Todos os dias, ela chorava antes de dormir, apesar de nem sempre haverem lágrimas para serem derramadas. Todas as noites, estreladas ou nebulosas, ela abraçava o travesseiro e soltava soluços silenciosos, deixando que a toda a dor que sentia saísse, até que nada mais restasse além de um sono sem sonhos.
Ao acordar, ela sorria. Prometia a si mesma que o dia seria diferente. Quebrava a mesma promessa horas depois, ao derramar sua dor silenciosa no travesseiro. Mesmo assim, ela sorria e prometia, acreditando que seria melhor se ela acreditasse que tudo ficaria bem, mesmo quando não ficasse.
A vida dela não era ruim, não sempre. As vezes, as lágrimas derramadas eram poucas, quase se transformavam em sorrisos. Nestes dias, ela costuma sonhar com flores e cores, lugares e sabores. Uma poesia, talvez.
Havia as lágrimas, os sorrisos, as promessas, os sonhos e o travesseiro, sempre. Era seu pequeno ritual, realizado todos os pequenos e grandes dias, com grandes e pequenas esperanças.
Nem sempre havia alguém para perceber seus sorrisos e lágrimas, e era justamente esse o motivo. A vida não era ruim com ela... Não, claro que não. A garota sentia falta de algo que nunca possuiu, se é que isso é possível, mas era. O motivo de seus sorrisos, sonhos e lágrimas não eram sempre os mesmos, mas nem ela era sempre a mesma. As vezes era corajosa, destemida, ou então assustada e curiosa, mas sempre era alguma coisa, mesmo quando ela queria ser nada.
A única coisa que sempre existia era seu pequeno grande ritual e ela mesma. Os amigos mudavam, os amores passavam, as emoções existiam e o mundo a sua volta gostava de lhe pregar pequenas peças, que nem sempre acabavam em sorrisos ou lágrimas, mas acabavam.
As vezes haviam palavras rabiscadas no papel, segredos revelados e emoções sentidas. Quando as palavras deixavam de ser suficiente, ela as queimava até se tornarem cinzas espalhadas pelo vento, segredos guardados em um lugar onde todos podem ver, mas não conseguem. Era a sua pequena metáfora, as palavras queimadas. Como todas as outras coisas, essa deixou de ser suficiente. Os rabiscos no papel, as marcas de tinta e o seu mundo em duas cores pararam de fazer sentido, e ela teve que buscar outras formas.
As pessoas... bem, ela não sabia em quem confiar. Escolhas ruins fizeram com que ela tivesse medo de fazer isso, e quando o medo tornou-se mais forte do que a vontade, ela se calou e guardou suas palavras.
Tentou então expressá-las com a tinta em pequenas frases rabiscadas em cantos quaisquer, mas era um desperdício. Ninguém queria saber de suas palavras, elas não conseguiam entender.
Então ela se calou e ouviu o mundo a sua volta. As pessoas contavam a ela coisas terríveis e maravilhosas, que misturava partes iguais de medo e coragem. Seus medos eram iguais aos dela, e pessoas diferentes se escondiam enpessoas iguais, algo que ela nunca entendeu. Alguns dias, suas palavras não ditas misturavam com as que ela guardava e a afogavam. Não era sempre ruim, mas ela odiava se afogar, até nos bons momentos.
Quando cansava-se de ouvir, ela queria sentir. Os cabelos voando, a brisa no rosto, sentir as palavras tomando forma a sua volta. Isso, ela amava incondicionalmente, apesar de as vezes querer poder não sentir. Sentimentos a deixavam com sensações, e sensações a deixavam perdida.
Quando tudo parecia ruir, ela se abrigava em palavras sentidas, em canções que diziam o que ela queria e também o que não queria ouvir. Palavras sentidas era seu escape, quando rabiscar, ouvir e sentir não eram suficientes.
Haviam também as vezes que ela não sabia o que fazer, perdida em seus próprios pensamentos. O lugar onde suas lágrimas, sorrisos, sonhos e emoções não conseguiam alcansar. As vezes ela queria que a restagassem de lá, mas ninguém nunca vinha. Sair sozinha de lá a deixava confusa e aumentava o vazio que ela sentia. Sim, esses eram os piores dias. Os dias de vazio denso e frio, onde seus sorrisos eram pequenos e gelados.
Então, ela fez a única coisa que podia fazer. Abraçou o travesseiro e chorou até atingir o nada. Quando acordou, ela sorriu e prometeu a si mesma que tudo ia mudar.