam com calor e atrapalham quando eu ando.
         
"Droga, Kiara, você não está com roupas!" ela parecia nervosa "Ainda bem que quando eu fui lá em casa buscar roupas lembrei de você e trouxe também" ela desamarrou um vestido da cintura e enfiou-o sob minha cabeça. "Kiara, você precisa ser mais responsável. Se não fosse por mim você estaria perdida" ela passou meus braços sobre as alças como se eu fosse uma criança.
         
Fiz uma careta. Ela tinha que pegar justo um vestido? Antes que eu tivesse a chance de reclamar, ela me puxou às pressas para o Salão.

A Enviada.Onde histórias criam vida. Descubra agora