Acordei com cheiro de café vindo da cozinha e, apesar de não querer, me levantei para mais um dia de aula. Minha mãe havia assado um bolo para que eu tomasse café da manhã, porém, mesmo sabendo que devia estar delicioso eu não queria comer nada. Era segunda-feira e eu odiava segundas-feiras. Na verdade, odiava todos os dias úteis nos quais eu precisava ir para a escola. Não que eu fosse como aquelas pessoas que tem uma péssima adolescência, eu só não me encaixava em nenhum lugar lá. Minha mãe tinha em sua cabeça que para ter um bom estudo eu precisava estar na escola mais cara que ela podia pagar, o que não era muito mas ela se esforçava. O problema não era a escola, eram as pessoas que haviam nela, para começar, só pessoas da elite eram aceitas lá, consegui entrar depois que minha mãe explicou nossa situação e a diretora ficou com pena. Patético. Não eram todas as pessoas que eram más, porém, em sua maioria, a escola era basicamente barbies vadias e garotos idolatrados por todo mundo, um bando de idiotas. Depois, havia o bullying e os professores cegos, surdos e mudos. Eles podia ver você apanhar na frente deles mas é óbvio que não falavam nada, afinal, os agressores pagavam seus salários. Eu nunca fui o tipo de garota que é vítima de piadas e agressões, sou relativamente bonita, inteligente e até sociável, eu era uma garota normal até conhecer o Justin. Não que eu o culpe por tudo o que aconteceu depois, é claro que não, só que as piadas de mal gosto começaram logo após eu deixar escapar que era Belieber. No começo era fácil aguentar, chamavam ele de gay drogado apenas para me ver explodir ou jogavam minhas coisas no chão, depois foi ficando pior, cortavam meus cabelos e me espetavam com agulhas, com o tempo eles cansaram disso e decidiram que "pessoas como eu" mereciam apanhar. Eu nunca entendi o motivo de odiarem tanto o Justin e muito menos a mim então comecei a matar aula sem que minha mãe soubesse por achar que minha ausência não seria notada. Ela foi. Duas semanas após começar a matar aula a escola ligou para a minha casa. Perguntaram se eu estava bem e se precisava que alguém mandasse meus deveres para mim. É claro que Minha mãe não deixou transparecer que não sabia das minhas faltas porque isso causaria minha expulsão. Resultado, fiquei de castigo sem meu celular por tempo indeterminado. Foi nesse momento que o violino entrou na minha vida. Eu estava voltando pra casa, meu braço estava com um corte por causa do tombo que levei quando me empurraram em cima da lixeira atrás da escola, meus cabelos estavam molhados da água suja do chão e eu já não aguentava mais segurar as lágrimas. Entrei em casa e passei direto, indo rapidamente me trancar no quarto. Tirei a roupa suja e escondi debaixo da cama, passei para o banheiro correndo, esperando que minha mãe não estivesse em casa. Tomei um banho e comecei a procurar nos armários algo para passar no meu braço quando me deparei com ele. No fundo do armário estava um violino vermelho com o nome do meu pai "bordado" na lateral. Peguei-o com as mãos trêmulas. Quando meu pai morreu eu pensei que minha mãe doaria tudo mas, ali com o violino dele nas mãos, eu percebi que talvez ela não tenha tido coragem de se desfazer de algo que era tão importante para ele. Ele passava dias trancado no sótão, tocando por horas a fio, se dedicando para que seu Concerto fosse a melhor coisa que os ouvidos pudessem escutar. Eu me orgulhava dele e esperava que um dia pudesse tocar como ele para que ele também se orgulhasse de mim. Peguei a caixa de remédios e levei-a para o quarto juntamente com o violino. Depois de colocar curativos nos cortes eu peguei o violino e coloquei-o na posição que via meu pai segurando, apoiando o queixo no suporte e segurando o braço dele com a mão esquerda enquanto a direita segurava o arco. Permaneci nessa posição por um longo tempo, apenas apreciando a posição e a forma como ela me lembrava do meu pai. Me assustei ao ver minha mãe entrar no quarto e ver que eu havia encontrado o violino.
-Querida?
-Desculpa, eu estava procurando a caixa de remédios e o encontrei - falei colocando o instrumento em cima da cama e olhando para meus pés, envergonhada por ter sido pega no flagra.
-E posso saber o que procurava na caixa de remédios? - perguntou ela com o rosto preocupado.
-Eu cai e ralei os braços - falei com a voz trêmula.
Minha mãe sorriu e se sentou ao meu lado, pegando o violino e colocando no meu colo.
-Você fica bem com ele nas mãos, quer aprender a tocar?
Olhei para ela sem entender o que queria dizer e percebi em seu olhar que era exatamente aquilo que eu pensava. Eu aprenderia a tocar e orgulharia meu pai, como sempre sonhei.
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Violin
RandomMais um dia havia se passado e cada vez mais eu sentia a necessidade de tocar para ele, a necessidade de mostrar a ele todos os meus sentimentos através do violino. Mais uma vez eu sentei na janela vendo os pingos grossos de chuva, mais uma vez pegu...