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Quando meu pai disse "Vamos nos mudar." eu fiquei um pouco em choque. Eu estava no meio do ano, tinha programado as minhas ferias que iam começar dali a um semana, pra passar na casa de praia da Suzi. E, mudar para onde? Sair da nossa casa com piscina, no centro da cidade, pra ir morar aonde? E quanto ao Antônio? Como eu iria embora, pra longe dele? Como eu sobreviveria sem ve-lô todos os dias? Sem poder beija-lo? Olhei pro meu irmão, Charles, que tem 22 anos e cursa ciências contábeis na universidade municipal de margarida do norte. Como ele ia deixar a faculdade? Ele tinha ganhado bolsa. Ele trabalhava já. Como meus pais podiam fazer isso com ele? Que ele largasse tudo pra segui-los sei lá pra onde. E quanto a mim? Como podiam me informar assim, no meio dum jantar de sexta-feira que eu teria que me separar do amor da minha vida? Tudo bem que eles ainda não sabiam. Mas tudo já estava certo pra ser formalizado nos próximos dias. Olhei pra minha mãe, que estava sorrindo. Eufórica. Sempre quis sair de Margarida e agora, tinha seu sonho realizado. Eles nunca pensam na gente. Só neles.
"Você vai adorar a cidade Nanda." Ele continuou. Olhei pro Charles de novo, ele olhava pras ervilhas, parecia constrangido. Dai eu entendi por que o pai tinha falado que eu ia gostar. Charles não ia. Arregalei os olhos, marejados, e um soluço escapou. Charles me olhou e engoliu em seco. Depois olhou pro pai. Eu juro que não sou uma adolescente difícil. Não falto aula, não fumo, não bebo e ainda sou virgem. Não faço escândalo e uso roupas que a minha mãe gosta. Mas naquele momento eu me senti traída e com vontade de gritar. Senti um gosto ruim na boca pensando em tudo que eu ia perder indo embora. Minhas amigas arrumariam outras amigas, meu namorado acharia outra namorada, meu grupo de livros ia me substituir. Tudo. Eu ia perder tudo. Minha mãe disse "Você vai adorar lá. Tem praia e vamos morar bem pertinho dela." Olhei pra ela incrédula. Ela não podia achar isso uma vantagem. Ela continuou "Charles vai continuar aqui, por causa faculdade. E sempre que for possível vamos visitar a cidade." Olhei pra ele novamente que me olhava e sorria fraco. Me levantei, afastando o prato quase cheio. "Com licença" eu disse "vou ao banheiro". Lá em casa, nem de longe somos tão formais. Mas queria que eles vissem que isso era difícil pra mim. Subi pro meu quarto e passei a chave. E dai chorei. Muito. Adormeci e nem me dei conta.

Andando Sobre NuvensOnde histórias criam vida. Descubra agora