O que tiver de ser, será!

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Texto baseado na canção Sea ( Jorge Drexler) interpretada por Ney Matogrosso.

Era uma vez um homem que vivia a viajar. Espírito cigano, espírito mundano. Ele chegava, ficava por um tempo e partia. Chorava e deixava lágrimas ao se despedir. Eles sempre queriam que ele ficasse um pouco mais. Uma vez o encontrei num Café à beira da estrada. Ele, muito silencioso, quase só falava através de canções. Ele se diz peregrino da vida e entende a vida como uma grande viagem. Tivemos um breve encontro, porém rico, que me fez refletir sobre o viver. Ele cantou uma bela canção em espanhol 'Sea' e me falou:

"Já estou no meio da estrada/ Muitas encruzilhadas ficaram para trás"

Sim, já caminhamos bastante – pensei. Já erramos, caímos em armadilhas do destino e sobrevivemos. As marcas ficam em nossa memória. Ainda assim uma força maior nos impulsiona a seguir e não desistir na derrota. E assim mesmo cambaleantes e incertos de onde queremos chegar, prosseguimos, seguindo um pressentimento ou em busca de algo claro.

"Já foi jogada a minha moeda e ela está a girar"

A roda do destino esta em ação e não pára. Não podemos controlar todas as consequências dos nossos atos mesmo que sejamos responsáveis por cada passo que damos. Assustador e excitante, o futuro é incerto.

" E o que será, será..."

Seja como for a intuição sussura algo. Uma intuição que vem de um lugar profundo em nós: além das vozes, do tagarelar mental, cheio de frases condicionadas por nossa história familiar e cultural; além das emoções do coração, tão intensas e inconstantes. Este lugar interior, talvez seio da alma, lago tranquilo que não faz nada pra chamar atenção, nos convida a confiar na vida, e entregar-se.

"Todos os altos e baixos da maré/ Tudo o que já passei/ Eu carrego seu sorriso como bandeira/ E que será, será"

Tudo nos constitui e nos deu recursos para estar onde estamos: lágrimas, alegrias, raivas e medos. Todas tonalidades de emoções e todos os tipos de experiência nos foram lapidando e algo em nós não foi destruído, e resistiu. Mesmo que solitário não estamos sós nesta jornada. Carregamos as memórias dos que amamos conosco. Espontaneamente a memória vem e nos oferece lembranças de momentos agradáveis e difíceis com os seres amados. A alegria de momentos compartilhados nos aquece, a raiva nos ferve pelas ocasiões em que o desentendimento e ofensas reinaram, a tristeza pela falta, pela ausência de quem se ama nos esfria. A jornada da vida fica mais leve quando somos capazes de carregar o sorriso de quem amamos conosco. Carregar o sorriso como bandeira na vida é uma tarefa desafiante na solitária jornada. A vida convida a entregar-se novamente e confiar em si.

"O que tiver de ser, será/ E o que não tiver de ser, sua razão terá/ Não acredito na eternidade dos combates nem nas receitas da felicidade"

Nesta trajetória da vida que crenças cultivamos? Estas crenças nos parecem realistas? Foram além da mente falante e do coração sentinte? Passaram por este filtro interior e vem daquele lugar mais tranquilo dentro de si? Foram aceitas sem nenhuma reflexão? Foram formadas inconscientemente por experiências na infância? Sejam elas quais forem, elas tendem a moldar nosso destino. Atenção a elas! É necessário as vezes redefiní-las, assim como uma reprogramação, e renovar-se para seguir novos caminhos.

"Quando eu começar a receber minhas primaveras/ E a sorte estiver a descansar/ Olharei tua foto na minha carteira/ E o que será, será"

Quando depois de árduos caminhos, descansamos os pés cansados. Quando a primavera vem abundante, quando na fase de colheita, e de descanso, a gratidão pela jornada e pelos que amamos se apresenta.

" E o que queira crer que creia/ E o que não sua razão terá/ Eu libero minha música no vendaval e que a escute quem estiver disposto a ouvir"

Não há necessidade de convencer. Cada um está numa jornada diferente, ou num diferente estágio de vida. O desapego às palavras nos liberta da necessidade de provar pra nós e pros outros que estamos certo. A liberdade que damos a nós mesmos e ao outro se faz presente. As mensagens são soltas ao vento e ouça-as quem quiser.

"Já foi jogada a minha moeda e ela está a girar/ E o que será, será"

Estas foram suas últimas palavras antes de pagar a conta e partir mais uma vez.

Autor: JOSEH GARCIA



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