OLHANDO PARA TRÁS

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Virei à rua e senti o cheiro da maresia, o vento de fim de tarde sacudia minhas roupas e meu cabelo, o sentimento de nostalgia me arrastou por um túnel estreito e me jogou de volta a minha infância. Era como se eu tivesse 12 anos novamente, lá estava eu, sentado no deck olhando as ondas dançarem naquele mar infinito, sempre fui apaixonado pelo mar. E de repente ela chega, senta ao meu lado, e me cumprimenta como sempre, bagunçando o meu cabelo, confesso que sempre gostei quando ela fazia isso, mas fingia que não gostava, tinha que dar uma de chato né, afinal um garoto de 12 anos tem que ser chato e botar respeito em qualquer situação, afinal de contas ter fama de durão na escola é como se fosse uma forma de precaução, é evitar em 80% o bullying que eu poderia sofrer, que naquela época era chamado apenas de zoação.

Maria era linda, tinha olhos azuis e cabelos pretos, uma pele bem branca, a gente se encontrava sempre nas férias de verão, o seu Manoel, o avô dela, era vizinho do vô Paulo, às vezes eu pulava o muro de noite pra brincar com ela de quem conta mais estrelas, ela sempre ganhava, mas eu deixava né, claro! No primeiro dia da última semana das férias de 2004 eu acordei decidido que ia pedir Maria em namoro, na verdade acho que nem dormi, ensaiei várias vezes na frente do espelho. Um dia ela me perguntou se eu já tinha beijado alguém, eu disse que já tinha perdido a conta de quantas garotas tinha beijado, menti.

Fiquei a noite anterior toda ensaiando e beijando a minha mão, não podia fazer feio. Uma vez um amigo me disse que tinha que treinar no gelo, fui à minha missão pegar gelo no congelador da Vó Agnes de madrugada, não gostei muito, molhei a cama toda, e de manhã ela pensou que eu tinha mijado.

Quando amanheceu fui encontrar Maria na praia, conforme havíamos combinado, quando ela chegou fiquei nervoso e comecei a gaguejar, fomos andando até o deck, achei que seria o lugar perfeito pra pedir uma garota em namoro, sei lá, sempre via nos filmes e achava romântico. Eu pedi, ela disse sim, fiquei com vontade de sair correndo e me jogar no mar, de tanta felicidade, mas a única coisa que consegui fazer foi dizer que a amava e que ela era a minha primeira namorada e seria a única, pra sempre. Crianças…  Não nos beijamos, ela disse que a noite tinha uma surpresa para mim, mas tinha que ir ate o centro com o seu avô pra comprar mantimentos.

Aguardei ansiosamente a noite chegar, quando deu 15h sentei na frente do relógio da sala da vó Agnes, era um relógio um tanto quanto esquisito, ao invés dos ponteiros eram borboletas coloridas, que giravam e giravam como se uma tivesse seguindo a outra, confesso que levei um tempo para aprender a ver a hora naquele troço.

Exatamente às 17h17min, lembro como se fosse hoje, percebo uma movimentação de carros na porta da casa do avô da Maria, agora oficialmente a minha namorada, só faltava o beijo. Eram carros de policia, logo que cheguei à varanda vi a vó Agnes chorando, corri para o portão, tinha muita gente, todos os vizinhos estavam reunidos, muita gente se abraçava e chorava, a avó de Maria estava parada como se fosse uma estátua, lágrimas caiam do seu rosto, mas ela não tinha nenhuma expressão humana, era como se não tivesse em seu corpo e a tristeza misturada com a dor tivesse se personificado ali na minha frente, cheguei perto do vô Paulo e perguntei o que estava acontecendo, ele me disse às palavras que ficaram registradas pra sempre dentro de mim: – Filho, Maria se foi, ela e o avô sofreram um acidente, e não sobreviveram.

E foi assim meu primeiro amor, meu namoro começou de manhã e acabou de tarde, ainda hoje sinto falta daquele beijo, queria de verdade que ela fosse a primeira garota que beijei na vida, mas o destino não quis.

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⏰ Última atualização: Jul 28, 2013 ⏰

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