Capítulo 1: Tom

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Como sempre a velha estrada estava deserta, nada além de carros abandonados e cadáveres entrando em decomposição.

O vento quente do final da tarde trazia o cheiro de carne pútrida até as minhas narinas, fazendo com que eu tivesse vontade de vomitar. Era estranho ver o mundo naquele caos, três meses antes ninguém imaginaria que o fim do mundo chegaria com fome e dentes.

Cheguei a um ponto da estrada bloqueado por um ônibus escolar tombado, não tinha como passar com o meu velho rabecão por aquele caminho e já sabia que no caminho de volta não iria encontrar nada além de mais e mais mortos vivos.

Peguei tudo o que tinha de útil no carro, o que não era muito, e coloquei em uma mochila, poucas mudas de roupas, três latas de feijão, dois pacotes de biscoitos, três garrafas de 500 ml de água, um canivete, um isqueiro, uma lanterna pequena com cinco pilhas sobressalentes, na alça da mochila prendi uma corda de cinco metros devidamente enrolada e duas panelas presas pelo cabo, na parte de cima prendi uma barraca pequena e uma lona um pouco maior. Podia ser facilmente confundido com um escoteiro, um escoteiro faminto e perdido no meio do fim do mundo. Com uma mangueira retirei o pouco combustível que havia no meu tanque e o coloquei em um galão, não consegui muito mais que três litros de gasolina, em meu coldre coloquei minha Magnum carregada e em meu bolso 7 balas sobressalentes, do outro lado do sinto prendi um martelo, usar uma arma nem sempre era o ideal, o som do tiro atrairia um exercito de mortos vivos, e eu definitivamente não queria que isso acontecesse.

Dei a volta pelo veículo que bloqueava o meu caminho, era possível ver pequenas mãos cheias de sangue batendo no para-brisa sujo do ônibus, pequenas crianças zumbificadas.

Continuei seguindo o meu caminho, vasculhando os carros abandonados a procura de mantimentos para a minha viagem, não tive muita sorte com isso, não consegui nada além de um maço de cigarros pela metade.

Já devia estar andando por duas horas e meia quando encontrei a primeira construção em um raio de oito quilômetros, era possível ver o letreiro do posto de gasolina da Petrobras de longe, o velho fundo verde com as letras BR em amarelo, o posto não era um dos maiores que já vi, tinha três bombas de gasolina já vazias, um lava rápido pequeno, uma oficina e uma loja de conveniências com tabuas tampando as janelas, a porta também tinha tabuas barrando a passagem, mas muitas dessas tabuas já não estavam mais ali, as pessoas que as colocaram tiveram que sair dali, ou os mortos vivos conseguiram entrar.

Mesmo sabendo que a loja de conveniências podia estar lotada de mortos famintos tive que entrar, o lugar podia ter alimentos nas prateleiras ainda, e comer algo que não fosse feijão enlatado e biscoitos mofados cairia bem.

Estava com a minha arma em uma mão e a lanterna em outra, as tabuas na janela impediam que a luz do sol entrasse na loja, deixando o local escuro, as paredes do estabelecimento estavam com a tinta descascando, as poucas prateleiras estavam cobertas por poeira e teias de aranha, no chão era possível ver um rastro enorme de sangue, era como se alguém tivesse sido esfaqueado e rastejado por metros enquanto tentava fugir com vida de seu agressor.

Continuei andando de forma lenta, seguindo o rastro de sangue enquanto conferia as prateleiras da loja.

O rastro acabou próximo ao caixa, mostrando-me quem o tinha gerado, o corpo destroçado estava destroçado, se não fosse pelo vestido rasgado ao lado do corpo e o longo cabelo ensopado de sangue não saberia que aquilo já foi uma mulher, sua barriga estava aberta, sem órgãos internos, boa parte de seus membros estavam comidos, seus olhos já sem vida estava abertos e irados para mim, como se ela estivesse me observando, uma flecha estava alojada em sua testa, alguém tinha dado misericórdia para aquela pobre mulher.

Olhei o resto da loja a procura de mortos vivos, não queria ser surpreendido e acabar virando o lanchinho de fim de tarde. Tive sorte, não encontrei nenhum maldito zumbi no local, agora vinha a melhor hora: a procura de mantimentos. Coloquei a arma de volta ao coldre e comecei a vasculhar as prateleiras, não consegui nada além de oito barras de cereal, e duas latas de refrigerante quente, segui para o fundo da loja, em direção ao banheiro dos funcionários, e para a minha alegria consegui encontrar dois rolos de papel higiênico, já fazia dois meses que eu não sabia o que era usar aquilo, já não aguentava mais me limpar com a vegetação local.

Fui para fora da loja e caminhei até a oficina, talvez encontrasse um carro que ainda pegasse nela. Ainda no caminho podia ver três carros na oficina, um saveiro branco caindo aos pedaços, um novo uno vermelho sem rodas e um fusca azul enferrujado, ao seu lado era possível ver um homem virado de costas para mim, ele era alto, devia ter quase dois metros de altura, vestia um macacão azul de mecânico e o pouco cabelo que lhe restava na cabeça era branco.

— Ei moço! Você poderia me ajudar? Estou meio per...

O homem se virou de forma lenta, então pude notar que ele não era mais humano, a pele que um dia já foi branca estava com um tom acinzentado, seu nariz tinha sido arrancada por uma mordida, parte do seu lábio inferior tinha cortado deixando a gengiva e os dentes sujos de sangue à amostra, seus dedos estavam cobertos por graxa e sangue, um de seus olhos era branco e leitoso enquanto o outro não passava de uma orbita vazia por onde vermes e mais vermes andavam, com seus passos lentos e desengonçados o morto vivo começou a andar em minha direção, dando gemidos e mordidas involuntárias no ar.

Com toda a calma possível retirei o meu martelo do meu cinto, e esperei que o morto vivo se aproximasse, ele já estava perto o suficiente para que eu pudesse ler o nome escrito no seu macacão logo acima de seu peito, Bob, eu nunca tinha gostado de matar, mas para Bob o mecânico era tarde, ele era um maldito morto vivo. Apertei o meu martelo com força, fazendo com que os nós de meus dedos ficassem brancos e então ataquei, o atingi em cheio na cabeça derrubando, mas não com força o suficiente para matá-lo, o mecânico caiu no chão com um baque surdo seguido de um gemido agudo, continuei golpeando-o na cabeça, fazendo com que uma poça enorme de sangue se formasse diante dos meus pés, só parei de atacar o mecânico no momento em que ele morreu novamente.


Zumbis: A dominação dos mortosOnde histórias criam vida. Descubra agora