Sou a única menina do time de futebol do Colégio Santa Mônica desde o primeiro ano, então não é grande coisa quando o técnico Tenório grita aos caras para se certificar de que eles estão vestidinhos, quando entro no vestiário dos meninos para a primeira reunião de futebol do outono. O treinador bate nas minhas costas quando passo, assim como ele faz com os caras.- Está pronta para o último ano, Albuquerque?
- É o primeiro dia de férias de julho, treinador. Deixe-me aproveitar.
- Não aproveite demais. Trabalhe duro nestas férias na prática e naquele campo de futebol da sua casa, porque espero uma temporada vitoriosa quando voltarem das férias.
- Vamos enfrentar o Estadual pela primeira vez em quatro anos, treinador! - um dos caras grita. Suas palavras são recebidas com gritinhos entusiasmados do resto do time, incluindo o meu. Quase chegamos ao Estadual na semana passada, mas perdemos nos acréscimos.
- Tá, tá, tudo bem. Mas não se precipitem. Vamos voltar para os negócios primeiro. É a época do ano de votar em quem você considera o jogador que mais merece liderar essa equipe. Pensem no jogador cujo talento, esforço e dedicação ao time são inegáveis. O jogador que receber mais votos será escolhido como capitão da próxima temporada. - Tenório diz olhando para todos.Ser eleito capitão é uma grande coisa na minha escola. Há um bando de clubes e de times de esportes, mas um conta: o futebol. Olho orgulhosamente meu namorado, Gustavo Terra. Ele será candidato a capitão. É o primeiro atacante do time e espero que ele nos lidere no campeonato brasileiro de escolas.
Seu pai foi o atacante número 1 quando estudava aqui, e o Gu está preparado para seguir seus passos. Não foram poucas vezes na última temporada que o pai de Pedro até trouxe olheiros da Liga de Campeonatos da Sub-20 para ver seu filho. Com seu talento e seus contatos, não há dúvida de que ele vai conseguir uma vaga no time da Sub-20.
Começamos a namorar no início das férias de dezembro, pouco depois do treinador me mudar para a primeira zagueira. Aperfeiçoei a técnica ao longo dos tempos. Os caras do time iam sempre me ver treinar e ficavam apostando em quantos gols eu faria numa rodada.
Eu costumava ter receio de ser a única menina do time. No primeiro ano fiquei no fundo, esperando me integrar. Os caras faziam perguntas que me intimidavam, mas eu ria deles e respondia na lata. Nunca esperei consideração especial e lutei para ser tratada como qualquer outro colega de time, que por acaso era menina.
Tenório usando sua calça preta de marca registrada e camisa polo da mesma marca da calça, me entrega um papel. Gustavo acena pra mim. Todo mundo sabe que estamos namorando, mas mantemos o relacionamento discreto durante os treinos. Escrevo o nome de Pedro no papel e então o entrego. Tenório segue para nossa brutal agenda de treinos enquanto os treinadores assistentes contam os votos.
- Não se ganha jogos com a bunda na cadeira. Além do mais, esperamos atrair mais olheiros da Sub-20 este ano. Sei que vários de vocês gostariam de jogar no campeonato Sub-20. Meninas e meninos, este é o ano de vocês se exibirem.
Tenório não diz o óbvio, mas os olheiros estão vindo para ver o Gustavo, mas todos nos beneficiamos com a presença deles.
Seria incrível jogar no campeonato Sub-20, mas não tenho ilusões de que olheiros vão bater à minha porta. Só algumas garotas foram escolhidas para jogar nos times de cidades, e quase todas entraram, mas saíram logo depois. Exceto a Marta. Ela é considerada a melhor jogadora de futebol do Brasil. Eu faria qualquer coisa para ser como a Marta.
Assisto futebol com meu pai desde que me entendo por gente, e pra melhorar ainda somos do mesmo time. Ele foi um zagueiro para o Colégio Santa Mônica há vinte anos, o primeiro e último time da nossa escola a ganhar o campeonato estadual das escolas. O banner solitário do campeonato está pendurado na parede do ginásio.
Acho que ter ido para o futebol foi uma forma de eu tentar me conectar com meu pai ... Talvez, se ele me visse chutar gols o bastante, ele ficasse impressionado. No último campeonato que teve de escolas públicas e particulares, esperei que meu pai viesse assistir aos jogos e me animar. Ele nunca fez isso, e ainda não fez, minha mãe também nunca me viu jogar. Acho que ela está morando em algum apartamento em Nova York, mas não tenho notícias dela há quase um ano. Um dia vou mostrar aos meus pais o que eles estão perdendo, porque é um saco sentir que sua família nem se importa se você existe.
Sorte que eu tenho o Gustavo.
Conforme Tenório segue com seu grande sermão, um dos treinadores assistentes passa a ele o resultado dos votos. Ele lê o papel silenciosamente, aprovando, então escreve no quadro:
CAPITÃ ALICE DE OLIVEIRA ALBUQUERQUE
Espere ... o quê?
Não ... Li errado
Pisco algumas vezes enquanto sinto, nas minhas costas, batidinhas dos meus colegas.
Meu nome está escrito claramente, não há dúvida disso. Paulo Abreu, um dos nossos meio de campo, dá um grito:- É isso ai Albuquerque, espero que não nos decepcione! - Paulo diz gritando.
Os outros caras começam a gritar meu nome:
- Albuquerque! Albuquerque! Albuquerque! - todos os caras do time começam a gritar.
Olho para o Gu, ele está olhando para o quadro. Quero que ele olhe pra mim, me dê os parabéns ou me faça sentir que está tudo bem.
Não está, sei que ele está arrasado. Estou também. Sinto que a terra acabou de parar. Tenório apita:- Albuquerque, me encontre na minha sala. O resto de vocês está liberado.
- Parabéns Ali. - O Gustavo fala, quase sem parar, quando passa por mim na saída. Quero puxá-lo de volta e dizer que não tenho ideia de como isso aconteceu, mas ele vai embora antes de eu ter uma chance.
Sigo para a sala de Tenório.
- Parabéns, Albuquerque - ele diz enquanto joga um emblema com a letra C, para eu costurar na minha jaqueta. Outro vai ser costurado no meu uniforme de jogo. - A partir de julho você vai ter reuniões semanais comigo e com a equipe de treinamento. Vai ter que manter sua média acima de 6.0 e continuar a liderar essa equipe no campo e fora dele. O time está contando com você. E eu também.
- Treinador .. - digo, passando os dedos sobre o bordado liso do emblema. Eu o coloco na mesa e me afasto. - o Gustavo merece ser capitão, não eu. Vou sair dessa e deixar que ele tome meu... - Tenório se levanta:
- Pare aí, Albuquerque. Você foi eleita capitã, não o Gustavo. Você teve mais votos do que qualquer outro jogador. Não respeito jogadoras que desistem quando pedem que eles tomem a frente dos seus namorados. Vai amarelar?
- Não. - Ele joga o emblema de volta pra mim.
- Então saia daqui.Concordo, então saio da sala dele. Voltei para o vestiário, encostei no meu armário e olhei o emblema com o grande C de Capitã. Respiro fundo enquanto assimilo a realidade. Fui eleita capitã do time de futebol. Eu, Alice de Oliveira Albuquerque. Sinto-me honrada e grata aos meus colegas de equipe que votaram em mim, mas ainda estou em choque.
Espero que o Gu esteja lá fora me esperando, ao lado do meu carro. Mas quando saio do vestiário e vou para a rua, dou de cara com o Victor e com o Gabriel na frente do meu New Beetle preto, que precisa de uma nova pintura.. e um novo motor, por sinal.
Victor nosso 2° zagueiro, que conseguiu parar mais atacantes do que qualquer outro nessa escola. Seu pai é praticamente é dono do colégio e Vic espera fazer tudo o que ele ordene. Por trás das costas do pai, Vic é impulsivo e ousado. É como se ele não se importasse em viver ou morrer, motivo pelo qual é tão perigoso no campo.
Gabriel coloca um braço no meu ombro:
- Você sabe que o Leal Brasil vai fazer a festa quando descobrirem que seu rival está prestes a ter uma capitã menina. Aqueles gays tacaram ovo na casa do Felipe Abreu no dia em que ele foi votado capitão no ano passado, então nos vingamos e enchemos de durex a casa do capitão deles. Fique de olho, Ali. Quando a notícia se espalhar você será o alvo.
- Eu te defendo. Já que o boiola do teu namorado não está aqui. - Vic diz e eu rio.
Alvo? Estou convencida de que posso com ser um alvo. Sou forte, corajosa, e ninguém vai me botar medo. Eu não desisto. Sou capitã do time de futebol do Colégio Santa Mônica do Rio de Janeiro.
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Amor Em Jogo!
RandomSABE AQUELAS FASES DA VIDA EM QUE TUDO PARECE DAR ERRADO? MIGUEL E ALICE SABEM MUITO BEM COMO É ISSO. Miguel acabou de ser expulso do colégio interno em que estuda desde que seu pai foi convocado pela Marinha. As coisas vão de mal a pior quando rec...