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Parte um
“Entre a execução de algo temeroso e o primeiro ato, todo o ínterim é como um fantasma, ou um sonho terrível: O gênio e os instrumentos mortais estão em concílio; e o estado do homem, como para um pequeno reino sofre então a natureza de uma insurreição.”
- William Shakespeare, Júlio César
Capítulo um
Reconhecimento
Era tarde de agosto, as folhas que pendiam nas copas das árvores balançavam com a leve brisa que passava de vez em quando. Eu estava na varanda de uma casa em uma pequena cidade no norte de Seattle. O sol já começava a deitar nas montanhas e o tédio corroia a minha alma.
Pequena cidade era um elogio a Bonnie, a população – mais ou menos 10 mil habitantes - costumava se reunir todo o ano para comemorar o dia em que a cidade foi reconhecida no mapa estadual em 93. Era uma linda festa, eles soltavam fogos e havia uma quermesse onde todos iam para dançar, comer e se encontrar. Pararam de fazê-la quando em maio de 97 a cidade foi tirada do mapa novamente.
Tinha me juntado a quatro pessoas neste albergue no fim do mundo a fim de fazer uma purificação da cidade e encontrar inspiração para as minhas crônicas. Trabalhava em um jornal do centro de Seattle na coluna de crônicas – coluna pela qual lutei com unhas e dentes para conseguir – mas meu chefe tinha me dito que minhas crônicas estavam perdendo o “mojo” e que eu precisava de férias para me inspirar. Sabia que era só uma desculpa para me afastar do trabalho e colocar o sobrinho dele no meu lugar, mas resolvi tira-las mesmo assim. O albergue era o mais famoso da cidade tendo em vista que era o único. Dividia quarto com um cara chamado Jones que tinha T.O.C., seus pais haviam mandado ele para a cidade a fim de isola-lo do mundo e fingir que não tinham um filho com transtorno. No quarto ao lado dormiam as duas gêmeas, Megan e Hayley, que tinham sido expulsas porque tinham colocado fogo na própria casa. O outro cara que morava conosco era o dono do albergue, um cara muito gente boa, mas bem na sua também. A casa havia pertencido a sua mulher que ninguém sabe de fato como morreu, mas, todos diziam que havia morrido engasgada na frente do senhor Charlie e ele entrou em choque desde então por não ter sabido como ajudá-la.
Tinha sido um dia monótono como todos os dias na cidade. Acordei bem cedo e fui correr o perímetro da cidade demorei 1 hora para dar uma volta na cidade inteira. Voltei para casa e o senhor Charlie já estava acordado. Tomei meu banho e o ajudei a preparar o café. Logo após fritar alguns ovos meu parceiro de quarto já havia acordado. Vestia seu pijama branco bem limpinho e livre de poeiras e pantufas de macaco. Ele se sentou a mesa esperou. Quando acabei de fritar os ovos e colocar tudo na mesa as gêmeas já tinham acordado e estavam sentadas na mesa junto com Jones e Charlie só me esperando para começar a comer. Sentei-me a mesa e tomei meu café. Quietos como de costume um a um todos se retiraram silenciosamente ate que só sobrava eu na mesa. Após limpar toda a cozinha mais de uma vez, fui para o meu quarto me trocar para ir a um pequeno parque que existia na parte mais alta da cidade “ter alguma inspiração”. Pequei meu caderno meu I-pod e fui. Ao chegar ao parque sai do meu carro – um chevy 1975 – e sentei em sua capota. Abri meu caderno. Ele estava cheio de textos que faziam juz ao meu estado de espírito. Os primeiros textos falavam em como eu sentia falta de toda a agitação da cidade, depois vinha uma enxurrada de como eu precisava arranjar algo para fazer e por fim, meu estado até então, o vazio total. Acho que havia sido tomado pela febre da cidade e havia perdido toda a minha capacidade de pensar.
Era um dia frio e, como todos, eu ansiava por um café bem quente por isso arrumei minhas coisas e quando cheguei na cidade entrei na primeira cafeteria que achei. O lugar era bem rústico, pequeno e simples. Nas paredes pendiam quadros de reis da música como Janis Joplin, Marylin Monroe, Beatles e Michael Jackson. No meio da parede oposta a em que eu me encontrava o fogo crepitava na lareira. O eucalipto estalava constantemente exalando o seu cheiro característico e carregando mais ainda a atmosfera rústica do lugar. Peguei meu cappuccino e me sentei em uma das mesas de mogno do lugar. Um pouco mais a frente, mais perto da lareira, estava sentada uma linda mulher. Parecia ter entre 25 e 30 anos de idade, seus cabelos castanhos pendiam ondulados até seus ombros onde em um degrade perfeito ele começava a ficar vermelho. Usava uns óculos de leitura, porém seu Ray-ban descansava solene na mesa. Vestia uma jaqueta preta por cima de uma blusa vermelha Abercrombie e uma calça jeans. Para fechar vestia all-stars pretos de cano médio. Estava compenetrada em seu livro, algo de Chris Cleave.