Talk Me Down

48 3 3
                                    

Lá estava eu, sentada no altar de uma igreja, olhando a mesma se esvaziar aos poucos, apenas eu e algumas das minhas poucas amigas permaneciam. O meu vestido se espalhava a minha volta em camadas e mais camadas de pano branco, o véu com seus detalhes em renda em minha mão já não era assim tão bonito como me pareceu quando o coloquei. Nada parecia tão bonito como da primeira vez.

Observei enquanto a última pessoa saía da igreja com um olhar frio. Eu não deveria estar chorando? Fui abandonada no altar, então por que não sinto nada? Por que não vem a tristeza ou a dor? Por que não sinto nada?

Bufei olhando para cima, as pinturas dos anjos pareciam rir de mim, como se já soubessem que aquilo iria acontecer e como aquele amigo chato que você não consegue ignorar diziam, eu te avisei. Voltei a olhar para frente, para o outro lado da rua, para um outro carro, para uma outra igreja.

Me levantei.

Eu sabia que era hoje. Eu não era a única pessoa que se casaria naquele dia. Havia um outro alguém, um antigo amigo, talvez o motivo de eu não estar chorando, e com toda certeza o motivo de eu não estar casada naquele momento.

Caminhei pelo corredor, agora sem um mar de olhos me seguindo, o véu caindo de minhas mãos na metade do caminho, meus pés ansiosos por chegar mais perto, os olhos querendo ver mais detalhes dele, minha mente me questionando por que eu fui tão idiota de tê-la ouvido novamente.

Parei no topo da escadaria e me apoiei em uma das pilastras que ali estavam, minha irmã mais velha e minha melhor amiga vieram logo atrás. Elas sabiam. Elas também viam. Elas souberam o tempo todo o que eu me recusei a aceitar. E agora estavam ali, os anjos zombeteiros do teto da igreja me olhando pelos olhos delas.
Segurei a respiração quando a porta do carro preto se abriu.

Primeiro saiu a mãe, vestida em um simples vestido azul, sua cor favorita, os cabelos curtos soltos pela primeira vez em anos depois da morte do marido, um sorriso que a tempos não era visto. Ali estava não só uma mulher que casaria o filho naquele dia, mas também minha segunda mãe, a mulher que cuidou de mim e de minha irmã quando a minha própria resolveu que não conseguiria viver uma vida de dona de casa e fugiu.

Por meros segundos seus olhos castanhos olharam direto para onde eu estava parada em meu campo de observação. Primeiro seu rosto demonstrou surpresa, em seguida pena contida e por último, compreensão e um toque daquela mesma coisa que todos pareciam dizer. Por fim se inclinou para dentro da porta aberta do carro, disse algo e entrou por dentro da outra igreja sem esperar ninguém, nem mesmo olhar para trás.

E então, mais alguém saiu do carro. Os cachos castanhos lhe caiam em volta do rosto sério, o terno preto lhe caía bem, destacava ainda mais o verde de seus olhos, o rosado de seus lábios bem desenhados. Suas mãos fecharam a porta do carro e passaram então a fechar um único botão de seu terno, bagunçou os cabelos como eu ainda me lembrava e finalmente, depois de segundos que pareceram milênios, olhou para mim.

Ele não sorriu e nem piscou para mim como fazia antigamente, apenas ficou ali, me encarando sem nem ao menos se mexer. Apenas me olhou e olhou, sabendo muito bem que não precisava de palavras para saber o que estava na minha cabeça, ele sabia o que eu via enquanto o olhava. Ele teria sido meu maior acerto, se não tivesse sido meu maior erro.

Soltei meus braços e me afastei de onde eu estava escorada na pilastra, tentei andar para descer os degraus, mas minhas pernas tremiam, eu estava paralisada, era a primeira vez que nos víamos depois que eu percebi, depois que eu vi o erro que cometi.

Respirei fundo e dei um passo vacilante em direção a um degrau, minha irmã tentou me ajudar a seguir em frente, mas a dispensei, não queria mais testemunhas daquilo, já era humilhação demais ter de encara-lo e saber que ele estava certo. Era como se todas as palavras que foram ditas por ele naquela noite voltassem e ficassem rodando e girando dentro da minha cabeça. Ele disse que eu iria entender quando fosse tarde demais. E eu entendia, mas não queria aceitar.

I Love You, I Lost YouOnde histórias criam vida. Descubra agora