"É a história mais antiga do mundo. Um dia, você tem 17 anos e está planejando o futuro. E então, sem você perceber, o futuro é hoje. E então, o futuro foi ontem. E assim é a sua vida."
Ontem
Dezembro, 2014.
Encarando o teto, a adolescente só desejava o oitavo sono, quando não alcançara nem o primeiro. Quarto escuro, casa silenciosa e cama macia; ela não entendia o que faltava ainda.
Sorry, de Justin Bieber, começou a tocar e no mesmo instante, o celular vibrou. Na tela acesa, a frase "Número não reconhecido" piscava. A garota bufou, cansada. Precisava de motivos para dormir e certamente, ligações da cadeia não estavam na lista.
Ninguém mais sabia o que era fazer uma ligação. Apenas a mãe e presidiários tentando passar trote discavam para o número. E ela tinha suspeita forte de que a matriarca, no quarto ao lado, não queria lhe dizer nada.
Ignorou a chamada e tornou a enfiar o aparelho para baixo do travesseiro. Alguns segundos bastaram para o telefone tocar mais uma vez.
— Puta merda... — praguejou com voz baixa — Ignorando mais uma vez.
De súbito, o silêncio reinou. E a música deu lugar ao som do toque de mensagem nova.
Ainda na tela trancada, Mariana conseguiu espiar o conteúdo da mensagem.
"ATÉ QUANDO PRETENDE ME IGNORAR?"
O número não estava registrado. Ela não decorara os dígitos do sujeito do presídio, mas uma leve intuição dizia que o número da ligação anterior era idêntico ao da mensagem. Devia ser a mesma — persistente — pessoa. O corpo contraiu só de imaginar a possibilidade dos amigos terem leiloado o seu número em buscadores de compra novamente. Da última vez, foi o Olx. Se isso realmente estivesse acontecendo, faria orelhas arderem com o sermão armado na cabeça.
Quem é você? Como conseguiu meu número?
Não importa! Apenas pare de me ligar de madrugada
Uma semana e já se esqueceu dos amigos?
Assim vc me decepciona
ps aqui na Alemanha não é madrugada falow
Alemanha? Ampliou a foto do perfil do contato desconhecido. Era um ser humano soterrado na neve. A japona, os óculos e outras vestes grosas a impediam de identificar o suposto "amigo". Pelo estilo, deduzira que era garoto. Ligou os pontos. O único garoto que conhecia e estava na Alemanha era...
— Não pode ser. — a garganta dela secou.
Como conseguiu meu número? [emoji furioso]
Lembrou rápido Pelágio
Saudades ??? [emoji safado]
A garota riu, incrédula com a cara de pau dele.
QUEEEEEE
Ficou louco?
Não se faça de difícil
Olhe
O ar pareceu se esvair do quarto, quando na verdade era Mariana que tinha prendido a respiração. Seus orbes não conseguiam parar de correr pela imagem. Estava sem fala de tão embasbacada. Agradecia, pela primeira vez, por existir um oceano como barreira para que ele não a visse naquela situação, totalmente recuada.
Logo sua melhor amiga, Isabelle, fora quem abrira a boca.
Quem é depre, seu ridículo
Kkkkkkkkkkkkkkk
Mas é vdd?
Antes choro pela morte da bezerra do que por você, queridão
[emoji sorridente]
Não precisa ficar nervosa
Kkkkkkkkkkk
Sem jeito, ela fechou a conversa e tratou de desconectar o sinal do wi-fi. No momento, não precisava saber de mais nada.
— Choramingar... — revirou os olhos, como se houvesse alguém ali para ela provar que era uma calúnia.
A melhor amiga dela é quem choramingaria. E seria de dor. Nada a salvaria.
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F I C A [em hiatus]
RomanceTerminando o primeiro ano do ensino médio, Maurício Scheffer partiria para o intercâmbio de um ano, na Alemanha. Conforme os planos da família, ele foi. Deixou a namorada, um grupo de amigos zoeiros e uma colega - irritante - emocionada para trás...