Às vezes coisas estúpidas podem fazer um ser humano extremamente feliz.
Ele experimentou essa felicidade às cinco e vinte e três da manhã de uma terça-feira.
No exato momento em que o mostrador do despertador avançou de cinco e vinte e dois para cinco e vinte e três ele acordou sobressaltado de um pesadelo. Ainda atordoado olhou à sua volta e agradeceu por ver o ambiente familiar, nunca o branco do teto do quarto lhe pareceu tão bonito. Respirou profundamente e aos poucos se acalmou.
Mais calmo, tentou identificar o tema central do pesadelo e não conseguiu, apenas a agonia e o medo eram nítidos. Ainda encarando o branco do teto, que nunca lhe pareceu tão puro, ele se deu conta de como a realidade era reconfortante. Naquele momento, entre o fim da madrugada e o começo do dia, lhe pareceu que os medos e agonias reais eram mais fáceis de lidar do que os do pesadelo.
Na mesinha de cabeceira o despertador continuava mostrando o número zero seguido pelo cinco, por dois pontos e por último pelo vinte e três. Ao ver aquela combinação de números ele constatou que poderia dormir mais alguns minutos. Eram apenas alguns minutos, mas o simples fato de ter acordado antes de o despertador apitar lhe causava uma sensação fantástica, a sensação de ter poder sobre seu próprio tempo, como se pudesse olhar para o relógio e desdenhar “ainda não, espere a sua hora”.
Os minutos seguintes foram melhores que muitos dias anteriores. Ele se esticou na cama, no conforto das cobertas e ouvindo o som fraco que o mundo lá fora fazia ao acordar.
Quando finalmente o despertador começou a apitar, ele bateu no aparelho com força maior do que a necessária para desliga-lo. Ele gostou de fustigar aquele que era o seu carrasco de todas as manhãs, gostou de estar alerta e pronto para revidar quando aquele som irritante veio lhe atacar os ouvidos.
Vencendo a vontade de ceder ao conforto e reconfirmar a Lei da Inércia, ele jogou as cobertas de lado e saiu da cama. Naquela manhã até o contato dos pés com o chão frio eram bem-vindos.
Enquanto se espreguiçava, ele se perguntou quão indigesto era se sentir tão bem àquela hora da manhã. Não sabia a resposta, mas sabia que aquele dia ia ser bom, talvez a melhor terça-feira de sua vida, ele acabara de descobrir que às vezes é possível ser feliz assim simplesmente por ser, sem precisar de qualquer motivo ou explicação.
