O Iornovólio

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Não havia bênção terrena a se comparar a tal felicidade. Era como se fosse a primeira vez novamente. Meu estômago revirava como nunca e meu sorriso esboçava um olhar intenso e fraturado de delicadeza.

A respiração dançante tornava-me uma pequena máquina de suspiros involuntários e o cambalear firme por sobre os limites do vestido erguiam-me imponentemente.

Embalada por uma canção matrimonial, coreografava meu destino deveras sentido e planejado.

Tomei suas mãos com fervor e, num beijo, consumi-lhe a partidão da alma.

Caminhamos num desejo lento e simplesmente a mais que efêmero, a ignorar a inexistência de outro alguém que estivesse ao nosso redor.

Passos meus eram o ecoar que tanto se ouvia sobre o piso cavernal e íngreme da montanha.

Rumo ao início de uma nova era, pusemo-nos a passear o descer das estradas, numa comutativa de carinho e regozijo.

Por que anoiteceu tão de repente?

Quando todo o calor da felicidade se foi, percebi o quão o clima estava gelado.

Acordei mergulhada em escombros. O fel sangrento amargava-me a boca e instigava-me à lucidez fulgaz. Agitei-me e desvencilhei-me das ferragens. Num único e exclusivo objetivo, chacoalhei seus ombros.

Não houve resposta.

Engoli em seco e empalideci ante à situação. Agarrei seus cabelos e puxei-os, numa tentativa de despertar-lhe através da dor.

Inerte.

Apercebi-me da hemorragia em seu pescoço enegrecido e pousei dois dedos sobre a sua jugular. Não havia pulsação.

Revirei-me à procura de um objeto perfuro-cortante e, num ato de desespero, arranhei-me próximo ao globo ocular. Cheguei a uma conclusão: precisava somente de minhas mãos.

Com agressividade, forcei minhas unhas sobre seu pescoço, buscando realizar uma traqueostomia improvisada, no entanto, tudo o que consegui foi uma dor lancinante ao partir a unha ao meio, dor esta que logo foi amortecida pela adrenalina.

Forcei novamente a posição pontiaguda, desta vez utilizando somente uma de minhas unhas, esperando que a Física me favorecesse.

O sangue jorrou lentamente, o que evidenciava a presença de um coágulo ou de algo ainda pior: a ausência de batimentos cardíacos.

Corri novamente os trêmulos dedos sobre sua jugular. Não havia sinal de vida.

Deitei-me ao seu lado e derramei pesado pranto. Seu olhar gélido feria-me a alma. Como pôde a vida ser tão injusta?

— Ainda há como reavê-lo — virei-me para trás, a fim de encontrar a origem da voz desconhecida — Basta que o ame o suficiente.

— Não consigo enxergar-te, por favor, ajude-me! —berrei entre soluços.

— Sou um Iornovólio, pequena humana — continuou — Sou o cavaleiro da morte.

Meu sangue esquentou-me as orelhas.

— O que faço!? — interpelei em sofrimento.

— Você iria dos céus ao inferno para buscar aquele que ama?

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⏰ Última atualização: May 07, 2016 ⏰

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