CAP 1

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Lily:
Presa em meu quarto vivendo na solidão da minha dor, eu via as nossas fotografias como se saber que um dia estivemos juntos, diminuísse o grande vazio que Ettore deixou em meu peito
- Filha! Abra,por favor!  - Meu pai me chamava batendo na porta de meu quarto.

- Está aberta. - Falei sem ânimo nenhum.

Ele entrou no quarto silenciosamente, e sentou - se ao meu lado na cama, acariciando os meus cabelos.

- Filha já se passaram três meses após o ocorrido, e eu estou muito preocupado com você. - Fez uma pausa. - Você está grávida, e não pode abater - se desta maneira. Não fará bem para você, e nem para o bebê. Você está definhando trancada neste quarto, e eu não aceito que você se deixe afundar desta forma! Erga - se! - Disse com firmeza.

- Quando castelos desabam, não é tão fácil assim reerguê-los meu pai. - Comprimi os lábios.

- Não faça apenas por você. Faça por esse bebê! Faça pela memória do meu genro,faça por mim. - Beijou a minha cabeça. - Se ele estivesse aqui, tenho plena certeza de que ele iria querer a sua felicidade. - Aconselhou - me.

- Tudo bem. Eu vou tomar um banho. - Baixei a cabeça.

- Ok. Eu e Sam te esperamos na sala. Ela comprou o enxoval do seu irmãozinho,e quer te mostrar tudo. Ah, e se prepara que tem muitos presentes para o nosso netinho, ou netinha hein?! - Sorriu.

Forcei um sorriso.

Enquanto Sam estava com exatos sete meses de gravidez, eu estava com três meses.

Três amargurados meses de saudades, e muita dor. A dor da perca.

A minha única felicidade, era saber que dentro de mim havia um pedaço de Ettore,e a prova de que tudo que vivemos foi recíproco.


Tomei um banho, vesti um vestido florido, e desci para comer alguma coisa.

Sam estava na sala super animada mostrando o enxoval do bebê para algumas amigas.

Tomei um pouco de leite com algumas bolachas, e após terminar, fui até ela.
Beijei a sua testa, e ela sorriu.

- Que bom te ter aqui. - Beijou as minhas mãos com carinho.

Nos abraçamos.

Algumas lágrimas passearam pelo meu rosto.

- Não fica assim. Essa tempestade vai passar. - Acariciou o meu rosto enxugando as minhas lágrimas.

- Então, quer ver as coisinhas do bebê? - Perguntou.

Assenti com a cabeça.

Após ver o enxoval do meu irmãozinho ou irmãzinha ,peguei a minha bolsa e fui até a porta.

- Onde você vai? - Papai perguntou.

- Deixa a menina, Olavo! - Samantha retrucou.

Saí em silêncio.

Fui até a casa de dona Marta.

Todos estavam desolados, e o silêncio pairava por todos os cantos da casa.

Catarina me chamou até o quarto de Ettore, e logo trancou a porta.

- Por que me trouxe aqui? - Perguntei.

- Tem algo que Ettore me pediu para te entregar após.. Você sabe! - Ela disse abaixando - se, e tirando uma  caixa de madeira de tamanho médio, que estava em baixo da cama.

- O que é isso? - Perguntei confusa.

- Uma prova de que o meu irmão sempre estará com você. - Sorriu, e me abraçou em seguida.

Lily:
- Do que se trata? - Perguntei curiosa.

- São cartas que o meu irmão escreveu para você ao longo da doença. Ele me pediu para te entregar,e disse que você lesse conforme as datas. - Catarina respondeu.

- Obrigada. - Arfei.

Nos abraçamos,e ela abaixou - se e beijou a minha barriga em seguida.

Guardei a caixinha de madeira dentro da minha bolsa, e Cat me acompanhou até a sala.

- Até mais. - Comprimi os lábios.

- Até. - Ela forçou um sorriso.

Saí andando de volta para a minha casa.

- Lily! Espera! - Dona Helena gritou.

- Oi? - Virei - me rapidamente.

- Fica mais um pouco! Quero conversar com você. - Ela disse.

- Bom, é que eu estou um pouco cansada. Pode ser em outro momento? - Perguntei.

- Sem problemas! Eu te acompanho até a casa de seu pai. - Insistiu. - Conversamos, e de quebra você ganha uma carona. Tudo bem? - Perguntou.

Assenti com um gesto de cabeça.

Entrei naquele carro, e senti um desconforto tremendo.
Talvez por dona Helena nunca ter sido a sogra perfeita, ou ao menos a sogra boazinha da história.

- Então Lily, como você está? - Perguntou.

- Péssima. - Respondi de cabeça baixa.

- Multiplique a sua dor por dez. Esta é a minha dor! - Fez uma pausa. - Sabe, ás vezes eu penso que tudo não passou de um pesadelo. Penso que vou acordar, e ver o meu filho tomando café da manhã feliz ao lado dos irmãos, e em seguida preparando tudo eufórico para a escola, as aulas de ballet, e fazendo grandes planos para o futuro... - Me disse olhando para a estrada enquanto dirigia.

Respirei pesadamente.

O silêncio pairou entre nós.

- E a gravidez? - Perguntou.

- Já faz algum tempo que não vou ao médico, mas acredito que esteja bem. - Respondi.

- Acredita que esteja bem? - Me olhou com um olhar de crítica.

A encarei por alguns instantes, e depois desviei o olhar.

- Não se preocupe. Ele está bem. - Falei.

- Olha Lily, você é bem jovem,bonita, tem um futuro brilhante pela frente, e ainda não tem maturidade o bastante para saber o que é ser mãe. - Ela disse.

- O que está querendo me dizer com isso? - Arregalei os olhos.

- Na verdade, estou querendo lhe lançar uma proposta. - Respondeu.

- Proposta? - Arfei.

- Sim. Me dê o bebê, que eu e Estevão iremos registrá-lo,e cuidar dele como nosso filho, mas sempre iremos dizer para ele quão maravilhoso era o pai dele! - Sorriu levemente.

- A Senhora tem noção do que está me propondo? Dar o meu filho para você como se ele fosse um objeto? - Bufei.

- Estou apenas lhe propondo algo vantajoso. Se esta criança ficar comigo você poderá voltar para os Estados Unidos para recomeçar a sua vida, conseguir boas oportunidades como bailarina, cursar uma faculdade, e até conhecer um rapaz bacana. Pensa bem! Você não saberá dar para essa criança, a educação que o meu filho gostaria de dar para o filho dele. - Disse descaradamente.

- A Senhora está dizendo que eu não vou saber cuidar,e educar o MEU filho? Sinceramente! Quando penso que já ouvi de tudo, a Senhora me surpreende! - Bufei. - Pare esse carro! Eu quero descer! - Falei.

- Não. - Fez cara feia.

- Pare esse carro agora, ou eu me jogo! - Falei entre dentes.

Ela revirou os olhos, parou, e eu desci do carro.

- Pensa na proposta. Não seja cabeça dura! - Insistiu.

- Passar bem. - Bati a porta,e saí sem olhar para trás.


Lily:
Fui para casa furiosa com a audácia de dona Marta.

Entrei sem falar com ninguém, e fui para o meu quarto.

Tranquei a porta, sentei - me na cama rapidamente,tirei de dentro de minha bolsa a caixinha que Catarina havia me dado, e pus todas as cartas que Ettore havia me escrito sobre a cama.

Em cada envelope havia uma pequena descrição, digamos assim.

As quatro primeiras muito me chamaram a atenção.

Abri a primeira que mais parecia um pequeno bilhete, e dizia:

•Primeira semana sem mim.
Meu amor..
Deve está doendo muito, eu sei! Mas lhe peço que não chore, nem sofra por mim.

Pois á estas horas, certamente eu estarei muito feliz ao lado de meu pai, e não quero de forma alguma, que a pessoa que eu mais amei em minha "passagem" pela terra, esteja infeliz.

Te amo,
Ettore.

Enxuguei algumas lágrimas que já haviam se formado em meu rosto enquanto eu lia, e abri a segunda carta.

•Primeiro mês sem mim.
Eu sei que aí dentro tudo ainda dói. Dói muito!

Talvez por ainda estar muito recente, ou por simplesmente parecer que tudo acabou de forma repentina, inesperada.

Sei também, que não fez nada do que te pedi.

Talvez tenha se recolhido em sua dor e em sua solidão,ou simplesmente quis se distanciar do mundo.

Quero que saiba que eu não estou com você fisicamente, mas estou guardado em dois lugares muito melhores : Em suas lembranças, e em seu coração.

Saiba que muito te amei, e não admito que lembre de mim com lágrimas, e sofrimento.

Quem ama, quer ver o outro bem, feliz! E é isso que eu quero para você.

Ps: Sempre estarei com você..

Te amo,
Ettore.

•Segundo mês sem mim.
Parece que tudo perdeu o seu real sentido não é mesmo?

A vida está sem cor, você já não ver mais graça em nada,enquanto a vontade de viver e a depressão travam uma batalha,onde a depressão já deixou a sua adversária sem armas para lutar.

Aliás, você deve está se perguntando: Qual o propósito de viver um grande amor, e tudo acabar em um sofrimento que parece nunca ter fim?

Deus tem todas as respostas para as suas perguntas.
Que tal conversar um pouco com ele?

Te amo,
Ettore.

A próxima,

•Terceiro mês sem mim.
Meu amor, não se permita afundar!

O seu coração está tão apertado que você sente - se sufocada.

A saudade só aumenta cada vez mais, e as lembranças continuam mais vivas, que antes.

Não se deixe afundar!

Quando sentir saudades e quiser falar comigo, procure uma estrela no céu, e ponha nela o meu nome.
Fale para ela, tudo o que gostaria de me dizer. Eu estarei te ouvindo.

Seja onde for, ou como for, eu estarei sempre com você.

Te amo,
Ettore.

Após terminar de ler, fiquei sem ação por alguns instantes.

Pus as outras cartas de volta na caixinha, abri a janela do quarto, e já era noite.

Avistei algumas estrelas no céu, fechei os olhos,e senti a brisa bater em meu rosto.

- Etto, me ajuda á seguir em frente? É tão difícil.. - Falei chorando, olhando para uma estrela especificamente.

Fiquei conversando com aquela estrela por bastante tempo, até me sentir em paz.

Retalhos (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora