Recém chegada

27 3 2
                                    

  Hoje, 9 de abril, exatamente 20 anos desde que nasci, foi assim, abri o olho e pronto, estava aqui, foi a coisa mais fácil que já fiz desde então, mas hoje isso irá mudar. Deixei meu curso de Química, abandonei meu ex namorado Victor e talvez até tenha magoado minha mãe quando disse que queria voltar no lugar onde nasci.

Não sei direito o que houve para ela mudar logo de assunto quando pergunto, mas finalmente devo descobrir algo, mesmo que custe alguns sacrifícios.

Já estava na hora, desci de meu apartamento sentindo saudades antecipadamente, descia com a mão no corrimão olhando atentamente degrau por degrau.

Abri a porta e me sentei na poltrona traseira do táxi que já estava em meu aguardo.

—Para o aeroporto Trindade, por favor. -Pedi com um tom amigável ao taxista, era meu amigo desde os 7 anos, admiro sua lealdade ao pai em assumir o posto na mesma profissão, mesmo que não o agrade, fez por sua família. Eu até tentei ser assim, mas infelizmente falhei em menos de 3 anos.

—Chegamos, foi 25. -Falou em um tom arrogante. Sempre tentei entender o fato que o fez se afastar.

Paguei e em seguida dei uma leve corrida, meu avião já estava preparado, senti deixar grande parte de minha vida naquele aeroporto, mas também iria descobrir outra parte. É complicado descrever a rajada de sentimentos que surgem, é como se fosse um vendaval que contém ansiedade e medo e em outro minuto realização e desejo.

Talvez tenha passado despercebido, mas não poderia existir um presente como esse para um dia tão importante. Alguns parabéns que não recebi nem se comparam com os parabéns que irei receber no futuro.

Deixei meus pensamentos de lado e tentei relaxar na poltrona, olhar tudo de cima é uma sensação única, como se fôssemos agraciados com o poder de ter asas tal como um belo anjo da guarda, que nos vigia do alto.

No meio de tanta reflexão não percebi o tempo passar, quando me dei conta estava em terra novamente.

O lugar parecia agradável, mas logo me desiludi quando soube que teria que usar uma carroça até chegar a meu destino, Helenth. Tudo o que eu tinha comigo era uma caixa que minha mãe duramente me cedeu, havia algumas cartas, fotos e um colar com um desenho estampando um elefante olhando para o céu. No canto esquerdo achei uma pequena agenda, separei do local e guardei em minha bolsa, talvez aquele seria o objeto mais valioso em minha jornada.

Segui em frente até uma pequena loja de louças, tentei conseguir algumas informações de como chegar até alguma carroça, desanimei ao saber que precisaria esperar trinta minutos até a próxima chegar.

—A moça não é daqui! -Dizia a balconista apontando em minha direção soltando um sorriso de canto.

—Tem razão, não sou daqui, mas nasci em Helenth.

—Se não for atrevimento me responda, voltou por qual motivo? Uma moça tão bonita não deveria se enterrar nesse lugar tão cedo. -Arqueou suas sobrancelhas soando como um ar de curiosidade.

—Estou em busca de uma história. Da minha história. -Olhei para a vitrine, vi a carroça chegar, logo me animei por acabar ali o assunto. Tentarei não espalhar meu objetivo, quanto menos pessoas souberem, mais chances de dar certo terei.

—Foi bom conhecer você! -Me despedi da senhora que estava no balcão. Abri a porta e atravessei a rua de paralelepípedos em direção ao rapaz que conduzia os passageiros.

—Oi...é...vai até Helenth? -Perguntei olhando para o moço. Achei que iria ficar sem resposta, mas depois de alguns minutos ele resolveu fazer o favor de me responder.

—E por qual razão não iria? -Indagou-me com um tom seco, me olhava como se eu fosse uma criatura estranha, dos pés até a cabeça.

Evitei me estressar, sempre fui muito esquentada, mas se eu realmente desejo chegar até o fim sem me meter em encrenca, devo me tentar me calmar o máximo possível. Sentei-me no meio, ao lado de um senhor, ambos conversavam, pareciam se conhecer bastante. Ouvia o assunto quieta observando as casas, tinham modelos antigos, apresentavam um telhado pontudo com telhas aparentemente velhas.

Ao chegarmos retirei minha bolsa e pulei um pequeno degrau que existia sob a parte de baixo, sem querer acabo pisando em uma pequena poça de lama.

—Você não é daqui! -Disse o rapaz novamente me olhando estranho.

—Já é a segunda pessoa que me diz isso, eu estou deixando tão na cara que não sou dessas redondezas? -Falei limpando parte de minha calça suja com pequenas gotas de lama.

Para minha surpresa ele não respondeu, apenas voltou para a carroça, senti uma imensa raiva subir, odeio ficar sem uma resposta, mesmo que seja forçada, é melhor que nada. Deixei isso de lado e procurei algum abrigo, com muito custo encontrei uma casa que alugava quartos, não pensei duas vezes e fui logo garantir minha estadia.

Para minha sorte o quarto que batia o sinal em meu celular estava livre, não custava caro a diária, logo me acomodei e comecei a fuçar as coisas da caixa.

Em uma fotografia já amarelada em razão do tempo, havia uma enorme casa com uma plantação de café em volta, na porta existia uma mulher muito bonita com um cesto em suas mãos, poderia ser essa mulher minha vó ou talvez alguém que conheça.

Puxei outra fotografia, havia uma árvore com um senhor de idade em seu lado tinha um cachorro deitado, não sei como, mas sinto que já vi essa árvore antes, me surgia uma lembrança como se fosse um sonho, talvez esteja enganada e apenas seja meu cérebro tentando me enganar ou apenas o destino querendo pregar-me uma peça.

Juro por Deus que poderia sair agora mesmo em busca de respostas, mas infelizmente algo muito maior estava por acontecer em instantes...a chuva.  

20 anos.Onde histórias criam vida. Descubra agora