O Caos

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Duas pessoas bastante diferentes num espaço público, separadas por uma multidão de pessoas.

Por vezes não se apercebem conscientemente da presença do outro, no entanto o inconsciente sabe, a alma reconhece.

A pele arrepia sem razão, a respiração acelera, as mãos tremem, olha-se em volta para tentar decifrar o porquê do ocorrido e, neste momento, dois olhares encontram-se.

A divisão, que até aqui vibrava com um barulho ensurdecedor, quando ocorre contacto visual, torna-se completamente silenciosa.

Todo o mundo é suspendido, vivem somente pelo olhar, esse olhar que cativa, que faz tremer, que incendeia...

Por momentos surge a vontade de atravessar toda aquela multidão e deixar-se cair no braços da outra pessoa, porém nenhum se move. Encontram-se presos no tempo e, além disso, não se conhecem, não verdadeiramente.

E vivem assim, por olhares em público, em privado como se desde sempre se conhecessem.

Vivem com medo de viver, vivem ao rejeitar a vida.

São agentes secretos no seu pequeno mundinho, tendo missões secretas altamente confidenciais, da quais ninguém deve de tomar conhecimento.

O seu relacionamento é uma parceria, uma questão de trabalho. É isso que são, colegas de trabalho.

Cada um comparece nas reuniões, dá o que tem a dar, há uma troca de esforços, há colaboração entre colegas, isto para que se atinja a meta daquela respetiva reunião. No fim da transação apertam as mãos e cada um segue o seu caminho até que seja necessário colaborar novamente.

Ao longo do tempo vai-se mantendo algum tipo de contacto casual, isto claro atrás de portas fechadas, só mesmo para que não seja desconfortável quando tiverem que trabalhar em conjunto. Assim mantêm uma relação de conveniência, na qual cada um contribui com o que pode.

Não há laços mais profundos, não há demasiado interesse, tem de haver um controlo absoluto de emoções. Isto para que não haja sentimentos inconvenientes na altura em que um dos intervenientes seja despromovido e esta dupla não volte a trabalhar junta.

E é deste modo que grande parte das relações nos dias que correm são vividas. São parcerias convenientes porém temporárias, chega mesmo só a faltar um contrato de confidencialidade para que não existam situações infelizes no futuro.

Há medida que estas relações se apoderam do mundo, a conexão desaparece, os pactos do coração são substituídos por pactos irracionais de corpos.

Aqui reina a casualidade, conveniência, incerteza, temporalidade.

Aqui reina o caos.

The Life In MeWhere stories live. Discover now