OLHOS DE JABUTICABA

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Lembro-me perfeitamente de Zé, moço magro dos olhos grandes como jabuticabas, cabelos castanhos e despenteados, e das suas grandes mãos e dedos alongados. Lembro-me perfeitamente dos seus risos e de suas ideias. Zé enxergava o mundo diferente, eu vivia dizendo a ele que isso era um dom, pois nem todos conseguem enxergar tanta simplicidade em pequenos lugares, eu tinha uma sorte danada, por achar um moço como ele, da alma tão pura. Zé sempre andava observando os lugares, os cantinhos escondidos da cidade e toda vez que achava algo de extraordinário, me cutucava com seus dedos compridos para me mostrar. Ele tinha a mania de andar com a cabeça erguida e com o nariz sempre espetado ao ar. Zé sempre me levava para passear pela cidade, às vezes de bicicleta, às vezes a pé, era mais fácil de achar os tesouros espalhados por ai, dizia ele. Quando Zé pegava em meus braços sentia meu rosto corar de tanta vergonha, não sei o porquê disso, mas todas as vezes que sentia sua pele na minha algo mudava, tudo esquentava, e um friozinho na barriga vinha, mas eu sempre me perguntava "como posso ficar corada por um simples toque?". Aos poucos eu fui me adaptando com seu corpo magro e com aqueles olhos arregalados. E foi assim que um belo dia, uma bela tarde de sol quente entre as sombras de uma árvore Zé me beijou, foi um beijo tão doce, tão calmo e conforme ele me beijava seus dedos compridos seguravam meu rosto que ficava tão pequeno entre suas mãos compridas. E vou lhe dizer, eu gostei, e como gostei, foi o melhor beijo que já ganhei. Depois daquele dia dormi bem, e não precisava mais sonhar antes de me deitar. Passei a vê-lo com mais frenquência na esquina de casa, Zé não precisava mais agarrar o meu braço, eu já lhe entregava com toda intimidade, depois acariciava seus cabelos despenteados, ele gostava quando eu fazia isso, logo soltava um sorriso despercebido. Foi um tempo bom, muito bom mesmo meu caro leitor. Passamos a nos olhar mais profundamente os toques eram mais lentos, os olhares eram tão sinceros e os beijos mais profundos, cada dia que passava nosso carinho aumentava. Mas em uma tarde, sentados na esquina, na nossa esquina, Zé me olhou de uma forma que eu nunca tinha visto, um olhar triste me dizendo:
- Ana precisamos conversar! - Seu olhar ainda estava baixo.

- Zé? - levantei seu rosto comprido e seus olhos de jabuticabas estavam cheio de brilho, mas não era um brilho agradável, eram lágrimas, Zé chorava! - O que houve? - minha pequena mão segurava seu rosto comprido.

- Eu vou embora! - As lagrimas começaram a cair

- Embora? - Meu corpo e minha mão se afastaram.

- Ana, passei na faculdade, eu preciso ir! - Zé pegou na minha mão me puxando para perto dele, me abraçando, aquele abraço não era o mesmo abraço de sempre, não era um abraço de carinho, era um abraço de tristeza e saudade! - Eu te mandarei cartas sempre que puder! - disse ele sussurrando em meu ouvido.

- E eu te responderei todas as vezes que me escrever! - Olhei para ele com o rosto molhado e seus olhos grandes me olhavam com todo amor do mundo. Zé podia estar longe, mas eu sempre irei carregá-lo comigo!


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⏰ Last updated: Feb 16, 2016 ⏰

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