Prólogo

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Eu estava caindo muito rápido, mas atravessando as nuvens cada segundo parecia se estender pela eternidade. Uma dor excruciante queimava minhas costas, como navalhas rasgando minha pele. A dor parecia que iria durar sempre e minha queda não iria ter fim. Pelas frestas dos meus olhos podia ver o céu ficar cada vez mais fora de alcance.

Sentia que cada centímetro do meu corpo estava em chamas, senti cada osso se partir e se refazer, meu corpo tomava uma nova forma, uma forma completamente desconhecida para mim. A transformação era torturante, minha pele parecia estar sendo arrancada e substituída. Mas era uma dor necessária, ou ao atingir o chão, eu cegaria cada mortal que tentasse olha para mim. Aos olhos deles, agora eu deveria parecer apenas um brilho branco ofuscante cortando o céu escuro da noite. Talvez eles me confundissem com uma estrela cadente. Mas eu não me importava com isso agora, não me importava com nada, nem mesmo com a dor, eu só queria sentir. E caindo para a escuridão desconhecida, vendo minhas assas se despedaçar, eu fechei os olhos com força esperando atingir o chão.

Então aconteceu, eu me choquei contra o chão com um estrondo e uma pancada forte. As chama do meu corpo começaram a se apagar e a dor se abrandava lentamente. Eu ainda sentia meu coração palpitando forte contra meu peito quando desmaie. Quando eu acordei novamente já havia amanhecido. Enquanto eu abria meus olhos lentamente, piscando varias vezes por causa da claridade, o cheiro de terra invadia minhas narinas. Meu rosto estava contra chão e diante dos meus olhos apenas uma pena negra sobre a grama seca. Eu me estiquei para alcança-la e senti uma dor se estender de todas as extremidades do meu corpo. Levantei a pena diante dos meus olhos e ao fitar o fitar o céu acinzentado ao fundo todas minhas lembranças voltaram para mim como se eu tivesse sido atingida por um raio. Me levantei repentinamente, tentando alcançar minhas costas, mas ao toca minha pele tudo que eu consegui sentir eram grossas cicatrizes em minhas omoplatas. Estendi meus braços diante dos meus olhos para o que agora seria meu corpo. Minha pele era pálida, alva como uma nuvem de um dia quente, e coberta de hematomas roxo-esverdeados, por causa da minha queda provavelmente. Um emaranhado de fios negros caia pelos meus ombros. Vestia trapos de um vestido branco sujo pela terra e a grama. Eu olhei em volta, havia apenas grandes extensões de pastos de gama seca e alta ate onde eu conseguia enxergar, ao horizonte onde o céu se encontrava com a terra. Eu olhei novamente dando uma volta completa, e mais adiante avistei um pequeno casebre. Então comecei a andar em direção a ele, ainda com a pena negra entre meus dedos, a grama alto roçava minhas pernas e o vento agitava meu cabelo.

Ao meu aproximar do casebre, percebi um homem encostado na cerca de madeira, pelas rugas em seu rosto moreno e seus olhos cansados, presumi que o senhor deveria ter mais de setenta anos de vida, pelo o pouco que eu sabia da contagem do tempo na terra. Ele fitava seus pastos vazios como se tivesse perdido a esperança na vida.

—A senhorita esta bem? – O senhor perguntou quando me aproximei.

—Eu, eu... Onde eu estou?

—Bradford, Grã-Bretanha.

—Inglaterra? –Sussurrei para mim mesma.

—A senhorita tem certeza que esta bem? –O senhor perguntou levantando um olhar curioso para mim. —Como se chama?

—Elizabeth. –As palavras escaparam da minha boca antes que eu pudesse me conter. De alguma forma era única coisa que eu tinha certeza sobre mim. —Eu estou bem, só estou... Um pouco perdida. –Respondi olhando em volta novamente

—Ahh... –O senhor suspirou como se compreendesse. —E quem não se sente perdido nos últimos dias? Eu já perdi três dos meus filhos para a guerra. –Ele suspirou novamente. —Não me sobrou mais nada, e mesmo assim essa batalha parece estar longe de terminar... –Ele contou.

—Uma guerra? –Perguntei.

—Onde diabos a moça esteve nos últimos anos? Estamos no meio de uma guerra, se espalhando por todo país. Devia procurar um lugar para se esconder, bem longe daqui. –O senhor disse com amargura. Eu olhei para o horizonte e então respondi:

—Não, aqui é exatamente onde eu devo estar. –O homem me olhou com tristeza.

—Minha filha, escute os conselhos de um velho homem, vá para longe, fique segura, permaneça viva. –Ele aconselhou.

—Me desculpe senhor, mas ficar viva, agora, é minha ultima preocupação. –E dizendo isso continuei andando, mas dei apenas alguns passo a frente e me virei para o homem novamente. —Apenas mais uma pergunta, em que ano estamos?

—1915. –Respondeu o velho. —E escute o que estou lhe dizendo, os dias sombrios estão apenas começando.

Ele estava certo.

Skinny LoveWhere stories live. Discover now