"O amor é um grande laço,um passo para uma armadilha" (Djavam)
João Firmino dos Santos, vulgo "Nego Pena" , era um mulato de um metro e oitenta, com seus noventa e dois quilos aproximadamente. Sempre de sapatos brancos calça social de linho e camiseta pólo da lecost, e, vez ou outra, vestia-se com um bleizer, estilo capitão de navio. Em seu chapéu de feltro com abas estreitas, que o tornava semelhante a um gangster de nova York dos anos quarenta, lá estava a dita cuja a lhe conferir a alcunha: uma pena de seu papagaio de estimação.
Seu "cartão de visitas" era seu cavaquinho que o acompanhava às rodas de samba no bairro do bexiga, lá no Café Piu-Piu, ou aos demais redutos de samba e boemia que apareciam de improviso.
Nego Pena era um mito, tanto para os amigos que o admirava por sua versatilidade, ou para mulheres a se enamorarem com seu sorriso
O mesmo sempre tinha um verso preparado para "engatilhar" aos acordes de sua "arma": o cavaco, isso de acordo com a situação, ou a musa que lhe observa-se. Nestes momentos de magia musical todas sorriam e imaginavam-se pretendidas pelo "Ébano Colossal".
A cada verso lançado ao léu, a cada sorriso captado em meio à desenvoltura de sua voz de barítono, mais seu ego de Don Juan era alimentado. Todas eram dele e ele a nem uma pertencia.
Certa feita, Nego Pena fora convidado a um pagode em um bar no bairro da Liberdade, reduto da colônia japonesa e demais orientais em São Paulo, sem saber o coitado, do laço que o destino lhe preparava. Em meio àquela Saturnal, Nego Pena conheceu Miury Sakamoto, e quando à viu em meio a um refrão do pagode, sua voz embargou, a corda "mi" quebrou, seu dedo indicador enroscou-se entre a corda "ré" e a "sol" , foi então que o sarau teve de ser interrompido.
Ninguém de momento assimilou que a tez de papel de arroz, os cabelos negros como uma noite sem luar no Monte fuji a lhes escorrer até às panturrilhas, mesclados com os olhos cor de mel daquela nissei, um paradigma na mente de nosso herói: "o terror" das mulheres enamoradas estava em processo de metamorfose!
Hoje, quem o vê com duas crianças: Junior de dez anos e Sayuri de nove, ao lado de dona Myuri Sakamoto, agora acrescido o " Santos", encaminhando-se ao templo budista no bairro da Liberdade, não imagina que aquele andar meio gingado do Juninho fora uma herança do pai, João Firmino dos Santos, "ex-Nego Pena, que hoje, depois de ter dado "um passo para a armadilha do destino", tornara-se o Senhor João, ou como é mais conhecido na comunidade nipônica, João san ou Kokojin-san.
E assim, todos os sábados eles são vistos entrando no templo em busca da sintonia com o universo através de sua Sutra:
"_ Nan-myo-hon-nangue-kyo-oho!"