“Oh-Oh, hora da saída estratégica.” Era o que se passava na cabeça do professor Lockhart enquanto subia a passos apressados as escadarias do castelo. “Tenho coisas muito mais importantes com o que me preocupar do que monstros que pregam peças em alunos, não tenho?” Virou rapidamente o corredor, emparelhando as costas com a parede de pedra. Ouviu o ressoar dos saltos da professora McGonagall ao longe. Barra limpa! Permitiu-se soltar o ar preso nos pulmões enquanto alisava as vestes lustrosas com as mãos. Talvez fosse melhor dar um tempo até toda a confusão passar. Ah, como aquilo cansava sua beleza!
Com uma última olhadela conferiu se o caminho estava livre e dirigiu-se ao fim do corredor, ajeitando os cabelos. Sempre havia um banheiro ao lado das salas de aula e passar alguns minutos treinando seu belo sorriso em frente a um espelho era sempre uma boa ideia. Já estava com a mão na maçaneta do lavabo masculino quando um arrepio percorreu-lhe a espinha. Em um gesto mecânico tão destoante aos seus padrões graciosos, virou o pescoço na direção oposta. Ah não, ele reconhecia aquele banheiro. Era o banheiro da Murta.
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Era dia de prestar os NIEMs. O Salão Principal repleto de alunos estava excepcionalmente silencioso. O único ruído era o do arranhar das penas no pergaminho. Apesar do tempo destinado à prova já estar se esgotando, a maior parte dos alunos ainda se encontrava debruçada sobre as questões. Mas nenhum deles parecia riscar as respostas com tanto fervor quanto certa ravina de marias-chiquinhas.
Murta era a personificação da concentração. Os óculos garrafais escorregando para a ponta do nariz, a mão que escreve movendo-se sob incrível velocidade, parando apenas para molhar a pena no nanquim. As sobrancelhas vincadas e gotículas de suor brotando da testa. Era uma corrida contra o tempo.
Porém, quem observasse com maior atenção perceberia que a ponta de sua pena nem chegava a tocar a prova. Na verdade, sua folha já estava totalmente preenchida. Era como se a garota estivesse fingindo escrever por cima de suas próprias palavras. Enquanto isto, as palavras apareciam magicamente no pergaminho-resposta do garoto ao lado que nada fazia além de tentar admirar seu reflexo no pote de nanquim. Murta chamava sua invenção de “passa-resposta”. É claro que o único que sabia da existência do artifício era Gilderoy Lockhart, seu melhor amigo. Pronto, prova encerrada. Conseguiu colocar o último ponto bem na hora em que o professor Kettleburn recolheu a prova do amigo.
- Você é a melhor, Murta! – sorriu o garoto dando uma puxadinha de leve em uma de suas marias-chiquinhas. – O que seria da minha inteligência excepcional sem você para fazê-la brilhar?
A ravina nada respondeu, apenas sorriu sem graça. Sempre que Lockhart piscava perdia as palavras. Estavam quase deixando o salão quando um grupo de garotos passou correndo, esbarrando nela propositalmente.
- Murta feiosa!
Enquanto abaixava para recolher os livros derrubados, olhou de esguelha para o amigo esperando algum tipo de defesa. Mas o garoto parecia nem ter percebido o ocorrido. Observava seu reflexo nas paredes de mármore para ajeitar a gravata azul. Tudo bem, ele ficava tão lindo com aquele uniforme mesmo!
Já no jardim, cruzaram com um grupinho de lufanas.
- Olá, meninas! – piscou o garoto, provocando risinhos - Nymphadora, você está particularmente linda hoje!
- É Tonks, Lockhart! – respondeu, debochada. Mas o garoto já estava cumprimentando outro grupo de meninas.
- Sabe, Roy? – começou Murta, quase inaudivelmente – Você nunca disse que eu estava linda... Roy? Estou falando com você!
- Oras, Murtinha, você sabe que você é uma gracinha! – sorriu, puxando de leve sua maria-chiquinha. – Ei, Alice! Sabia que seu cabelo está esplendorosamente maravilhoso?