Capítulo 1

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Paris, primavera de 1968.

O jovem estava sentado em frente a enorme tela do cinema francês. Primeira fileira. O pescoço levemente inclinado para trás, tornando possível para ele ver a tela quase acima da sua cabeça.

As pessoas costumavam procurar as poltronas mais ao fundo, ninguém gostava daquelas poltronas. Elas são desconfortáveis e te deixam com torcicolo. Mas Gerard não se importava, gostava de estar ali, por mais que a coluna fosse reclamar mais tarde, sabia que era exatamente onde deveria estar. Os amantes da sétima arte se encontravam todos naquela parte. Pois sim, é claro que existe uma divisão especial até mesmo em uma sala de cinema, cada um tem o seu lugar ali, como em qualquer outro:

Os casais e aqueles que tinham companhia ficavam todos ao fundo, onde a visão da tela não era das melhores, mas eles pouco se importavam. Mãos e línguas mais interessadas em uma outra espécie de arte.

No meio estavam aqueles que estavam ali apenas por diversão e para passar o tempo. Geralmente em grupos de amigos. Cochichando entre eles durante a projeção, muitas vezes incomodando os outros, mas eles pouco se importavam de qualquer maneira.

E é claro, voltamos a primeira fileira. Onde estavam os verdadeiros amantes, deixando de lado os toques vulgares e barulhos estranhos para apreciar aquilo que realmente merecia ser apreciado: o filme bem a sua frente - ou quase acima de suas cabeças, que seja - O fato é que ali estavam os verdadeiros aficionados. Aqueles que respiravam arte, acima de qualquer coisa.

Era ali que Gerard estava, e ali que gostaria de permanecer pelo resto de sua existência. Mas a mocinha beijou o galã, e logo a luz se acendeu, permitindo que os espectadores tivessem mais segurança conforme deixavam a sala de cinema.

O rapaz foi um dos últimos a deixar a sala, esperando que essa estivesse completamente vazia, podendo assim sair com mais facilidade e aproveitar um pouco mais o cheiro estranho e tão familiar que aquele lugar possuía.

Estava em Paris a quase seis meses. Americano, vindo de Nova Iorque para aprimorar seus estudos artisticos em um pais que ele acreditava ser um dos mais inspiradores. E não estava errado. Seus meses naquela cidade estavam sendo ótimos. A primavera já havia começado, e o frio do inverno esquecido, dando lugar as folhas e flores coloridas pelos parques e calçadas. Os franceses eram sujeitos simpáticos, as vezes um pouco arrogantes, mas ainda assim conquistaram a simpatia do jovem.

Seu francês já era praticamente fluente, apesar do sotaque ainda ser bem forte. A verdade é que não convivera muito com as pessoas que ali moravam. Todos aqueles que costumava conversar eram senhores e senhoras simples, donos dos pequenos comércios da região, onde Gerard supria suas necessidades e se manter vivo.

Não trabalhava, os pais estavam bancando a viagem de dois anos. Era um burguês? Com toda certeza do mundo. Seu país estava em guerra e ele estava em Paris, aproveitando a boa vida francesa, enquanto alguns de seus colegas e conhecidos estavam sendo bombardeados no Vietnã. Se ele tinha orgulho disso? Não, com certeza aquilo não poderia ser definido como orgulho. Não gostava de violência, era completamente contra qualquer tipo de ataque, mas estava feliz em poder estar bem distante dos campos de guerra.

Assim que subiu as escadas do Cinémathèque se surpreendeu um pouco com a quantidade de pessoas paradas na entrada. Havia uma certa gritaria e pessoas amontoadas. Não estranhou completamente aquilo, já que sabia o que vinha acontecendo há algumas semanas no país. Jovens reinvindicando seus direitos. Boatos de que as universidades corriam risco de fechar, e até mesmo de uma possível guerra civíl entre o governo e estudantes corriam soltos entre as fofocas que Gerard costumava ouvir por acaso nas padarias e mercados. Sabia que aquilo não era impossível, mas evitava pensar nisso, mantendo seu o mais distante possível de debates políticos. Estava alí pela arte.

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⏰ Última atualização: May 12, 2016 ⏰

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