A linha de Pilar - Do choro ao desastre

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― Tchau Vó!

― Tchau minha filha! – Respondeu uma senhora na cozinha enquanto lavava a louça, sem nenhuma certeza de que a neta tivera ouvido.

Ísis estava certa, Pilar não escutou sua gentil despedida, pois já estava praticamente do lado de fora do apartamento, aguardando ansiosamente a chegada do elevador.

Certamente deve ser a vizinha do 103, ela não sabe usar um simples elevador! Pensou chateada. Era comum presenciar outros moradores pressionando o botão de descer, acreditando que assim o elevador desceria. Isso a irritava profundamente, mas ao mesmo tempo lhe dava um gostinho de superioridade. Povo burro, sua mente dizia.

Em letras miúdas, na tela fixada no canto direito do elevador, o relógio marcava meio-dia e quarenta e sete. Devem ganhar muito dinheiro mesmo, não há lugar melhor para colocar propaganda, o que mais se pode fazer aqui a não ser olhar para esta tela? Se questionou, tentando esquecer o atraso.

Ela precisava se acalmar, pois não era a primeira e não seria a última vez que se atrasaria para o trabalho, logo não havia motivo para nervosismo. Mas o mantra mental não funcionou, saindo do elevador, ela correu em direção ao carro e partiu rumo ao trabalho em alta velocidade. Uns três ou quatro quase possíveis acidentes depois, ela chegou ao destino.

Pilar trabalhava na coordenação de vendas de uma agência de viagens localizada no segundo maior shopping da cidade de Belo Horizonte. Emprego este que lhe deu uma vida estável e uma rotina ligeiramente tranquila ao lado de sua vó Ísis.

Ao chegar ao trabalho, um pouco suada pela correria e o trânsito, ela tratou de registrar sua entrada calculando mentalmente seu atraso. Terei que ficar alguns minutos à mais hoje! Que chatice! Ao menos pegarei menos transito! Tentou ser otimista, logo após a lamentação.

Ou era isso, ou ter ainda mais descontos no próximo pagamento, o que ela não estava nem um pouco afim que ocorresse novamente.

A agência ficava no terceiro andar do shopping, ao lado de um famoso salão de beleza da cidade. Senhoras elegantes e bem trajadas costumavam sair de lá e ir na agência para planejar a próxima férias em família.

Esta loja inaugurou no país o conceito de vendas de pacotes turísticos através da experiência de imersão. O atendimento ao cliente era realizado em mesas temáticas, uma para cada um dos principais pontos turísticos dos seis continentes, incluindo alguns injustiçados e outros esquecidos.

Aquele projeto fez as vendas aumentarem em quarenta e dois por cento em menos de seis meses, além de causar a promoção de Pilar de uma simples consultora de vendas à coordenadora geral da filial. Este era um dos poucos orgulhos da mulher, e a maior causa de inveja dentro da agência.

― Pilar, a central ligou perguntando por você à dois minutos! – Exclamou Ângela com pouca simpatia.

― Está bem, irei retornar, obrigada! – Respondeu tentando disfarçar o nervosismo.

Justamente no dia que eu me atraso esse pessoal da central lembra que nós existimos! Pensou com preocupação e ligeiramente chateada.

Ângela era consultora de vendas, assim como a coordenadora deixara de ser, mas como ela é a única que se incomodava com o toque do telefone da agência, acabava também sendo um pouco a secretária de Pilar, e isto não a deixava nem um pouco satisfeita.

Ao sentar em sua poltrona, extremamente confortável, diga-se de passagem, ela relaxou um pouco procurando forças para retornar à ligação.

― Olá Jorge, boa tarde. É a Pilar, aconteceu alguma coisa?

― Boa tarde Pilar, obrigado por retornar, mas agora eu já resolvi. – Falou um pouco seco, preparando para desligar.

― Por nada, dis...

Caos no TempoOnde histórias criam vida. Descubra agora